Acostumado a lidar com armas, o coronel Ricardo Augusto Nascimento de Mello Araújo bem poderia atribuir a escolha de seu nome para vice-presidente na chapa do pré-candidato Ricardo Nunes (MDB) a “um tiro que saiu pela culatra”. Mello Araújo lembra que estava em entrevista quando um repórter lhe perguntou em quem ele pretendia votar para presidente: “Respondi que votaria em Bolsonaro”.
O coronel tem convicção de que o repórter pretendia criar constrangimento entre ele e o então governador de São Paulo Geraldo Alckmin, que também disputou a eleição em 2018. Não deu certo. Na época, Mello Araújo era comandante das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) e diz que ficou quase paralisado quando, algum tempo depois, o próprio Bolsonaro, hoje Presidente da República, apareceu no quartel para lhe fazer uma visita. Desse primeiro encontro surgiu uma relação de amizade e confiança que se tornou mais forte e estreita ao longo dos anos.
Em 2020, Bolsonaro convidou o amigo para ser CEO da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), em São Paulo, o maior armazém de alimentos da América do Sul. E para que ninguém tivesse dúvidas sobre a titularidade da indicação, ele gravou um vídeo em que dizia:
“Prezados caminhoneiros, licenciados e funcionários da Ceagesp. Neste momento quero pedir-lhes um voto de confiança no novo presidente da Ceagesp, Coronel Mello Araújo. a qualquer momento, se necessário. Pode ter certeza, ele fará uma excelente administração. Perfeitamente sintonizada com os interesses de todos vocês. E desta forma, vocês podem ter certeza. recuperar tudo o que perdeu no passado.”
A gestão do coronel Ricardo de Mello Araújo à frente da Ceagesp foi marcada pela militarização da empresa pública e por confrontos com o Sindicato dos Empregados nos Centros de Abastecimento de Alimentos do Estado de São Paulo (Sindbast). O ex-comandante da Rota preencheu a maior parte dos cargos comissionados com policiais militares reformados. Também instalou um clube de tiro na sede da empresa, na Vila Leopoldina, zona oeste da capital.
Mello Araújo tentou expulsar o Sindbast da Ceagesp, mas foi impedido pela Justiça. A direção da entidade acusa o coronel de ter invadido o sindicato com seguranças armados após a decisão judicial. Em nota divulgada na época, o Sindbast afirmou que os funcionários e dirigentes da associação comercial foram intimidados pelos homens armados que acompanhavam o coronel Mello Araújo.
“Foi uma demonstração de autoritarismo covarde e brutal por parte daqueles que querem ‘vencer gritando’ e não estão acostumados com práticas democráticas. Nosso veemente repúdio a essa invasão e garantimos que resistiremos”, diz o texto publicado na época . Terceira geração em segurança SP
Nascido em São Paulo, no Hospital Cruz Azul (BVMF:), no Largo do Cambuci (BVMF:), o Coronel tem 53 anos, é casado e tem dois filhos. Ele gosta de dizer que sua família cuida da segurança dos paulistanos há um século. Isso porque ele é da terceira geração de policiais militares. Aposentou-se da Polícia Militar em 2019, mas continuou trabalhando na Ceagesp até o início de 2023, quando Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a presidência da República. A empresa, segundo ele, cresceu e se consolidou financeiramente. “Vamos combater fortemente a corrupção. Não aceito e não fico calado (…) A Ceagesp vai vencer, lucrar e alcançar os patamares que merece, que seus antepassados construíram ao longo dos anos”, afirmou.
Mesmo assim, sua administração não foi muito tranquila. As reportagens da época registraram e confirmaram seus diversos confrontos com trabalhadores da Ceagesp e do Sindbast. Apesar disso, a frase que mais o marcou foi dita quando ainda estava no comando da Rota e afirmou que “a abordagem policial precisa ser diferente em bairros de elite como os Jardins e na periferia”.
Pensamento alinhado ao bolsonarismo
Conhecer o pensamento de Mello Araújo ajuda a entender o porquê do carinho de Bolsonaro. Desde que decidiu que apoiaria a reeleição do prefeito Ricardo Nunes, o ex-presidente deixou claro que indicaria ele mesmo o vice-presidente. Assim, com milhares de seguidores nas redes sociais, o coronel já manifestou apoio ao impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), integrou o grupo que desconfiava das urnas eletrônicas e contrariou as regras de isolamento e vacinação contra a Covid-19 .
Embora Bolsonaro sempre tenha deixado claro que coronel era o nome que queria ver na chapa do prefeito Ricardo Nunes, a escolha não foi facilmente aceita pelos demais partidos da coligação e pelos parlamentares já decidiram votar em Nunes. “Mello Araújo não tem habilidade política nem voto. A menos que Bolsonaro faça campanha por ele, será mais difícil a chapa decolar”, disse Coronel Telhada (PP-SP), deputado federal. Alguns parlamentares chegam a comparar Mello Araújo ao general reformado Braga Netto, que foi vice-presidente na chapa em que Bolsonaro concorreu à presidência da República em 2022.
O coronel Telhada foi um dos que se rendeu aos argumentos do presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), voz que acabou batendo o martelo e decidindo a questão. O deputado estadual Delegado Olim (PP) acha que nem o próprio Nunes se entusiasmou com a indicação. “Ele não acrescenta nada, mas, como partidário, vou fazer campanha e ajudar a vencer as eleições”. O deputado Fausto Pinato (PP) tem praticamente a mesma opinião. No entanto, considera que não valeria a pena perder o apoio de Bolsonaro só porque não gosta do vice-presidente que escolheu. “Então vamos engolir isso”, disse ele.
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