Com uma das taxas mais baixas de representação feminina no Congresso entre os países do G20, o Brasil também deixou as mulheres fora do poder no nível municipal.
Levantamento feito pelo jornal O Globo com base em dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que em 3.555 cidades (63,8% do total do país), apenas homens comandaram prefeituras nas últimas duas décadas. Além disso, 27 municípios não elegeram vereadores no mesmo período, desde a eleição de 2000.
A lista de localidades sem histórico de prefeitas inclui capitais como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Velho, Belém e Rio Branco.
Em São Paulo, maior cidade do país, a última eleita foi Marta Suplicy (PT), em 2000. Este ano, seu nome voltará às urnasmas desta vez no cargo de vice na chapa de Guilherme Boulos (PSOL).
Em 2020, data das últimas eleições municipais, 18% das cidades (ou 978 municípios) não elegeram nenhuma mulher para as Câmaras Municipais. Os dados constam do estudo “Desigualdades de Gênero e Raça na Política Brasileira”, produzido pelo Instituto Alziras, organização que visa ampliar a participação das mulheres na política.
Quanto às prefeituras, apenas 12% dos municípios eram liderados por mulheres em 2020. Em 2016, esse índice era de 11,5%. A este ritmo, aponta o estudo, seriam necessários 144 anos para alcançar a igualdade de género.
Nas duas últimas eleições municipais, apenas duas capitais elegeram mulheres para o executivo municipal em todo o país: Palmas (TO), em 2020, e Boa Vista (RR), em 2016.
“Fiquei bastante surpresa em 2020 ao saber que fui a única mulher eleita em todas as capitais. Foi surpreendente saber que há partidos que ainda não incentivam essas candidaturas e que isso não é prioridade, mesmo sabendo do responsabilidade e necessidade de ter mulheres nesses espaços de poder espero que aumentemos a presença feminina nas eleições municipais de 2024 e espero um cenário diferente neste ano”, disse a prefeita de Palmas, Cinthia Ribeiro (PSDB), a única. mulher eleita na capital nas eleições de 2020.
No geral, as mulheres estão concentradas em municípios mais pequenos, governando apenas 9% da população do país.
O número é ainda menor quando o corte inclui também o fator racial. Segundo o estudo, as mulheres negras comandam apenas 4% dos municípios do país. Em termos de vereadores, 57% dos municípios não têm sequer um vereador negro eleito.
A diretora do Instituto Alziras, Michelle Ferreti, destaca que mesmo quando eleitas, as mulheres enfrentam dificuldade para impor suas agendas.
Ela avalia que uma mudança de cenário passa por mais acesso a recursos financeiros de campanha, além de políticas de cotas para gênero e raça. Desde a disputa de 2020, é obrigatório que cada partido inclua pelo menos 30% de candidatas mulheres nas chapas de vereador e deputado.
“O que vemos é que, quando conseguem se eleger, são minoria nos espaços. E uma mulher sozinha tem mais dificuldade em definir sua agenda, ocupar espaço na diretoria e presidir comissões importantes nos espaços legislativos “, disse Ferreti.
“Diversificar estes espaços é muito necessário, porque não podemos falar de uma democracia forte se a maioria do nosso país não ocupar os espaços de poder”.
A Ministra da Mulher, Cida Gonçalves, disse que o seu departamento tem trabalhado desde o ano passado para aumentar a participação das mulheres em espaços de liderança, o que significa também fazer um trabalho para combater a violência política de género.
Gonçalves avalia que há questões mais específicas relacionadas ao gênero que colocam desafios à participação das mulheres nas eleições. Entre elas estão as responsabilidades domésticas e de cuidados, tarefas atribuídas maioritariamente às mulheres.
“As mulheres são responsáveis por cuidar da casa. Antes de se candidatarem, elas pensam em como será a família e muitas vezes optam por não serem candidatas. essas mulheres estão nos espaços de disputa?”, disse a ministra ao GLOBO.
Segundo o Instituto Alziras, a divulgação de informações falsas, ataques, insultos e discursos de ódio e constrangimentos pela exposição do convívio familiar aparecem entre as violências mais frequentes destacadas na campanha de 2020.
“Essa ausência está relacionada ao assédio, à violência patriarcal, à violência política e à forma como as mulheres são violadas no seu direito ao trabalho. Muitas vezes os candidatos têm uma proposta inovadora e, devido à violência política, perdem a possibilidade de exercê-la. essas denúncias”, comenta a presidente da organização Elas no Poder, Thânisia Cruz.
Como mostrou o GLOBO, dados atualizados do Ministério Público Eleitoral mostram que os casos de violência política contra as mulheres aumentaram três vezes este ano em relação à última eleição. Em 2024, só até agosto — ou seja, antes do início das campanhas — já foram abertos 17 procedimentos. Há quatro anos, eram 6 no total.
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