JACKSON HOLE, Estados Unidos (Reuters) – O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse neste sábado que discutir a transmissão da política monetária se tornará cada vez mais difícil sem abordar questões fiscais e citou o peso crescente da dívida pública diante da expansão dos gastos do governo.
Falando na conferência económica anual da Reserva Federal de Kansas City, em Jackson Hole, Wyoming, Campos Neto destacou que os programas de transferência de dinheiro implementados durante a pandemia são agora maiores e tornaram-se permanentes.
No Brasil, 50 milhões de pessoas “ganham dinheiro do governo, em comparação com 43 milhões de pessoas que são empregados e empresários”, acrescentou.
Sem mencionar diretamente o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele disse: “Precisamos pensar em uma estratégia precisa e compreender a eficiência desses programas governamentais, especialmente nos países de mercados emergentes, e o que isso tem feito com a dívida”.
“Acho que precisamos começar a comunicar melhor a alocação incorreta de recursos.”
Em julho, o BC manteve a Selic em 10,5% pela segunda vez consecutiva, mas endureceu a retórica, citando ainda maior necessidade de cautela e monitoramento diligente dos fatores que condicionam a inflação.
Na ata da decisão, o BC disse que está acompanhando de perto como os recentes desenvolvimentos fiscais impactam a política monetária e os ativos financeiros, em meio a preocupações do mercado de que o governo Lula não eliminará o déficit primário neste ano e no próximo devido ao aumento das despesas.
“Precisamos abordar a dívida considerando a dinâmica dos mercados daqui para frente e, infelizmente, será muito difícil falar em transmissão (da política monetária) sem falar um pouco mais de questões fiscais”, disse Campos Neto, cujo mandato termina em dezembro.
Campos Neto disse que a volatilidade recente pode estar a mostrar que o mercado está a antecipar menos espaço para intervenções fiscais e monetárias no futuro.
Falando sobre a desaceleração da economia da China, o presidente do BC disse que isso poderia impactar o Brasil através de um choque nos termos de comércio ou de uma redução nos preços de importação de produtos chineses, embora o efeito líquido dependa do tamanho da desaceleração.
Esta semana, banqueiros centrais de todo o mundo viajaram para Jackson Hole para participar no principal encontro económico do mundo, o simpósio anual no Parque Nacional Grand Teton.
O painel sobre o qual Campos Neto falou discutiu a transmissão monetária, ou exatamente quanto efeito os movimentos das taxas de juros têm sobre a atividade econômica.
As declarações do presidente do BC seguiram os recentes esforços de comunicação dos membros da autoridade monetária para enfatizar que continuam unidos e considerando todas as opções para a próxima decisão marcada para os dias 17 e 18 de setembro.
(Por Howard Schneider e Marcela Ayres)
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