Dos 645 municípios paulistas, 185 demonstram total dependência de repasses feitos pelos governos estadual e federal para a manutenção da máquina pública, segundo dados do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) com base nos números do Orçamento de 2023 . De todo o valor disponível nos cofres públicos desses municípios, mais de 90% corresponde ao Fundo de Participação Municipal (FPM) e ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS).
O município com menor orçamento próprio em relação ao que recebe de outras entidades é Santa Cruz da Esperança, na região de Ribeirão Preto. Segundo o TCE-SP, a cidade de pouco mais de dois mil habitantes arrecadou R$ 662.076,17 em 2023. O orçamento total do ano passado, porém, foi de R$ 26.485.184,98. A receita própria equivale, portanto, a 2,5% do que aquele município recebeu no ano passado.
O levantamento do TCE mostra o montante de recursos próprios, como Imposto sobre Serviços (ISS), Imposto de Transmissão de Mercadorias (ITBI) e Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), taxas e contribuições para benfeitorias. O Estado é responsável pelo repasse de 25% do ICMS e 50% do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA). O governo federal distribui o FPM e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) aos municípios.
Especialista em Direito Administrativo e Tributário, José Arnaldo da Fonseca Filho disse não ter esperança de que a reforma tributária, tal como está, resolva a dependência dos municípios. “A verdadeira reforma tributária, que existiu no passado, foi para resolver esse tipo de problema, para evitar essa dependência. Entendo que hoje os municípios estão, não só em São Paulo, mas no Brasil, dependentes da União”, ele afirmou. Na avaliação de Fonseca Filho, a situação deixa os gestores municipais pressionados para se alinharem com quem está no comando do governo do estado e da Presidência.
Pacto Federativo
Especialista em Direito Público, Frederico Meyer defende revisão do Pacto Federativo, na tentativa de reorganizar os recursos e obrigações dos entes. “A Constituição criou um desenho em que a grande força arrecadadora é a União. Os impostos que a União arrecada são aqueles que têm um peso gigantesco no sentido de volume de recursos. esse já é um ponto que traz relevância para a desordem da nossa Federação. Basicamente, o que se tem falado nos últimos anos são formas e tentativas de fazermos novos arranjos”, disse.
Meyer destacou ainda que, na desordem federativa, é o município que está mais próximo do cidadão e que presta serviços básicos de saúde e educação, por exemplo. “Eles têm um custo enorme para prestar serviços públicos e por isso há uma crítica feita na Lei, desde a promulgação da Constituição. Quem tem contato com o cidadão é o município e o Estado. , também a educação”, disse ele.
Em Pontalinda, região de São José do Rio Preto, a receita municipal em 2023 foi de R$ 1.326.166,57. Porém, R$ 46.440.823,21 entraram nos cofres públicos. A cidade é a segunda mais dependente. As receitas próprias representam 2,86% dos fundos públicos. Pontalinda tem pouco mais de quatro mil moradores.
A terceira cidade da lista é Borá, conhecida por ser a menor cidade de São Paulo, com cerca de 800 habitantes. Segundo dados do TCE-SP, a receita própria dos Boraenses foi de R$ 658.307,24, o que representa 3,33% do total de R$ 19.753.609,44.
Número de cidades
Os dados do TCE também apontam para outra questão: a necessidade de revisão do número de municípios, segundo especialistas. Das 185 cidades analisadas pelo relatório, apenas 23 têm mais de 10 mil habitantes, como Teodoro Sampaio (22.173 moradores), Cunha (22.110) e Potim (20.392).
Em 2019, o então ministro da Economia, Paulo Guedes, fez declarações públicas sobre uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que pretendia extinguir cidades com até 5 mil habitantes que não comprovassem autossuficiência.
A proposta citada por Guedes não foi adiante. “E isso gerou uma polêmica enorme por causa do lobby. Vereadores, prefeitos, enfim, partidos políticos que são capitalizados pelos pequenos municípios, criticaram. da discussão política, fui um entusiasta da medida, porque municípios minúsculos de até 5 mil habitantes seriam extintos pela PEC justamente por não comprovarem sustentabilidade financeira”, disse Meyer.
A ideia de abolir as cidades – e anexá-las ao município mais próximo – reduziria os custos dos conselhos e prefeituras. Na maioria das pequenas administrações, a folha de pagamento de vereadores, secretários, prefeitos e servidores públicos consome quase todo o orçamento público. Como consequência, as cidades veriam um aumento nas receitas.
“Temos um volume absurdo de municípios no Brasil”, afirmou Fonseca Filho. “Há casos em que municípios que já eram pequenos foram separados em dois ou três. Isso também é fruto de interesse político, porque você cria outra prefeitura, você cria outra câmara. campanha, ganha-se dinheiro e assim por diante. Seria muito mais interessante (ter) municípios grandes, que poderiam até ser transformados em regiões administrativas no mesmo município, com um administrador local, se necessário.”
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