Conversas entre Marco Antônio Vargas, juiz auxiliar do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), e membros da AEED (Conselho Consultivo Especial de Combate à Desinformação) da Justiça Eleitoral, mostram o início de atritos no juiz com Elon Musk, dono do X (ex-Twitter). As mensagens mostram que Moraes ordenou a elaboração de reportagens e disse que aplicaria sanções à plataforma.
As conversas fazem parte das mensagens obtidas pelo Folha de S.Paulo. Na noite de terça-feira (3 de setembro de 2024), o jornal publicou mensagens de março de 2023, que mostram o início do embate entre Moraes e Musk, que culminou na ordem da semana passada para suspender o X no Brasil.
A troca de mensagens, via WhatsApp, ocorreu 5 meses após as eleições presidenciais no Brasil. Os assuntos discutidos não têm relação direta com temas de competência do TSE.
Segundo conversas, o então Twitter deixou de aceitar pedidos feitos por Moraes após as eleições. Na época, a rede social tinha acabado de ser comprada por Musk.
Vargas enviou uma mensagem de Moraes para o grupo de WhatsApp formado por ele e membros da AEED que dizia: “Então vamos ser duros com eles. Elaborar relatórios em relação a esses casos e enviar ao inq [inquérito] falso [news]. Vou mandar removê-lo sob pena de multa”.
Essa mensagem veio acompanhada de uma mensagem de Vargas: “Vamos melhorar o relatório para esse fim”.
A conversa ocorreu no dia 17 de março de 2023. Nessa data, Vargas enviou ao grupo uma publicação sobre a libertação de pessoas presas pelos atos extremistas de 8 de janeiro.o Mula, o Xandão e esse governo usurpador”estavam sendo acusados de“Tribunal Internacional”de crimes contra a humanidade.
“Bom dia, preciso de contato no Twitter”, questionou Vargas aos demais integrantes do grupo de WhatsApp. Ele recebeu o telefone de Hugo Rodríguez, então representante da rede social para a América Latina.
Integrante do grupo, uma pessoa chamada Frederico Alvim se ofereceu para falar na plataforma. “Você Você consegue vê-lo para que possam analisar postagens dessa natureza?”, questionou Vargas.
“Sim. A ideia seria aumentar um pouco o alcance da parceria, para que questões como essa possam ser enviadas pelo sistema de alerta, recebendo tratamento?”, disse Alvim.
“Penso que exigir uma mudança formal na política seria muito demorado e difícil, porque dependeria da boa vontade da equipa global, agora subordinada a Musk. Acredito que a saída mais fácil seria pedir uma calibração da interpretação da política existente”, afirmou.
Por não ser período eleitoral, Alvim disse considerar que o melhor caminho seria “argumentam que, embora as eleições tenham terminado e o novo presidente tenha sido empossado, estes ataques mantêm aberta a possibilidade de novas altercações”.
Alvim relatou ter marcado para esse dia uma reunião com Hugo Rodríguez, representante da rede social na América Latina. Ele disse que iria “tentar”para que a plataforma remova o conteúdo em questão e“outro semelhante” sempre que acionado.
“Vou ver o que consigo. Mas ele [Rodríguez] Ele já disse que, com a entrada de Musk, sua equipe deixou de tomar decisões de moderação. Essas decisões estão sendo tomadas por um órgão colegiado, do qual não participam”, declarou Alvim.
Ele relatou ao grupo como havia sido a reunião. Ele disse que, segundo Rodríguez, as regras a serem seguidas pela rede social fora do período eleitoral seriam gerais.
“Com a entrada de Elon Musk, a moderação caminha cada vez mais para se basear na proteção da segurança, em vez de na proteção da verdade”, declarou Alvim.
“Em suma, uma mentira sem relação com um risco concreto tende a não ser moderada. A moderação só ocorre quando há discurso violento, discurso de ódio e consideração de algum tipo de dano mais palpável (incitação a ato de depredação ou algo parecido). Com o detalhe de que o ‘risco à democracia’, por não ser palpável, não entra neste conceito”, afirmou.
Segundo ele, para retirar do ar ou bloquear publicações que ofendem Moraes seria necessário “atuação judicial”.
Essa explicação foi repassada por Vargas a Moraes. Foi então que o ministro do STF ordenou a produção de relatórios e disse que iria “removê-lo“as publicações”sob pena de multa”.
O Folha de S.Paulo está publicando mensagens que sugerem que Moraes teria utilizado informalmente o TSE para apoiar investigações para sua relatoria no Supremo. Clique aqui para ler o que Poder360 já publicado sobre o assunto.
Moraes e o STF não responderam aos contatos do Folha de S.Paulo.
ENTENDA O CASO MUSK x MORAES
O conflito se intensificou desde 17 de agosto, quando o perfil de Relações Governamentais Globais do X anunciou que fecharia seu escritório no Brasil, mas que a rede social continuaria disponível para os brasileiros. Na publicação, a empresa disse que a medida foi tomada por conta de decisões de Moraes.
O documento faz parte de um processo confidencial. É possível ler que Moraes pediu bloqueio de perfis que publicaram mensagens “antidemocrático” ou com conteúdo de ódio às autoridades – não está claro o que teria constituído uma violação das leis brasileiras.
A empresa de Musk, porém, não cumpriu as ordens. O ministro do STF então aumentou a multa e deu 24 horas para bloquear a rede, sob pena de prisão por desobedecer à ordem judicial.
No dia 28 de agosto, Moraes determinou que a empresa identificasse um representante legal no Brasil em até 24 horas, sob pena de ter as operações suspensas em todo o país. A decisão não foi cumprida.
Na sexta-feira (30 de agosto), Moraes determinou a suspensão do X no Brasil.
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