Vencedor do Nobel da Paz vai liderar governo em Bangladesh

A presidência de Bangladesh anunciou nesta quarta-feira (7) que o ganhador do Prêmio Nobel da Paz, Muhammad Yunus, criador de um sistema de microcrédito para a população pobre, liderará um governo interino no país, após a dissolução do Parlamento e a fuga da primeira-ministra Sheikh Hasina.

A decisão de formar um governo interino liderado por Yunus foi tomada durante uma reunião entre o presidente Mohamed Shahabuddin, comandantes militares e líderes estudantis que organizaram protestos desde julho, disse a Presidência do país.

“O presidente pediu ao povo que o ajudasse a superar a crise. Para conseguir isso, é necessário formar rapidamente um governo interino para tentar superar a crise”, acrescentou a Presidência num comunicado.

Muhammad Yunus disse à AFP na terça-feira que estava disposto a chefiar um governo interino. “Sempre mantive a política à distância (…) Mas hoje, se for necessário agir no Bangladesh, pelo meu país e pela coragem do povo, então o farei”, disse Yunus.

O economista de 84 anos é conhecido por ter tirado milhões de pessoas da pobreza através da concessão de microcréditos, iniciativa pela qual recebeu o Prémio Concórdia Príncipe das Astúrias em 1988 e o Prémio Nobel da Paz em 2006.

Yunus ganhou a inimizade de Sheikh Hasina, que o acusou de “sugar o sangue” dos pobres.

Nahid Islam, líder do movimento estudantil, confirmou a decisão após uma reunião de três horas com o presidente. Ele descreveu as conversas como “frutíferas”.

O presidente Shahabuddin concordou que o governo interino “seja formado o mais rápido possível”.

Mohamed Shahabudin demitiu o comandante da polícia nacional, na sequência das manifestações sangrentas que levaram à fuga da primeira-ministra Sheikh Hasina.

O chefe da diplomacia norte-americana, Antony Blinken, afirmou que o novo governo deve “respeitar os princípios democráticos, o Estado de direito e refletir a vontade do povo”.

O presidente também dissolveu o Parlamento na terça-feira, uma das principais reivindicações dos estudantes, partilhada com a principal formação da oposição, o Partido Nacionalista do Bangladesh (BNP), que exige a convocação de eleições nos próximos três meses.

Sheikh Hasina, de 76 anos, estava no poder há 15 anos, mas o seu último mandato como primeira-ministra, que começou em Janeiro, foi marcado por um boicote às eleições da oposição, que as denunciou como nem livres nem justas.

Polícia pede desculpas

O primeiro-ministro acabou por demitir-se e fugiu do país na segunda-feira, pressionado por uma onda de protestos que começou no mês passado com um movimento estudantil contra um sistema de quotas para funcionários públicos, mas que evoluiu para uma mobilização mais ampla contra o governo.

Um total de 432 pessoas morreram nos protestos, 10 delas na terça-feira e 122 na segunda-feira, segundo uma contagem da AFP baseada em informações divulgadas pela polícia, governo e fontes médicas.

Na terça-feira, a situação era menos tensa, apesar das 10 mortes registadas. Os estabelecimentos comerciais reabriram as portas e o recolher obrigatório foi levantado.

O Exército reestruturou a liderança militar e removeu comandantes seniores considerados próximos de Hasina.

Na noite de segunda-feira, o chefe de Estado ordenou a libertação das pessoas detidas durante as manifestações e da principal rival política de Hasina, a ex-primeira-ministra Khaleda Zia, do BNP, que esteve em prisão domiciliária durante anos.

Num comunicado divulgado na terça-feira, o principal sindicato policial “pediu desculpas” pelos disparos contra estudantes.

A federação afirmou que a polícia foi obrigada a “abrir fogo” contra os jovens e que estes foram então apresentados como “vilões”. Ele também anunciou uma greve para garantir a segurança dos funcionários.

Milhões de pessoas saíram às ruas de Dhaka, a capital, na segunda-feira, após a renúncia de Hasina.

Os manifestantes invadiram o Parlamento e incendiaram estações de televisão, e alguns destruíram estátuas do pai de Hasina, o xeque Mujibur Rahman, que liderou a luta pela independência contra o Paquistão em 1971.