A Alemanha reintroduziu esta segunda-feira os controlos migratórios nas fronteiras terrestres com outros países da União Europeia (UE), no que o governo de Berlim chama de ações focadas na segurança interna e no controlo da imigração.
Os governos do bloco criticaram a medida, e apontam que ela é uma ameaça ao modelo de livre circulação de pessoas dentro do chamado Espaço Schengen, do qual a Alemanha faz parte.
Ao abrigo das novas regras, os controlos estão a ser realizados nas fronteiras terrestres com França, Luxemburgo, Bélgica e Dinamarca, e os viajantes são aconselhados a portar documentos pessoais, como identidade ou passaporte, incluindo visto de entrada, no caso de determinados países.
Desde junho, já existem controlos semelhantes em vigor nas fronteiras com a Áustria, a Suíça (que não faz parte da UE, mas faz parte do Espaço Schengen), a República Checa e a Polónia.
Por determinação, os agentes de segurança têm o poder de negar a entrada do viajante na Alemanha. Além dos controlos nos postos fronteiriços formais, haverá, segundo o Ministério do Interior, patrulhas conjuntas e um centro de cooperação aduaneira com as nações vizinhas.
— Queremos reduzir ainda mais a migração irregular, deter os contrabandistas de migrantes e os criminosos e detectar os islamistas antes que possam causar qualquer dano. Continuamos a trabalhar em estreita colaboração com os nossos países vizinhos — disse a ministra do Interior alemã, Nancy Faeser, no domingo.
Apesar de fazer parte do chamado Espaço Schengen, onde os viajantes podem transitar sem controlos fronteiriços, a Alemanha invocou um instrumento do acordo, que permite aos seus membros adoptar, a título temporário, medidas de restrição migratória, sob alegações de uma “grave ameaça ”à segurança interna ou à ordem pública.
Segundo a Comissão Europeia, esta deverá ser uma ação destinada apenas a “situações excecionais”, e precisa de ser vista como um “último recurso”. Desde 2006, o mecanismo foi adotado 441 vezes, sendo a França a “campeã” dos pedidos.
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Outrora conhecida pela sua política de “portas abertas”, adoptada em plena crise migratória de 2015 e 2016, a Alemanha avançou para uma política migratória mais restrita. A percepção, nem sempre confirmada pelos números, de que os imigrantes estão “roubando empregos” aos alemães espalhou-se rapidamente.
Episódios de violência envolvendo estrangeiros também pressionaram o chanceler Olaf Scholz — no mês passado, um homem sírio esfaqueou três pessoas até à morte e feriu outras oito num festival em Solingen, um ataque reivindicado pelo grupo terrorista Estado Islâmico.
Uma pesquisa recente, realizada pela organização Alliance for Democracies, mostrou que 44% dos alemães apoiam políticas de controle migratório, a taxa mais elevada entre os 53 países onde a pesquisa foi realizada. Mais do que nas sondagens, os alemães apoiam nas urnas as políticas anti-imigração da Alternativa para a Alemanha (AfD), que há duas semanas venceu as eleições estaduais na Turíngia, a primeira vitória da extrema direita desde a Segunda Guerra Mundial. No domingo, o partido é o favorito para vencer também em Brandemburgo, estado controlado pelos sociais-democratas desde a década de 1990. Nas eleições para o Parlamento Europeu, em junho, o partido foi o segundo mais votado do país.
Para inverter a tendência e melhorar os seus péssimos índices de aprovação, Scholz começou a aplicar controlos fronteiriços específicos desde o ano passado, dificultando a entrada na Alemanha de pessoas que procurassem asilo no país.
— Estes controlos também garantem que podemos efetivamente negar a entrada nas fronteiras, e mais de 30.000 pessoas tiveram a entrada recusada desde outubro de 2023. Desde então, o número de pedidos de asilo diminuiu 20% e o número de remoções também aumentou 20%. %. Isto mostra que as nossas medidas estão a funcionar. E é por isso que continuamos seguindo esse rumo — disse Nancy Faeser no domingo.
Noutra frente, Scholz afirma que tem trabalhado para aumentar o número de deportações —uma nova lei, apresentada em junho, permite que pessoas que manifestem apoio ao terrorismo sejam enviadas para os seus países de origem, sejam eles quais forem. No mês passado, foram retomados os voos de repatriamento para o Afeganistão, suspensos após o regresso dos talibãs ao poder em 2021.
Se no plano interno as medidas de Scholz ainda parecem não ter funcionado com os eleitores, na União Europeia foram recebidas com críticas por parte dos seus vizinhos.
— Tais ações são inaceitáveis do ponto de vista polaco — disse o primeiro-ministro polaco, Donald Tusk, na semana passada, numa reunião de embaixadores em Varsóvia. — Hoje, precisamos do apoio total da Alemanha e de toda a UE quando se trata de ajudar a organizar, financiar e armar a fronteira oriental, também no contexto da migração ilegal.
A Áustria classificou a decisão como “ilegal” e disse que não aceitará imigrantes rejeitados por Berlim.
— É inaceitável quando acontecem coisas ilegais. Vivemos num Estado constitucional e se a Alemanha está a planear isto, então é ilegal dessa forma. Então não aceitaremos ninguém de volta, não aceitaremos ninguém de volta. Não há aqui margem de manobra – disse o ministro do Interior, Gernard Karner, citado pelo site Euronews.
Embora não tenha fronteiras com a Alemanha, o governo grego afirmou que as medidas serão um “fardo” para o seu país, uma porta de entrada para imigrantes vindos do Médio Oriente e do Norte de África.
— A Alemanha tinha uma política extremamente tolerante e, eu diria, socialmente generosa para com os migrantes, que está agora a desencadear uma enorme reação social — disse o Primeiro-Ministro Kyriakos Mitsotakis numa entrevista a uma estação de rádio grega. — A resposta não pode ser descartar unilateralmente Schengen e deixar a bola cair para os países que ficam nas fronteiras externas da Europa.
Também houve espaço para elogios, de grande parte da extrema direita: Marine Le Pen, do Reagrupamento Nacional Francês, questionou quando Paris adotará medidas semelhantes. Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria e grande defensor do controle migratório na Europa, deu as boas-vindas a Scholz no clube, e posteriormente seu porta-voz emitiu um comunicado com tons de ironia.
“Mas agora, quando a Alemanha anuncia o seu plano para reintroduzir controlos nas fronteiras internas, parece que aqueles que anteriormente rejeitaram a nossa abordagem fecharam o círculo. Engraçado como alguns anos – e uma crise migratória – podem mudar mentalidades, não é?”
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