O gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes deu ordens oficiosamente para a produção de relatórios do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), segundo reportagem do Folha de S.Paulo. O movimento foi feito por meio de mensagens de apoio a decisões do próprio ministro contra aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na investigação de fake news e milícias digitais.
O jornal teve acesso a diálogos que mostram o setor antidesinformação do TSE sendo utilizado como braço investigativo do gabinete do ministro. No momento da troca de mensagens, Moraes presidia a Justiça Eleitoral.
Em nota, a assessoria de Moraes afirmou que, durante as investigações, fez solicitações a diversos órgãos, inclusive ao TSE. Segundo o magistrado, todas as ações foram realizadas de acordo com a regulamentação.
“Todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com plena participação da Procuradoria-Geral da República”, afirmou.
O jornal sustenta que a equipe de Moraes pedia constantemente a produção de reportagens para respaldar reportagens contra apoiadores de Bolsonaro que são investigados nos dois inquéritos. Há um fluxo fora do rito, com um corpo do TSE sendo utilizado para nutrir o STF.
De acordo com o FolhaMoraes pediu documentos comprobatórios sobre apoiadores de Bolsonaro que postaram ataques ao sistema de votação eletrônica, a ministros do STF e que incitaram militares que incitaram os militares contra o resultado das eleições de 2022.
O jornal afirma ter obtido o material de fontes que tiveram acesso a um aparelho telefônico contendo as mensagens. São mais de seis gigabytes de mensagens via WhatsApp trocadas por funcionários do escritório de Moraes entre agosto de 2022 e maio de 2023.
Moraes pediu ajustes na reportagem contra Paulo Figueiredo Filho e Rodrigo ConstantinoEm uma das mensagens coletadas pelo jornal, o juiz instrutor Airton Vieira, principal assessor de Moraes no STF, envia “pedido de Moraes para que faça reportagens com base em publicações da rede” ao especialista Eduardo Tagliaferro, que comandou a Assessoria Especial de Combate à Desinformação (AEED).
As redes sociais sobre as quais Moraes queria reportagens eram o blogueiro Paulo Figueiredo Filho e o comentarista político Rodrigo Constantino. Os dois são conhecidos por apoiarem o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Na troca de mensagens, Tagliaferro envia a Vieira uma primeira versão da reportagem. O juiz instrutor responde ao perito com outras publicações e explica que o pedido de aumento partiu do próprio ministro do STF.
“Quem mandou isso, agora mesmo, foi o ministro e ele mandou dizendo: ‘você quer que eu faça o relatório?’ Ele está assim, está pensando nisso, como não esteve na sessão esses dias, ele tem tempo para dar uma olhada”, diz Vieira em áudio.
Segundo a Folha, um funcionário do TSE respondeu a Vieira declarando que o conteúdo do primeiro relatório já era suficiente, mas que seriam feitas as alterações solicitadas por Moraes.
“Concordo com você, Eduardo. Se você for procurar (publicações), vai encontrar, obviamente. Mas como você disse, basta o que você já tem. Tragédia”, diz a mensagem revelada pelo jornal.
‘Cuidado com o relatório, por favor’, pede auxiliar de Moraes após ordem do ministro
Em outra troca de mensagens, Vieira encaminha uma captura de tela de uma conversa com o ministro pedindo que Tagliaferro analisasse uma publicação de Constantino. Na mensagem, Moraes diz: “Peça ao Eduardo para analisar as mensagens deste [Constantino] para ver se é possível bloquear e aplicar multa”.
Em resposta, Tagliaferro diz “já recebi” e “está para ser retirado”. A Folha destaca ainda que Vieira disse ao perito do TSE para “cuidar” do relatório que seria usado contra o comentarista político. “Eduardo, bloqueio e multa do STF. Cuidado com a reportagem, por favor. Kkkk. Aí, oficialmente, por e-mail. Obrigado”, diz a mensagem revelada pela Folha.
Relatório serviu de base para ordenar bloqueio de redes sociais e quebra de sigilo bancárioSegundo reportagem da Folha, Airton enviou a Tagliaferro cópia de duas decisões de Moraes protocoladas no âmbito do inquérito das fake news. A decisão, segundo o jornal, foi possível com base no relatório feito por despacho do ministro.
Nas decisões de Moraes, o escritório menciona que foi utilizado como base um ofício feito pelo AEED do TSE, mas não menciona que o material foi encomendado a partir de uma conversa via WhatsApp”.
Nas decisões, Moraes determinou quebra de sigilo bancário, bloqueio de redes sociais, intimações para depoimento na Polícia Federal (PF) e bloqueio das redes sociais de Rodrigo Constantino e Paulo Figueiredo Filho.
Leia a nota do gabinete de Moraes na íntegra:O gabinete do ministro Alexandre de Moraes esclarece que, no curso das investigações do Inquérito (INQ) 4781 (Fake News) e do INQ 4878 (milícias digitais), nos termos das normas, foram feitas diversas determinações, requisições e solicitações a diversos órgãos , inclusive ao Tribunal Superior Eleitoral, que, no exercício do poder de polícia, tem competência para realizar denúncias sobre atividades ilícitas, como desinformação, discurso de ódio eleitoral, tentativa de golpe de Estado e ataques à Democracia e às Instituições. Os relatórios descreveram simplesmente postagens ilícitas feitas em redes sociais, de forma objetiva, pois estão diretamente ligadas a investigações sobre milícias digitais.
Vários desses relatórios foram reunidos nessas e em outras investigações relacionadas e encaminhados à Polícia Federal para dar continuidade às diligências necessárias, sempre com a Procuradoria-Geral da República informada. Todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com plena participação da Procuradoria-Geral da República.
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