Nesta quinta-feira, 22, o Congresso Nacional promulgou a emenda constitucional que prevê o repasse de 30% dos recursos de campanha para candidatos pretos e pardos. O texto prevê ainda um programa de refinanciamento de dívidas de partidos políticos e o perdão de multas por descumprimento de cotas raciais, desde que os recursos sejam aplicados nas próximas quatro eleições. A emenda ficou conhecida, durante sua tramitação no Legislativo, como “PEC da Anistia”.
A sessão de promulgação foi rápida e vazia: durou pouco mais de 10 minutos. O presidente do Senado e do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), por exemplo, não participou da reunião. Ficou hospedado na residência oficial do Senado, em Brasília. O vice-presidente da Câmara e do Congresso, Marcos Pereira (Republicanos-SP), foi o responsável pela promulgação da emenda constitucional.
Em seu breve discurso, Pereira defendeu que as regras eleitorais sejam aprovadas pelo Congresso, e não definidas pelo Judiciário – como acontecia com as cotas raciais, por exemplo, até a última eleição.
“É de extrema importância que os partidos tenham a sua atuação orientada pelas ordens criadas pelo Parlamento, que, quando transgredidas, deverão sofrer as sanções previstas na lei”, afirmou o deputado.
Segundo ele, “é fundamental que os partidos sejam saudáveis e operem em um ambiente de segurança jurídica, no qual possam planejar seu tempo e executar suas estratégias em busca do sucesso político e eleitoral”. Pereira disse ainda que a emenda constitucional aprovada “reforça as ações afirmativas” adotadas pelo Congresso e citou outra emenda aprovada há dois anos, que estabeleceu a cota de gênero.
“Até então era uma norma desenhada pelos tribunais. Vale destacar a importância das ações serem discutidas e aprovadas pelos legisladores, pois os aspectos políticos devem ser levados em consideração”, disse. Nenhum dos outros parlamentares presentes quis falar.
Transferências menores
A emenda constitucional promulgada nesta quinta-feira, porém, na prática reduz o percentual de repasses a candidatos pretos e pardos. Pela regra vigente até então, essa fatia deve ser proporcional ao número de candidatos negros, conforme definido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e referendado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ou seja: se a proporção de candidatos negros for de 50% em relação ao total de candidatos, o repasse global deverá ser de 50% para pretos e pardos, como aconteceu em 2022.
Pelo texto aprovado agora no Congresso, esse repasse será de 30%. “Dos recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC) e do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário) destinados às campanhas eleitorais, os partidos políticos deverão, obrigatoriamente, aplicar 30% nas candidaturas de pessoas pretas e pardas em os distritos que melhor atendem aos interesses e estratégias partidárias”, define o texto aprovado por deputados e senadores.
Além disso, a emenda constitucional promulgada pelos congressistas esta quinta-feira também considera que qualquer descumprimento de cotas raciais em eleições passadas deve ser desconsiderado, desde que, nas próximas quatro eleições, os partidos políticos compensem essa diferença.
Por se tratar de uma alteração constitucional, as alterações que impõe não estão sujeitas à regra da anualidade (que prevê que qualquer lei que altere as regras eleitorais só pode ser aplicada se for aprovada com mais de um ano de antecedência). Como resultado, o que na prática significará uma redução nas transferências aplicar-se-á a partir das eleições deste ano.
O texto também cria um programa de refinanciamento das dívidas das partes, com isenção de juros e multas, aplicando apenas a correção monetária dos valores ao longo do tempo. As dívidas previdenciárias podem ser pagas em até 60 meses (ou seja, cinco anos), e as demais dívidas pendentes em 180 meses (ou seja, 15 anos). Recursos do fundo partidário, utilizados para manutenção da estrutura partidária, poderão ser utilizados para pagar essas dívidas.
Entenda o que muda:
Piso de envio de recursos
O cerne da PEC era reduzir a quantidade de recursos para candidaturas de negros. O texto, porém, abre brechas para que as siglas transfiram o valor para apenas um candidato, sem respeitar a proporcionalidade das candidaturas de políticos negros. Os diretórios nacionais de legendas também poderão escolher uma região específica para a qual enviarão fundos de campanha.
O piso mínimo será válido a partir das eleições municipais deste ano e deverá ser seguido nas próximas eleições.
Reembolso de dívida
A PEC estabelece que os partidos políticos ficarão isentos de pagar multas ou de ter o Fundo Partidário e Eleitoral suspenso em razão de demonstrações financeiras realizadas antes da promulgação da emenda. Cálculos feitos no ano passado por órgãos de transparência eleitoral indicavam que, se fossem consideradas apenas as contas pendentes de julgamento, o valor poderia chegar a R$ 23 bilhões.
Multas eleitorais podem ser pagas em até 15 anos. As obrigações previdenciárias terão prazo de cinco anos, e as dívidas fiscais impostas aos políticos serão anuladas, segundo organizações ligadas à transparência partidária.
Legalização de ‘caixa dois’
Além de permitir que os partidos paguem suas multas com recursos do Fundo Partidário, também é permitida a devolução de recursos públicos e privados, “inclusive os de origem não identificada”.
Segundo entidades ligadas à transparência eleitoral, esse trecho da PEC permite que os partidos utilizem uma das formas da chamada “caixa 2” para quitar suas dívidas com a Justiça.
Imunidade tributária para partidos As coligações partidárias e os próprios partidos foram incluídos na lista de instituições que não pagam impostos, bem como entidades religiosas ou de assistência social.
Recuperação fiscal
Os partidos passam a ter acesso a um Programa de Recuperação Fiscal (Refis) para quitar dívidas com isenção de juros acumulados e multas, aplicando apenas correção monetária aos valores originais.
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