Investing.com – O cenário de estresse nos mercados com valorização do real frente ao real foi amenizado após mudança no tom do governo, mas economistas discordam sobre os rumos da moeda americana em um ambiente externo volátil e uma série de ruídos e questões internas . Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master, avalia que a recente alta do dólar para R$ 5,70 – mesmo que recuasse posteriormente – seria uma crise de confiança no mercado financeiro, mas não uma verdadeira crise na economia, dada uma série de indicadores económicos que avalia como positivos.
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As críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao nível dos juros, ao Banco Central e às ações de Roberto Campos Neto, que ajudaram a pressionar os ativos de risco, deram lugar a um discurso e anúncio mais moderado do Ministro da Fazenda , Fernando Haddad, para cortar gastos no próximo ano ao patamar esperado de R$ 25,9 bilhões em despesas obrigatórias, com um “pente fino” feito nos benefícios sociais. Além disso, Lula reafirmou seu compromisso com o marco fiscal, que trouxe mais tranquilidade aos mercados e, se seguir essa linha, a tendência é tirar a pressão do dólar, no seu entendimento.
“O que vimos nas últimas semanas foi um déficit de força na equipe econômica e no ministro Haddad”, avalia Gala.
Gala vê possibilidade de o dólar voltar a um patamar mais próximo de R$ 5, caso o governo continue demonstrando esse compromisso. “Basta o mercado acreditar que o quadro fiscal será cumprido e, por isso, o governo precisa dar indicações mais concretas nesse sentido”, acrescenta.
Leia a entrevista com o economista:
Investing.com – Em suas redes sociais, você afirmou que a alta do dólar para R$ 5,70 nada mais seria do que uma crise de confiança, e não é uma crise econômica real. Por quais motivos?
Paulo Gala – Quando olhamos os dados da economia brasileira, vemos que os dados são bons. O Produto Interno Bruto () crescerá 2,5% este ano, o desemprego caiu para 7,1%, e aponta, mais uma vez, para um recorde próximo dos 100 mil milhões de dólares, as reservas cambiais permanecem intactas. Todos os indicadores de confiança da economia real permanecem bons. É importante separar o que é confiança financeira, rácios financeiros, por exemplo. Se olharmos as pesquisas da Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre confiança comercial, confiança do consumidor, confiança da indústria, todos esses indicadores estão nos máximos de um ano. Em outras palavras, não há evidências de uma crise econômica real na economia brasileira. É uma crise muito mais de confiança do que de actividade económica, por assim dizer.
Investing.com – As recentes conversas sobre valorização foram um tiro no pé, na sua opinião?
Gala – O governo desenhou uma regra muito interessante, que é o marco fiscal. O problema é que ele precisa mostrar que vai cumprir esse quadro fiscal. A equipe do ministro Fernando Haddad no Ministério da Fazenda trabalha para garantir que essa regra seja cumprida e que as metas sejam alcançadas. O presidente Lula às vezes fortalece mais a equipe e às vezes fortalece menos. O que vimos nas últimas semanas foi um déficit de força por parte da equipe econômica e do ministro Haddad. A partir de ontem parece que mudou o tom, parece que mudou a perspectiva, inclusive essa valorização de quase 4% do real, acredito que tem muito a ver com isso. Tem a ver também com os Estados Unidos, os dados melhoraram, uma economia mais fraca lá também ajuda, as moedas emergentes valorizaram, mas entendo que essa mudança de tom de ontem contribuiu para essa melhora tanto na queda dos juros aqui quanto no taxa de câmbio no Brasil.
Investing.com – Como você avalia os sinais de corte de gastos do governo para o próximo ano? É suficiente?
Gala – Acho que é suficiente. A regra-quadro diz que as despesas não podem crescer mais de 70% do crescimento das receitas. Então, se a receita do próximo ano crescer 10%, as despesas deverão crescer 7%. Se a receita cresce 5%, as despesas têm que crescer 3,5%, ou seja, o valor que é preciso poupar e o valor dos gastos que é preciso fazer não são gigantescos, é uma regra ainda mais branda, mais leve do que a que foi o teto de gastos, no qual não poderia haver aumento no crescimento real dos gastos. Esta regra deve ser honrada. Portanto, não faz sentido desenhar o quadro fiscal e não cumpri-lo. Acho que o mercado está passando por duas incertezas. A incerteza de quem será o presidente do Banco Central e o que ele fará e a incerteza se a regra do enquadramento fiscal será cumprida ou não.
Investing.com – O que poderia trazer nossa taxa de câmbio para mais perto de R$ 5 por dólar?
Gala – Basta que o mercado acredite que o quadro fiscal será cumprido e, por isso, o governo precisa dar indicações mais concretas nesse sentido. Acredito que o anúncio de ontem sobre o corte de gastos é um passo nessa direção. E, é preciso ter mais clareza sobre quem será o presidente do Banco Central e qual será a linha adotada pelo BC, e tudo nos leva a querer acreditar no Gabriel Galípolo, com uma diretoria muito técnica. Precisamos lembrar que também haverá mais agendamentos a serem feitos até o final do ano. Quando houver clareza sobre isso no mercado, as coisas tenderão a se acalmar e o dólar poderá voltar para a faixa dos R$ 5.
Investing.com – Nesse cenário, o que você espera para as próximas decisões sobre taxas de juros no Brasil, há espaço para mais cortes ou aumentos este ano? Depende do Fed?
Gala – Eu acho que está dado. A Selic deve ficar em 10,5% até o final do ano, até porque as expectativas de inflação já subiram para 4%, o IPCA já está em 4. Para meta de 3%, as expectativas também subiram para o próximo ano. para 3,7%. Então, para este ano, acho que o ciclo de cortes acabou.
As chances de aumento aumentaram, mas não creio que haverá aumento. Na verdade, tudo depende precisamente de onde vai parar a taxa de câmbio. O câmbio de R$ 5,50 tem efeito inflacionário, de R$ 5,00 não. É por isso que essa desvalorização cambial atrapalha muito a vida do governo, porque pressiona a inflação e, ao pressionar a inflação, pressiona o Banco Central para alterar a taxa de juros.
Além disso, os dados mais recentes sobre a economia americana são mais fracos. O ISM de serviços apresentou contração, as taxas aumentaram, o relatório mostrou uma criação mais fraca de vagas no mercado de trabalho. Hoje, a chance de corte nos juros nos Estados Unidos em setembro já é de 75%. Isso também ajudou o real e ajudou as moedas emergentes.
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