Os acordos políticos que deram ao argentino Javier Milei a sua primeira vitória parlamentar poderão dissolver-se face à nova etapa enfrentada pelo presidente ultraliberal, pressionado a mostrar governabilidade em meio à crise económica do país, alertaram analistas.
“A sanção da Lei Básica foi importante, mas representa apenas um passo, num processo que enfrentará novas dificuldades em termos de governabilidade”, comentou o analista político Rosendo Fraga.
Contra todas as previsões, tendo em conta os poucos legisladores que tem em cada câmara do Congresso, Milei conseguiu aprovar o seu primeiro pacote de reformas para liberalizar a economia, que comemorou como “um marco histórico e monumental”.
O presidente conseguiu a aprovação após um tortuoso processo legislativo, que durou um semestre e o obrigou a sacrificar mais da metade dos 600 artigos de seu projeto original.
O governo Milei esteve perto de se tornar o primeiro governo democrático argentino a encerrar o primeiro semestre sem obter a sanção de uma lei. “Isso se explica pela sua incapacidade de gerar uma coalizão política e organizar um partido de governo”, destacou Fraga, que prevê uma tempestade no Senado, onde a oposição peronista (centro-esquerda) é mais forte.
A Câmara Alta deve discutir nas próximas semanas um projeto para alterar a taxa de cálculo dos aumentos previdenciários em favor dos beneficiários, o que atende às metas fiscais de Milei. Os deputados argentinos já aprovaram o projeto.
“Deixem que votem o que quiserem, vou vetar tudo, não me importa”, disse Milei há semanas num discurso a empresários, no qual alertou que está disposto a governar “por puro veto”, contra um Congresso que ele chamou de “ninho de ratos”. .
Os congressistas, porém, concederam posteriormente ao presidente a delegação de poderes extraordinários por um ano, o aumento dos impostos, a flexibilização das leis trabalhistas, um polêmico quadro de incentivos ao investimento por 30 anos e permissão para avançar com a privatização de uma dezena de empresas públicas. .
Sucesso com limites
A Lei Básica “é definitivamente um sucesso para um governo com 10% das cadeiras”, avaliou Juan Negri, diretor do curso de ciências políticas da Universidade Torcuato Di Tella, de Buenos Aires. Uma vez alcançado o objetivo, “entrámos numa fase em que começarão a exigir resultados do governo”.
O pano de fundo é a recessão econômica, com aumento do desemprego e da pobreza, inflação acumulada em 280% em maio e um horizonte com aumentos nos impostos sobre a folha de pagamento introduzidos no pacote fiscal aprovado pelo Congresso.
“Se o governo começar a perder popularidade, a oposição dialogista começará a apresentar muito mais resistência”, avaliou Negri.
Gabriel Vommaro, diretor do mestrado em Sociologia Política da Universidade Nacional de San Martín, estimou que “a grande questão é se, depois desta instância de lhe dar as reformas, poderia começar um momento de tensão política”.
“A partir de agora começa um cenário político totalmente diferente”, disse o analista político Carlos Germano, diretor da consultoria Germano e Associados. “Milei terá de ser muito mais presidente, deixar de promover a personagem que lhe permitiu chegar até aqui”, considerou, prevendo que “esta oposição dialogista, para não se diluir, terá de mudar abruptamente, que é o que tem sido”. fazendo até agora”.
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