A investigação da Polícia Federal (PF) que levou ao afastamento do prefeito da Cidade Oeste (GO), Fábio Correa (PP), coloca o político no centro de suspeitas de fraude e superfaturamento de contratos públicos no valor de R$ 63,5 milhões. Ele foi o principal alvo da Operação Ypervoli, lançada na semana passada.
Fábio Correa foi reeleito em 2020 para um segundo mandato. A cidade de 91 mil habitantes está localizada na periferia do Distrito Federal. Em nota divulgada após a operação da PF, a prefeitura negou irregularidades. A administração municipal informou que está à disposição para colaborar com a investigação. “A gestão sempre agiu dentro dos princípios da legalidade e da transparência”, diz o texto.
O prefeito publicou um comunicado nas redes. Ele disse que ficou surpreso com a investigação, mas está pronto para prestar esclarecimentos à Polícia Federal. “Durante os nossos oito anos não tive ação de improbidade, não tive ação civil pública. E vou dizer mais: as contas dos seis anos consecutivos foram aprovadas não só pelo Tribunal de Contas Municipal mas também pela Câmara Municipal”, disse Correa.
A PF investiga indícios de peculato, corrupção ativa e passiva, fraude em licitações, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Os investigadores afirmam ter encontrado indícios de “ações coordenadas” supostamente determinadas pelo prefeito para fraudar licitações municipais, especialmente envolvendo contratos das Secretarias de Saúde e Educação. Os secretários Anderson Luciano de Carvalho (Educação) e Vanderli Ferreira de Carvalho (Saúde) também são investigados. “O objetivo último dos agentes públicos envolvidos é o enriquecimento ilícito”, aponta a Polícia Federal.
Em 2016, quando se lançou como candidato, Fábio Correa declarou R$ 433 mil em bens à Justiça Eleitoral. Em 2020, na campanha à reeleição, o patrimônio saltou para R$ 1,3 milhão. O prefeito também comprou três fazendas na região. Pelo menos um deles, no valor de R$ 104 mil, teria sido pago em dinheiro, segundo o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
“Esta autoridade policial considera que o aumento exponencial e incompatível do patrimônio do prefeito Fábio Correa de Oliveira é, na verdade, o pagamento de bens decorrentes dos crimes contra a administração pública ora investigados, condutas que se enquadram nas modalidades clássicas de lavagem de dinheiro “, diz trecho da representação da Polícia Federal que desencadeou a operação.
Contratos suspeitos
Uma das principais suspeitas envolve contratos celebrados com o Hospital de Santa Maria. A PF suspeita que a prefeitura tenha promovido o desmantelamento deliberado da rede municipal de saúde para favorecer o hospital privado, ligado à família do prefeito.
Desde que Fábio Correa assumiu, em 2017, foram assinados quatro contratos com o hospital, no valor de mais de R$ 4,4 milhões. A primeira-dama Marli Alves Lessa integrou a unidade de saúde entre 2008 e 2015, e sua irmã, Maria Erodites Lessa, administrou o local entre 2003 e 2022.
Auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) mostrou indícios de favoritismo indevido por parte do hospital. O aviso de acreditação teria criado requisitos personalizados para limitar a concorrência e direcionar o contrato. Despesas com manutenção de máquinas xerox também estão sob suspeita da PF. O valor global dos contratos chamou a atenção dos pesquisadores. A prefeitura desembolsou R$ 17 milhões com 71 contratos para compra de materiais como cartuchos, toners e cilindros. Os contratos foram assinados com duas empresas, Codyr e Rydoc, ambas controladas pelo empresário Dione Rodrigues de Souza.
Ao verificar os metadados de um dos lances, a Polícia Federal identificou que o edital foi publicado com data retroativa, o que reforçou as suspeitas de que o leilão tenha sido simulado. Os investigadores foram atrás das empresas que participaram da competição e descobriram que todas estavam registradas em nome de funcionários ou ex-funcionários da dona da Codyr e da Rydoc. Para a PF, seriam laranjas no esquema.
Outro personagem-chave na investigação é o leiloeiro Gabriel Paixão Ribas, que foi presidente da Comissão Permanente de Licitação. Ele é apontado como uma espécie de operador de fraude que, segundo a Polícia Federal, atingiu status “sistemático”.
“Ao analisarmos as constantes viagens internacionais para destinos de altíssimo padrão, os registros oficiais de movimentações de dezenas de milhares de reais em dinheiro, bem como os veículos de luxo adquiridos, podemos concluir que há fortes indícios de que a leiloeira municipal de Cidade Oeste , principal responsável pelos crimes de fraude em licitações sob investigação, está envolvida na prática constante de atos de lavagem de dinheiro”, afirma a PF.
A Polícia Federal descobriu que o empresário Genival Gomes Figueiredo, dono da empresa Solutel, transferiu para o leiloeiro, em maio de 2021, um Ford (NYSE:) Ranger avaliado em R$ 110 mil. Menos de um mês depois, sua empresa venceu uma licitação para construção de salas de aula, depois que Ribas desclassificou todos os concorrentes.
A empresa fechou mais de R$ 11 milhões em contratos com a prefeitura. Em metade das licitações, concorreu sozinha, segundo a PF.
Outra licitação suspeita da Secretaria de Educação foi concluída com a empresa MEC 3 Infra, inaugurada em outubro de 2023, dois meses antes da publicação do edital de R$ 2,7 milhões para reforma de escola municipal. A empresa foi registrada em nome de Rodrigo Sousa Villar, que já havia assinado contratos como representante da Solutel. A empresa não possui sede própria nem funcionários cadastrados, segundo a investigação.
Recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) teriam sido desviados. O secretário de Educação, Anderson Luciano de Carvalho, é apontado como o “principal arrecadador financeiro” do esquema. O comissionado Rafael de Lima Silva, da Secretaria de Educação, seria o responsável por “ir a campo” para receber propina de empresários, segundo a Polícia Federal. Os investigadores descrevem a relação do secretário com o servidor como “umbilical”.
A Polícia Federal chegou a defender a prisão preventiva do prefeito, alertando que a “conspiração criminosa está a todo vapor”, mas o pedido foi negado pela Justiça.
A Justiça Federal autorizou buscas em 27 endereços ligados aos suspeitos. O material apreendido está sendo analisado para aprofundar a investigação.
Defesas
A reportagem busca contato com os citados na investigação. O espaço está aberto para manifestação.
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