A capital da França, Paris, registrou o primeiro caso de transmissão local de chikungunya, ou seja, de uma pessoa que foi infectada na cidade, e não de alguém que trouxe o vírus do exterior.
Segundo a autoridade de saúde pública francesa, o paciente começou a apresentar sintomas no dia 18 de julho, cerca de uma semana antes do início das Olimpíadas.
O caso é o primeiro autóctone na Europa desde 2017, segundo o Centro Europeu de Controlo e Prevenção de Doenças (ECDC).
Além disso, é inédito no extremo norte do continente, destaca o epidemiologista André Ribas Freitas, professor da Faculdade de Medicina de São Leopoldo de Campinas e Limeira, em São Paulo.
Segundo o ECDC, entre 2007 e 2017 ocorreram cinco episódios de transmissão local de chikungunya, registados em Itália e França.
Todos os relatos franceses foram no sul do país, perto da Itália, onde as condições climáticas são mais favoráveis ao mosquito transmissor – longe da capital Paris, no norte.
Numa avaliação de risco, o centro europeu afirmou que o risco para residentes e visitantes – só nos atletas olímpicos a cidade recebe mais de 10 mil pessoas – é “baixo”.
Ainda assim, considera que “a confiança da avaliação é (também) baixa, uma vez que as investigações epidemiológicas e entomológicas ainda estão em curso”.
O ECDC cita, por exemplo, que o Aedes albopictus, mosquito “primo” do Aedes aegypti e responsável pela transmissão da dengue e da chikungunya nos países europeus, “está estabelecido nos departamentos de Paris e Hauts-de-Seine” e que “as condições ambientais as condições atuais são favoráveis à (sua) propagação”. “Portanto, outras transmissões indígenas não podem ser excluídas”, continua.
Ribas Freitas explica que o caso não significa que Paris começará a ter surtos da doença no curto prazo, mas reforça que é um sinal de alerta que exemplifica a expansão geográfica das doenças transmitidas por mosquitos, graças às mudanças climáticas, e à risco permanente de se estabelecerem nesses países ao longo do tempo.
— O continente já registou surtos isolados, mas estes ocorreram apenas na região mais meridional da Europa, principalmente na bacia do Mediterrâneo, onde faz calor. Porque as temperaturas mais frias sempre foram limitantes para os mosquitos. Mas este registo agora em Paris é o mais a norte onde já houve transmissão, e numa região metropolitana. Reflete o que temos observado, que é o aumento da população de mosquitos na Europa, tanto na área infestada como na quantidade do vetor, graças às alterações climáticas. Essa situação está piorando – afirma.
O mosquito nesse caso é o Aedes albopictus, que assim como o Aedes aegypti, também pode transmitir dengue, zika e chikungunya. Os ovos do Aedes albopictus resistem ao inverno europeu, ao contrário dos do Aedes aegypti, por isso pode infestar áreas de clima temperado.
— A maior preocupação é porque trabalharam muito na tentativa de diminuir a população por causa das Olimpíadas, mas mesmo assim não conseguiram prevenir casos de transmissão local. Isto aponta para uma tendência preocupante de vermos cada vez mais regiões na Europa que, a partir de um caso importado, têm a doença introduzida, uma vez que a população de mosquitos está bem estabelecida. E estamos falando de chikungunya, mas também de dengue, zika e até de outras doenças, como a febre oropouche, porque as mudanças climáticas também favoreceram a expansão geográfica de outros vetores — avalia Ribas Freitas.
A França, por exemplo, também registrou neste ano dois casos de transmissão local de dengue, um em junho e outro no final de julho, nos departamentos de Hérault e Alpes-Maritimes, que ficam no sul do país.
No caso da dengue, desde 2010 a Europa não passa mais de dois anos sem registrar casos autóctones da doença, segundo o ECDC. No entanto, a situação piora a cada ano. Em 2023, o continente teve o maior número de registros de transmissão local, 130 casos em França, Itália e Espanha – três no departamento onde fica Paris.
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