O aumento da execução orçamentária do Legislativo – iniciado em 2015 por meio de alterações tributárias – piora a capacidade de planejamento de políticas públicas e sua execução, reduzindo a eficiência na prestação de serviços à população.
A avaliação é do assessor político do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Cléo Manhas, que atua nas áreas de orçamento, direitos e justiça fiscal.
O especialista destacou que o dinheiro para emendas obrigatórias não está previsto no Plano Plurianual (PPA), fragilizando o planejamento do Executivo para executar políticas públicas já que o recurso nas mãos dos parlamentares é significativo – R$ 49,2 bilhões em 2024, cerca de um quarto do total dos gastos não obrigatórios, que é o que a União dispõe para investimentos.
“No PPA o governo coloca suas promessas de campanha. Nele você tem suas prioridades, metas e indicadores que deve cumprir ano após ano. Aí vêm os parlamentares que têm um recurso enorme e mandam para onde quiserem à vontade. Com isso, a lógica da programação e do planejamento fica em segundo plano”, explicou.
“Ao mesmo tempo que o Congresso aprova o PPA, ele contribui com a retirada de recursos para que esse plano seja cumprido”, completou.
Um estudo produzido pelo doutor em economia e pesquisador do Insper Marcos Mendes, publicado em 2022, concluiu que a parte do orçamento sob controle do Legislativo no Brasil é 20 vezes maior que a média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico ( OCDE).
Cléo Manhas argumentou que a execução dos recursos do parlamento não tem a mesma qualidade daquela produzida pelo Executivo.
“O Poder Legislativo não tem estrutura e não foi pensado para executar. Os órgãos de pesquisa estão todos vinculados ao Executivo. É nos ministérios que está localizada a capacidade de planejamento e a estrutura de implementação de políticas públicas”, destacou.
Por outro lado, os parlamentares argumentam que estão nos estados e municípios e conhecem melhor as reais necessidades da população.
Entender
As emendas individuais, de comissão ou de bancada são recursos orçamentários que o Executivo tem a obrigação de executar mediante recomendação dos parlamentares.
A suspensão das emendas obrigatórias dos parlamentares pelo Supremo Tribunal Federal (STF) reacendeu o debate sobre a execução do orçamento no Brasil. Após a suspensão do pagamento dos aditivos pelo STF, foi assinado acordo entre os Poderes para ajustar a execução desses recursos, respeitando a transparência, a rastreabilidade e a efetividade dessas despesas.
A ação do PSOL que deu origem à decisão afirma que a imposição das emendas capturou o orçamento e bloqueou o planejamento e a coordenação das políticas públicas de forma eficiente, criando no Brasil, na prática, um regime semipresidencialista.
Comparação OCDE
O estudo do pesquisador Marcos Mendes feito a pedido do Instituto Millenium comparando o Brasil com a OCDE mostra a diferença entre a execução orçamentária nos diferentes países.
“Em outros 14 países, o legislador não alterou o orçamento ou o fez em montantes insignificantes, abaixo de 0,01% das despesas primárias discricionárias. Há dez países onde esta variação é inferior a 2%. Apenas os Estados Unidos, a Eslováquia e a Estónia aparecem acima desta marca de 2%. Porém, mesmo esses países estão longe do que acontece no Brasil, onde nada menos que 24% das despesas primárias discricionárias são alteradas pelo parlamento”, afirma.
Alterações Pix
Além da eficiência, a transparência e a rastreabilidade dos recursos também são abordadas pelo STF. Em dezembro de 2022, o Supremo decidiu que as emendas do relator – conhecidas como orçamento secreto – eram inconstitucionais.
No entanto, uma ação da Procuradoria-Geral da República (PGR) argumenta que o Legislativo continua descumprindo a decisão, desta vez por meio de emendas especiais – ou emendas Pix – que permitem a transferência direta de dinheiro, sem a necessidade de acordo ou projeto anterior.
A assessora política do Inesc, Cléo Manhas, destacou que o recurso “entra no fundo único da prefeitura e não sabemos mais o que aconteceu com esse recurso”.
Esta semana, o ministro Flávio Dino enviou à Procuradoria-Geral da República (PGR) uma lista de possíveis irregularidades no pagamento de emendas parlamentares.
Legislativo
Os parlamentares reagiram às liminares do Supremo apresentando recurso assinado pela Câmara e pelo Senado e por outros 11 partidos. Porém, por unanimidade, o STF manteve a suspensão das alterações.
As partes argumentam que “as decisões causam danos irreparáveis à economia pública, à saúde, à segurança e ao próprio ordenamento jurídico, além de violarem patentemente a separação de poderes”.
O presidente da Câmara defendeu o modelo de execução vigente no Brasil. “É sempre bom lembrar que o Orçamento não é do Executivo. O Orçamento é votado pelo Congresso, por isso é lei. Sem a aprovação do Parlamento não tem validade constitucional”, afirmou Arthur Lira.
O senador Rodrigo Pacheco justificou que a apropriação indébita de recursos ou uso indevido de dinheiro público ocorre em todos os formatos de execução de políticas:
“Há uma série de possibilidades para que isso aconteça e isso tem que ser coibido e reconhecido como exceções que precisam ser combatidas pelos órgãos de controle. Mas não inviabilize a execução orçamentária partindo do pressuposto de que está tudo errado.”
Para Pacheco, as emendas individuais, de bancada e de comissão são instrumentos legais e legítimos de participação orçamentária do Legislativo, mas devem passar por ajustes “para buscar a máxima transparência, rastreabilidade e eficiência possíveis nos gastos públicos”.
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