A polícia queniana disparou balas de borracha e gás lacrimogêneo contra manifestantes em Nairóbi nesta quinta-feira (27), enquanto os manifestantes voltavam às ruas da capital queniana para prestar homenagem às vítimas da repressão brutal aos protestos contra um plano de aumento. de impostos no início da semana, quando mais de 20 pessoas morreram.
A nova manifestação foi mantida, apesar da desistência do presidente William Ruto em aprovar o projeto.
Os protestos, liderados em grande parte por jovens quenianos, apanharam as autoridades desprevenidas enquanto o governo de Ruto hesitava entre adoptar uma linha dura em relação aos distúrbios e apelar ao diálogo.
Dezenas de manifestantes reuniram-se no distrito comercial central de Nairobi. Soldados e policiais destacados com equipamento de choque bloquearam o acesso ao longo das estradas que levam ao gabinete de Ruto na Câmara de Estado e ao parlamento.
A polícia disparou balas de borracha e gás lacrimogêneo contra pequenos grupos de manifestantes e prendeu pelo menos sete pessoas. Os confrontos eclodiram quando alguns manifestantes atiraram pedras contra a polícia, viram jornalistas da AFP.
— Os jovens não vão descansar. É pelo nosso futuro que lutamos – disse Lucky, um estudante universitário de 27 anos, entrevistado pela agência francesa, acrescentando que não confiava em Ruto, que anteriormente comparou os manifestantes a “criminosos” antes de recuar.
Muitas lojas permaneceram fechadas na capital, pois os comerciantes estavam preocupados com mais agitação. Os manifestantes também se reuniram na cidade portuária de Mombaça e no reduto da oposição de Kisumu, com alguns bloqueando estradas e incendiando pneus na cidade à beira do lago.
Depois que o complexo do parlamento foi saqueado na terça-feira e a polícia abriu fogo contra os manifestantes, Ruto recusou-se a sancionar os aumentos e retirou o projeto de lei na quarta-feira.
— O povo falou — disse, acrescentando que procuraria “o envolvimento com os jovens da nossa nação”.
Mas os manifestantes realizaram a manifestação de quinta-feira em memória dos mortos nas manifestações, criticando a dramática reviravolta de Ruto.
Ivy, de 26 anos, disse à AFP na quarta-feira que a reviravolta de Ruto foi “um começo para mudar as coisas”.
“Ele poderia ter feito isso antes, sem que as pessoas morressem”, acrescentou ela, ecoando as palavras de outros manifestantes.
‘Não posso correr riscos’
Um grupo de direitos humanos apoiado pelo Estado contou 22 mortes em todo o país – 19 só em Nairobi – na sequência dos protestos de terça-feira e prometeu uma investigação.
“Este é o maior número de mortes num único dia de protesto”, disse Roseline Odede, presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Quénia, financiada pelo Estado, acrescentando que 300 pessoas ficaram feridas em todo o país.
As lojas estavam praticamente fechadas no distrito comercial de Nairobi na quinta-feira.
— Não podemos correr riscos. Não sabemos o que acontece a seguir — disse Joe, funcionário da perfumaria, enquanto se preparava para voltar para casa. — Por que tiveram que matar esses jovens? Este projeto de lei não vale a pena morrer por pessoas.
‘Estamos em águas desconhecidas’
A agitação alarmou a comunidade internacional, com os EUA a apelar ao Quénia para respeitar o direito ao protesto pacífico e a ONU a apelar à “responsabilização” pelo derramamento de sangue.
Vigilantes dos direitos humanos acusaram as autoridades de sequestrar manifestantes, mas a polícia não respondeu aos pedidos de comentários da AFP.
Medos da dívida
Ruto reverteu algumas das medidas fiscais na semana passada, levando o Tesouro a alertar sobre um déficit orçamentário de 200 bilhões de xelins (R$ 8,4 bilhões). O presidente disse na quarta-feira que a retirada do projeto de lei significaria um buraco significativo no financiamento de programas de desenvolvimento para ajudar agricultores e professores, entre outros.
O governo sem dinheiro tinha afirmado anteriormente que os aumentos eram necessários para pagar a dívida do Quénia de cerca de 10 mil milhões de xelins, o equivalente a cerca de 70 por cento do PIB.
Analistas alertaram que a administração de Ruto enfrentará uma escolha difícil nas próximas semanas.
O governo “terá agora de encontrar uma forma de pacificar duas forças opostas: uma população disposta a recorrer à violência para proteger os seus meios de subsistência e uma trajetória macroeconómica que, salvo um apoio multilateral considerável, está a caminhar para um precipício”, afirmou a Oxford Economics em uma afirmação
A administração de Ruto está sob pressão do Fundo Monetário Internacional, que apelou a reformas fiscais para fornecer financiamento.
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