O Brasil precisa reduzir a exposição da população à fumaça gerada pelas queimadas para evitar o aumento do número de casos de câncer nas próximas décadas. O alerta é do epidemiologista Ubirani Otero, chefe da Área Técnica de Meio Ambiente, Trabalho e Câncer do Instituto Nacional do Câncer (Inca), que define o cenário atual como “muito preocupante”.
A pesquisadora conversou com o Agência Brasil nesta terça-feira (17) sobre os efeitos da fumaça na saúde humana.
“Se não prevenirmos esses problemas hoje, corremos o risco de ter um aumento de cânceres relacionados ao aparelho respiratório em um futuro próximo”, afirma Ubirani Otero.
O alerta do especialista aponta o caminho para evitar o surgimento de casos. “A melhor prevenção contra o câncer é a eliminação da exposição. Se parar o mais rápido possível, poderemos prevenir muitos casos no futuro.”
O epidemiologista explica que a fumaça dos incêndios florestais é composta por inúmeros compostos químicos, que a tornam cancerígena.
“Os incêndios geram muito material particulado. Estamos falando da liberação de monóxido de carbono, solventes, metais pesados, hidrocarbonetos aromáticos, fuligem, uma série de materiais que ficam suspensos no ar”.
Incêndios
O Brasil viverá um cenário grave de queimadas e incêndios florestais em 2024. De janeiro a agosto, os incêndios atingiram 11,39 milhões de hectares, segundo dados do Monitor de Incêndios Mapbiomas, divulgados no último dia 12. Segundo o levantamento, 5,65 milhões de hectares – área equivalente ao estado da Paraíba – foram consumidos pelo fogo apenas no mês de agosto, o que equivale a 49% do total do ano.
Na tarde desta terça está marcada uma reunião dos chefes dos Três Poderes da República para tratar do tema. O encontro foi proposto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que passou o início da semana reunido com ministros do governo. Em junho, o governo criou uma sala de situação preventiva para lidar com a seca e o combate a incêndios, especialmente no Pantanal e na Amazônia.
Nuvens de fumaça se espalharam pelo país, alterando paisagens.
A Polícia Federal abriu investigação para apurar se os incêndios tiveram origem criminosa. Há sinais de ações coordenadas.
Incêndios também ocorreram em outras regiões, como Sudeste. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, escritórios de crise também foram criados pelos governos locais. Na região serrana do Rio de Janeiro, o chefe do Parque Nacional da Serra dos Órgãos afirma que o fogo está consumindo áreas raramente afetadas pelos incêndios.
Riscos
O tipo de câncer mais diretamente ligado à exposição prolongada à fumaça e à poluição do ar é o dos pulmões e de outras partes do sistema respiratório. Ubirani Otero destaca que, diferentemente de outras doenças agudas causadas por exposição prolongada, como as síndromes respiratórias, os cânceres podem levar de 20 a 30 anos para serem identificados.
“O período de latência é longo, por isso os efeitos da poluição de hoje no cancro só veremos depois de 20, 30 anos”, alerta o epidemiologista
O especialista do Inca aborda questões de saúde, incluindo doenças respiratórias, principalmente de crianças, idosos e trabalhadores que trabalham em áreas abertas, com destaque para os bombeiros que combatem diretamente as chamas.
“Eles precisam estar totalmente equipados, bem protegidos, com máscaras e equipamentos de proteção individual adequados, para que não sofram os efeitos dessa fumaça”, aconselha, acrescentando que também é preciso ter cuidado na lavagem da roupa que usam em serviço. . “Está cheio de fuligem. Todos os cuidados devem ser tomados.”
Ela defende medidas como a suspensão das aulas em locais e períodos críticos, para reduzir a exposição prolongada das crianças ao fumo.
“As crianças têm maior atividade física, acabam inalando mais essa fumaça que os adultos. Os efeitos para eles são maiores, principalmente respiratórios”, explica.
O epidemiologista destaca que a fumaça das queimadas é tão prejudicial quanto a fumaça do tabaco. Ao destacar que o câncer é uma doença multifatorial, chama a atenção para o perigo de acumular fatores de risco, por exemplo, ser fumante.
“De um risco que seria dez vezes maior em relação à população em geral, passa a ser 20 vezes maior ou até mais [entre fumantes]”, afirma.
Recomendações
O chefe da Área Técnica de Meio Ambiente, Trabalho e Câncer do Inca orienta que as pessoas nas áreas afetadas pela fumaça das queimadas tomem precauções, como evitar sair de casa, diminuir a exposição, usar máscara de proteção, beber bastante água e lavar as narinas.
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