Apesar de o governo ter anunciado uma restrição de gastos de R$ 15 bilhões este ano para cumprir as metas de déficit zero, aliviando parcialmente as tensões fiscais, o preço à vista permanece acima de R$ 5,60. Analistas entrevistados por Transmissão (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) afirmam que, embora a desvalorização do real possa ser vista como exagerada, a barreira para uma queda sustentada do dólar aqui parece cada vez mais alta no curto prazo.
Duas variáveis que não estavam no radar dos investidores passaram a influenciar a formação da taxa de câmbio de forma mais decisiva: a antecipação da volatilidade esperada com a corrida eleitoral nos Estados Unidos e a recuperação do iene, após sinais de intervenção de o Banco Central do Japão (BoJ) no mercado de câmbio, que abalou as moedas emergentes.
O economista-chefe da Monte Bravo, Luciano Costa, observa que o ataque ao ex-presidente Donald Trump, no dia 13, fez com que os preços dos ativos refletissem antecipadamente o processo eleitoral americano. As idas e vindas em torno da continuação do presidente Joe Biden na corrida, que terminou no domingo, 21, abriram caminho para a nomeação de outro candidato democrata, provavelmente a vice-presidente Kamala Harris, para aumentar a incerteza.
“A expectativa era que a pauta de discussão da política econômica americana aparecesse em preços mais próximos da eleição, por volta de setembro, mas o ataque mudou tudo”, diz Costa.
Os investidores começaram a incorporar nos preços dos activos, especialmente nas taxas de juro longas americanas e no dólar, a possibilidade de uma nova administração Trump, que se tornou a favorita da Casa Branca. Nos cálculos da Eurásia, a chance de eleição do republicano é de 65%.
O sócio e diretor-superintendente da Azimut Brasil Wealth Management, Leonardo Monoli, afirma que Trump, ao mesmo tempo em que prega o enfraquecimento do dólar em relação a moedas como o iene e o iene, sugere que poderá aumentar tarifas e adotar uma política mais agressiva em relação a China – o que é negativo para as moedas emergentes.
“Trump faz muito barulho, cria muito barulho. E não sabemos que tipo de política ele adotará”, diz Monoli. “Ele pode tentar ajustar o dólar frente às moedas desenvolvidas, mas sem que isso provoque uma correção em relação às emergentes”.
Para o economista André Perfeito, a tentativa de Trump de “fechar a economia americana” para tentar trazer empregos para os EUA tem como efeito líquido mais inflação. Isto implica taxas de juro mais elevadas e, por extensão, um dólar mais forte. “Se de fato Trump for atrás da China e esta economia enfraquecer, poderemos ver um impacto no Brasil devido à menor importação de produtos brasileiros pelos chineses”, afirma.
Fator técnico
O ambiente externo também se tornou mais adverso com o recente fortalecimento do iene, que já se valorizou mais de 4% em relação ao dólar em julho. O real é uma das moedas mais utilizadas nas chamadas operações de carry trade, nas quais os investidores tomam empréstimos em moedas de países com taxas de juros baixas para investir em moedas de países com taxas de juros altas. Com a valorização da moeda, ocorre uma reversão parcial dessas operações, o que tende a provocar a desvalorização de moedas como o real e a divisa.
Monoli, da Azimut, nota que a alegada intervenção do BoJ no mercado cambial ocorreu numa altura em que o mercado tinha um posicionamento técnico “muito vendido” no iene, lembrando que a próxima decisão de política monetária japonesa poderá provocar uma nova ronda de valorização da moeda japonesa.
Tanto a turbulência em torno das eleições americanas como a valorização do iene acabaram por ofuscar em parte o impacto positivo nas moedas emergentes da consolidação das apostas na redução de juros por parte da Reserva Federal este ano. A safra mais recente de dados de atividade e inflação americana levou a um aumento significativo nas chances de um corte inicial em setembro e a uma redução total de 75 pontos base na taxa básica americana até o final de 2024.
Costa, da Monte Bravo, observa que, com um reequilíbrio das posições para o novo patamar do iene, o que deixaria o mercado “tecnicamente mais leve”, as moedas emergentes poderiam valorizar se o Fed der um sinal forte na sua reunião de política monetária (julho 30 e 31) que se prevê que as taxas de juro sejam reduzidas em Setembro.
Supervisor
Apesar do peso da situação externa, a percepção do risco fiscal interno ainda é vista como a principal responsável pelo atual nível da taxa de câmbio.
Monoli, da Azimut, observa que o comportamento do dólar no mercado interno esteve praticamente em linha com o do índice – que mede o desempenho da moeda americana em relação a uma cesta de seis moedas fortes – até o final de abril e início de maio.
Segundo o gestor, a mudança na regra-quadro em abril, permitindo ao governo antecipar a ampliação do limite de gastos, foi o estopim para uma onda de desvalorização do real, provocando um descolamento da moeda brasileira do DXY. Ele destaca que, após a mudança da regra no marco, houve uma decisão dividida do Comitê de Política Monetária (Copom) em maio, seguida de ataques do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Banco Central.
“O dólar foi para R$ 5,70, num distanciamento bizarro. Aí o governo esfriou o discurso e deu mais peso ao compromisso do Haddad com o enquadramento, e o real se recuperou um pouco. e Trump”, diz Monoli, destacando, porém, que o câmbio ainda carrega um prêmio de risco relevante por causa da questão fiscal doméstica.
“Teremos em agosto a Lei de Diretrizes Orçamentárias 2025. Se o governo trouxer algo minimamente credível com cortes de gastos e medidas forem implementadas para atingir a meta, há espaço para um ajuste no nível da moeda. dólar voltou a cair para R$ 5,00, mas pode voltar um pouco”, diz.
Para Costa, de Monte Bravo, o dólar poderá voltar a R$ 5,40 se o governo reforçar que perseguirá metas fiscais, com o anúncio, por exemplo, de medidas para reduzir R$ 25,9 bilhões em despesas no Orçamento 2025.
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