O episódio que terminou com uma cadeira dada por José Luiz Datena (PSDB) a Pablo Marçal (PRTB) durante o debate da TV Cultura na noite deste domingo, 15, que também foi citado no debate promovido pela RedeTV! desta terça-feira, 17, foi motivada por provocações do ex-técnico contra o apresentador, incluindo uma envolvendo um caso de assédio sexual arquivado pela Justiça em 2019. Na época, a jornalista e ex-repórter da Band, Bruna Drews, acusou Datena, então apresentadora do programa “Brasil Urgente”, a assediou sexualmente em mais de uma ocasião.
No debate de domingo, antes do ataque, Datena afirmou que a denúncia foi apresentada por “falta de provas”. O Estadão teve acesso aos autos do processo, com mais de 100 páginas, que mostram que o processo foi encerrado por a denúncia ter sido feita fora do prazo legal de até seis meses após o suposto crime, nos termos da legislação vigente à época . Procurado, o assessor do candidato disse que “o processo foi encerrado e houve retratação quanto ao processo judicial” e que a fala do apresentador no debate foi “uma forma de se expressar”.
Um dos supostos episódios de assédio sexual que virou debate na Câmara Municipal de São Paulo teria ocorrido em junho de 2018. Segundo a denúncia, em reunião de equipe em um restaurante, Datena teria dito que já havia se masturbou pensando no colega, e que seria “um desperdício” Bruna namorar uma mulher, o que o apresentador teria atribuído ao fato de ela “não ter conhecido o homem certo”.
Após denúncia e declarações públicas do jornalista, o apresentador negou as acusações, afirmando que o caso era “calúnia” e que o profissional sofria de problemas psicológicos.
Bruna apresentou denúncia criminal contra Datena ao Ministério Público no dia 5 de dezembro de 2018, alegando ter sido assediada pelo apresentador durante um jantar no dia 7 de junho daquele ano. Posteriormente, em 30 de janeiro de 2019, a delegada responsável pela investigação, Giovanna Valenti Clemente, elaborou o relatório final, concluindo que o direito de representação da vítima não foi exercido no prazo legal de seis meses, encerrado em 6 de janeiro de 2018. No documento, Clemente destacou que, embora a denúncia criminal tenha data de 5 de dezembro de 2018, a petição só foi protocolada em 12 de dezembro, seis dias após o prazo legal.
O caso foi então encaminhado ao Ministério Público de São Paulo, onde a procuradora Juliana Gasparetto de Toledo Silva Donato concordou com a conclusão policial e pediu a extinção da pena por descumprimento do prazo legal.
O juiz responsável pelo caso, Ulisses Augusto Pascolati Junior, da Vara Criminal da Barra Funda, inicialmente discordou do Ministério Público, argumentando que uma mudança na lei, em setembro de 2018, tornou incondicional a persecução criminal por crimes de assédio sexual público. Isto significa que o Ministério Público poderia instaurar um processo penal independentemente da vontade da vítima, ou seja, a representação da vítima deixaria de ser uma condição necessária para a continuação do processo.
Contudo, o Ministério Público manteve sua posição, alegando que a nova lei não poderia ser retroativa para prejudicar o réu, em conformidade com o princípio da irretroatividade da lei penal mais grave – argumento também utilizado pela defesa de Datena. Diante deste parecer, o juiz mudou de posição, concordando com o Ministério Público, e, em 30 de maio de 2019, extinguiu a punibilidade da ação baseada na decadência, reconhecendo a impossibilidade de aplicação retroativa da nova lei, por entender que esta prejudicaria o acusado.
Em novembro de 2019, o processo foi definitivamente arquivado por questões processuais relacionadas ao prazo legal, sem análise de mérito ou prova do suposto crime.
Datena processou ex-colega por calúnia, injúria e difamação
Em fevereiro do mesmo ano, Datena também recorreu à Justiça, apresentando queixa-crime contra Bruna, por injúria, calúnia e difamação, com base em entrevistas concedidas por seu ex-colega no momento da denúncia e em ação trabalhista ajuizada por ela em na 19ª Vara do Trabalho de São Paulo, em janeiro de 2019.
De acordo com a ação movida por Datena, o ex-repórter cobrou mais de R$ 1 milhão em danos morais da TV Bandeirantes, pelo suposto assédio sexual sofrido. A emissora foi procurada, mas não quis comentar o assunto.
“A arguida procurou satisfazer interesses puramente financeiros, expostos nos autos da ação de indemnização laboral, para transformar um ambiente festivo e fraterno numa situação verdadeiramente surreal através da narrativa de uma trama mentirosa, falaciosa e ultrajante, na qual teria sido vítima de ‘assédio’ narrativa sexual’. Uma narrativa tão implausível quanto denota a intensa intenção que a motivou”, diz trecho da denúncia criminal, que qualifica a denúncia de “fábula maliciosa e perversa”.
Retratação em cartório
No dia 9 de outubro daquele ano, Bruna e Datena assinaram uma retratação em cartório, na qual a jornalista nega as acusações feitas por ela. Entre as diversas condições acordadas, ambos renunciaram às ações que tramitavam no caso – a ação trabalhista movida por Bruna e a denúncia criminal de Datena. O contrato também estabelecia que nenhum deles reingressaria em “qualquer ação futura sob o mesmo objeto” ou outras decorrentes dos mesmos fatos.
“Bruna reconheceu que os supostos motivos/atitudes que levaram ao referido assédio sexual nunca ocorreram, e tais denúncias foram feitas enquanto seu estado emocional estava abalado”, diz trecho do documento.
A advogada Ana Paula de Almeida Souza, que defende Bruna, disse ao Estadão que o acordo foi assinado porque a cliente se sentiu coagida pelo advogado que a defendia na época e que recebeu ligações anônimas com ameaças veladas, com quem ligou afirmando saber o endereço dos pais de Bruna, por exemplo. “Ela ainda não se sente confortável em falar, mas está disposta a que ele pague por tudo o que já fez”, disse a defesa.
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