O ministro Alexandre de Moraes descartou nesta sexta-feira (28) a necessidade de criação de um código de conduta para ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). A afirmação foi dada aos jornalistas durante o Fórum Jurídico de Lisboa, liderado pelo ministro Gilmar Mendes.
O relatório questionava se o STF deveria criar um código, como o que a Suprema Corte americana divulgou em novembro passado. Os códigos de conduta também são comuns nos tribunais superiores europeus, como a Alemanha — um país onde as despesas dos juízes são publicadas no website do tribunal.
“Não, não creio que haja a menor necessidade, porque os ministros do Supremo já se pautam pela conduta ética que a Constituição determina”, disse Moraes.
O evento em Portugal vai na 12ª edição e foi apelidado no mundo jurídico e político de “Gilmarpalooza”, em referência à profusão de convidados e eventos paralelos em Lisboa, como jantares e festas.
O fórum consolidou-se no calendário político das autoridades brasileiras, mas também traz marcas de falta de transparência e potenciais situações de conflito de interesses.
A reportagem procurou os gabinetes dos seis ministros do STF que figuram na programação do evento — Gilmar, Moraes, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Flávio Dino, Cristiano Zanin —, mas, com exceção de Barroso, nenhum deles informou quem é pagando a viagem.
O STF disse que não há desembolso judicial para essas viagens.
Esta sexta-feira, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, provocou gargalhadas na plateia do Fórum de Lisboa ao contar uma anedota narrada pelo seu amigo, o ministro Gilmar Mendes.
Certa vez, o pai de Gilmar contratou uma banda para tocar em um evento. Os músicos eram horríveis. Alguém perguntou o nome da banda. “Os Astros”, disseram os instrumentistas. Segundo Gonet, o pai de Gilmar respondeu: “Por que vocês não mudam para “Os Independentes”? Cada um toca uma música diferente”.
Gonet contou a anedota para ilustrar a necessidade de coordenação no combate ao crime organizado. Pode ser válido, entretanto, para o dia do encerramento do fórum. Cinco ministros do Supremo Tribunal alternaram entre palco e plateia no auditório central da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Uma mesa única reuniu representantes de diversas siglas do ordenamento jurídico brasileiro: além de Gonet, representantes da AGU, CNJ, CGU — e do STF, na pessoa do ministro Cristiano Zanin. O tom geral foi a coordenação entre as diferentes peças do sistema jurídico – e as palavras “cacofonia” e “harmonia” tornaram-se recorrentes ao longo do debate.
O lema já havia sido lançado na mesa anterior pelo ministro Flávio Dino. “Quando um juiz fala em público, ele expressa o pensamento geral do tribunal, e não apenas a sua opinião individual”, disse ele. Essa harmonia, segundo Dino, contrasta com a cacofonia da polarização.
“A era do extremismo põe em causa a funcionalidade da política”, disse Dino. “Muitos nos perguntam por que realizamos este fórum em Lisboa, e não no Brasil. Uma resposta é que talvez no ambiente polarizado do Brasil isso seja impossível.”
Dino aludiu às críticas que o Fórum de Lisboa tem recebido, pela falta de transparência nas despesas e pelo clima de confraternização entre representantes do sistema jurídico e empresários de diversas áreas, alguns deles com processos em tribunais superiores.
“Gosto desta pluralidade, querem que voltemos ao tempo em que os magistrados se isolavam”. No momento em que falava sobre o papel do STF na preservação da democracia, Dino pediu uma salva de palmas para Moraes, que acabava de entrar na sala.
No restante do discurso, Dino seguiu a mesma linha do ministro Dias Toffoli no discurso do dia anterior, ao comentar o tema recorrente do Fórum de Lisboa este ano: a judicialização da política.
Dino disse que a autocontenção do STF não é necessariamente algo “para sempre” e relembrou um momento pouco edificante do STF brasileiro: a negação de habeas corpus à militante Olga Benario, esposa do líder comunista Luiz Carlos Prestes.
Ela acabou deportada e morta na Alemanha nazista. “É por isso que o Supremo se envolve em muitas coisas. Na verdade, não se envolve. O Supremo se envolve em muitas coisas”, disse Dino. Ele foi aplaudido pelos representantes das diversas siglas que estavam na plateia.
As declarações de Dino foram feitas dois dias depois de o presidente Lula (PT) afirmar que o STF “não precisa se envolver em tudo”.
O petista havia sido questionado sobre a decisão da Justiça de descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal.
“Esse projeto que foi votado no Supremo é da Defensoria Pública de São Paulo. Eu, se um dia um ministro do Supremo me pedisse um conselho, ‘presidente, o que eu faço?’, [eu diria] rejeitar estas propostas. A Suprema Corte não precisa se intrometer em tudo”, afirmou.
Lula também opinou que o Supremo deveria atuar nas questões mais ligadas à Constituição. “Não dá para ficar discutindo qualquer coisa porque aí começa a criar uma rivalidade que não é boa para a democracia nem para o Supremo nem para o Congresso Nacional”, acrescentou.
RELATÓRIO ABRE DEBATE SOBRE CONDUTA NOS EUA
O debate sobre a transparência dos gastos das supremas cortes ganhou força nos Estados Unidos após a série de reportagens “Friends of the Court”, publicada ao longo de 2023 pelo site ProPublica, que mostrou como os magistrados da Suprema Corte americana (lá chamada como “juízes”) recebiam viagens e presentes de magnatas e não divulgavam os benefícios.
A série mostrou que o incorporador imobiliário Harlan Crow, apoiador do Partido Republicano, comprou um imóvel do juiz Clarence Thomas, deu ao juiz uma carona em seu jato e pagou os estudos de seu sobrinho. Thomas disse em sua defesa que não era culpa dele ter “amigos ricos”.
Outro ministro do Supremo Tribunal Federal, Samuel Alito, saiu de férias com o investidor do mercado financeiro Paul Singer, que pagou suas despesas. Singer tinha questões pendentes na justiça americana.
A repercussão resultou na criação de um Código de Conduta. O documento, divulgado em 13 de novembro de 2023, reafirma o direito dos juízes de participarem de eventos acadêmicos, mas faz diversas advertências.
Tais eventos não podem ser patrocinados por empresas que tenham processos no Supremo ou que possam chegar a tribunais superiores no curto prazo. Os juízes também não podem participar em eventos de campanha de partidos políticos ou promover produtos comerciais.
O código de conduta americano apenas define regras de bom senso, sem prever limite de despesas ou obrigar um juiz a prestar contas.
Na Europa, os tribunais superiores têm códigos de conduta mais específicos. Na Alemanha, existe um limite para os presentes que um juiz pode receber – 150 euros. O juiz pode ter atividades acadêmicas e ministrar palestras, mas deve divulgar os honorários no site do tribunal para que os cidadãos alemães possam julgar se está dentro do adequado. apropriado.
Em Portugal também se aplica a regra dos 150€, devendo o juiz prestar contas do que recebe. Você não precisa fazer isso em público, como na Alemanha. Suas despesas são encaminhadas à Presidência da República e lá ficam registradas em caso de qualquer dúvida.
*Informações da Folhapress
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