Foram muitos anos de espera para que a NFL abrisse os olhos para o Brasil e levasse ao público um jogo que é o segundo maior fora dos Estados Unidos. E todo o caminho percorrido entre a confirmação do jogo paulista e Philadelphia Eagles x Green Bay Packers — vitória dos Eagles por 34 a 29 — deixa um gostinho de conquista para quem é fã desse esporte imprevisível e acostumado a entregar óculos.
As expectativas criadas num jogo nivelado ao topo confirmaram-se e até exacerbaram-se, numa noite de sexta-feira para sempre.
No total, 47.236 pessoas tiveram o privilégio de ver a história sendo escrita de perto, e mudaram a rotina da maior cidade do país, principalmente da Zona Leste, onde muitas pessoas que voltavam para casa na mesma hora não esperavam ” esbarrar” na experiência americana, que pintou as carruagens com termos ingleses e os mais variados tipos de cores de camisas.
— Imaginei que estaria lotado, mas com gente indo para o jogo, não — disse a nutricionista Patrícia, sentada em um trem da Linha Vermelha, que termina em Itaquera. — Eu nem sabia que tinha, nem sei. Gosto de futebol, mas não de futebol americano — acrescentou, rindo, meu amigo Eliege, assistente de restaurante.
O transporte público é sempre a melhor forma de ir aos jogos de futebol, e o mesmo aconteceu no jogo de ontem. Da Sé a Itaquera, a NFL proporcionou encontros inéditos, como o dos amigos André e Emanoel.
— Nós também gostamos muito de futebol e nos conhecemos graças a um grupo de torcedores do Southampton (seleção da Inglaterra). Ele é do Rio de Janeiro e eu de São Paulo — lembra o assessor de imprensa André, que usa cadeira de rodas. — Como também tínhamos isso em comum, futebol americano, basquete, essa data acabou combinando tudo. Graças ao futebol americano, nos conhecemos pessoalmente.
O principal encontro, porém, foi entre o público e o esporte, longe da grande maioria. Após passar pela estação Arthur Alvim, a Neo Química Arena apareceu imponente com as cores dos Eagles e Packers, tornando a caminhada até os portões mais impressionante. O primeiro jogo do campeonato na América do Sul também atraiu muitos estrangeiros, mesmo os mais caricaturados.
— Tenho 56 anos e é minha primeira vez no Brasil, estou adorando — diz Edgard, torcedor dos Packers nascido no México e morando em Chicago há 30 anos, vestido como Darth Vader, vilão de Star Wars: — É foi ideia do meu filho. Ele acha que sou um péssimo pai (risos). A primeira vez que fomos ao Lambeau Field (estádio dos Packers), tinha gente fantasiada e ele disse que eu deveria fazer o mesmo.
O personagem de “cabeça de queijo” e bandeira do Brasil foi um dos muitos torcedores que se tornaram maioria verde no estádio alvinegro, mesmo com as águias da casa vestidas “à la Corinthians”. Do início ao fim, o que mais ecoou no estádio foi o “Go, Pack, Go”.
No final, porém, o que prevaleceu foi o “Voam, Águias, Voam” da equipe vencedora, acompanhada também por muitas pessoas, mais localizadas em pontos específicos das arquibancadas, como o Setor Sul. Além disso, contou com o apoio de suas torcidas levando em conta o gramado de Itaquera, um verdadeiro exemplo dos EUA.
Soa em todos os lugares
O país também marcou presença nas vendas de alimentos, que não eram baratos, mas contavam com food trucks e sanduíches tipicamente americanos, promovendo um encontro ainda maior de nacionalidades na área fora da arena. Outro torcedor fantasiado, Renan, que trabalha com eventos, passou por aqui com cocar e camisa do Kansas City Chiefs, atual bicampeão da NFL.
— Sou um grande fã da liga. A NFL no Brasil é um sonho que, se eu tivesse que apostar, seriam 100 mil chances para uma — destaca o torcedor. — Nada mais que justo ter esse jogo aqui. Se eles virem o que está acontecendo aqui, o próximo será no Maracanã, no Mineirão, eles vão invadir o país.
Quem está acostumado a assistir longas transmissões — o jogo do Brasil terminou às 12h45 de sábado e durou quase três horas e meia — pode ver os diversos rituais que fazem parte da experiência esportiva americana no intervalo, como os canhões que lançar presentes para o público. e romantismo. Na verdade, havia muito romantismo. Com direito a pedido de casamento na beira do campo e câmera de beijo.
Em particular, o jogo era um espetáculo de sons, produzidos ou espontâneos. Diante das diversas faltas apontadas no início do jogo, a conhecida impaciência dos torcedores brasileiros fez com que um árbitro da NFL, possivelmente pela primeira vez na história, fosse “mandado para aquele local”.
No sistema de arena, quem sempre diz que o show do intervalo do Super Bowl deveria ter pagode ou axé viu um desejo se tornar quase realidade. Um curador atento fez alguns intervalos acompanhados de Raça Negra, Chiclete Banana, “Tá Escrito”, música do Grupo Revelação, e “Evidências”, música de Chitãozinho e Xororó, tratada por muitos como o segundo hino do Brasil.
Aliás, teve hino, cantado por Luísa Sonza, e show do intervalo de Anitta. Tudo acompanhado com emoção por uma arquibancada ávida por aquela experiência. Raros devem ser os presentes que já estiveram em um Super Bowl, mas, ontem, todos poderiam dizer que vivenciaram a final do campeonato “ao estilo brasileiro”.
Toda a atmosfera parecia estar realmente afetando o campo. No primeiro quarto, sentindo um empurrão mais forte do seu lado, os Packers forçaram roubos de bola na defesa e poderiam ter aberto vantagem, mas encontraram um resiliente Eagles, que controlou o ritmo no segundo tempo e conquistou a vitória.
A saída da Neo Química deixa uma moeda que demorará a cair e, ao mesmo tempo, a torcida para que a NFL avalie o evento como um sucesso e volte muitas e muitas vezes.
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