O bloqueio de apostas irregulares que o governo começa a fazer é apenas um paliativo contra a atividade ilegal e deverá exigir um acompanhamento permanente da atividade, já que as empresas mudam de domínio a cada minuto.
A avaliação é da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), que considera que este é um primeiro passo, mas que é necessária uma série de ações contra os ilegais, sendo uma das principais o bloqueio de meios de pagamento.
A ANJL anunciou esta terça-feira a criação de um programa piloto para tratar a dependência do jogo — o chamado distúrbio do jogo.
— O governo vai bloquear 600 sites irregulares, mas amanhã terá que procurar novamente. É um trabalho contínuo e de difícil operacionalização. Se há um restaurante ilegal, posso ver. Nos sites de apostas não é possível ver. Então, o único jeito é bloquear a forma de pagamento — disse Plínio Lemos Jorge, presidente da ANJL, lembrando que 97% das apostas no Brasil são feitas via pix e que empresas ilegais precisam de um intermediário para oferecer essa alternativa ao apostador.
Para ele, essa é a forma mais eficaz de combater a ilegalidade, já que se essas empresas não tiverem acesso ao pix dificilmente conseguirão operar no país.
Ele explica que as apostas ilegais têm sede em outros países e quando percebem que vai haver bloqueio, fecham o site e abrem outro no ‘minuto seguinte’.
A ANJL estima que a carga tributária sobre as apostas deverá ser de 48%, considerando a inclusão do chamado imposto seletivo. A associação, porém, alerta que se a carga tributária for muito elevada, perto de 50%, isso acaba inviabilizando o negócio, dando origem a sites ilegais. O facto de aumentar o imposto, antes do início da actividade, pode levar muitas empresas à ilegalidade, afirma a ANJL.
— Ele (ilegal) não se preocupa com arrecadação de atributos, não se preocupa com responsabilidade social. Ele quer pegar o dinheiro e lucrar com isso. Então, a questão tributária é muito importante para nós — afirma o presidente da ANJL.
Segundo estimativa da ANJL, existem pelo menos 1.500 sites ilegais operando diariamente no Brasil. A ANJL explica que quanto maiores as restrições impostas pelos governos, nos países onde os jogos de azar eram regulamentados, maior era o mercado negro.
Isto inclui, além da carga tributária, restrições à publicidade. Portugal é identificado como um país onde existem restrições à publicidade e uma elevada carga fiscal e o mercado ilegal naquele país representa 50% do total.
— Então as ações que vêm do regulador têm que ser tomadas com muita sabedoria, porque quando você pesa muito a mão você não faz os jogadores desaparecerem. Eles são empurrados para o mercado ilegal — diz Lemos Jorge, lembrando que a experiência de outros países demonstra essa migração e que os canais de denúncia através do mercado legal são importantes.
Lançada em março de 2023, a National Gaming and Lottery Association defende o jogo responsável. Entre os associados estão GaleraBet/PlayTech, Big Brazil, F12, PagBet, BetNacional, Mr. Jack, Parimatch, BetFast, Aposta Ganha, Liderança Capitalização, ZRO Bank, Propane, PAAG, Clear Sale, BetBox tv, StarsPay, WEpayments, 1xBet e PG Suave.
Projeto piloto contra a ludopatia
A ANJL anunciou nesta terça-feira a criação de um programa para tratar o vício em jogos — a chamada ludopatia. O programa terá um projeto piloto com duração de dois meses, e tem como objetivo oferecer tratamento presencial a mil pessoas, que serão recrutadas em todo o país, além de teleatendimento a outras 20 mil pessoas nas comunidades.
Para estruturar o programa, a ANJL firmou parceria com a plataforma de saúde mental Só, que oferece apoio psicológico e emocional aos pacientes, além do Instituto Belezinha, que atua em comunidades de São Paulo com psiquiatras e psicólogos.
O investimento da ANJL no programa será de R$ 790 mil. Depois, haverá contribuições dos associados da associação para custear o programa. Também foi criada uma espécie de selo de garantia para os associados da ANJL, para ajudar a identificar as empresas de apostas que estão se legalizando.
A estimativa da ANJL é que em 2025, quando o mercado de apostas já estiver regulamentado, deverá gerar R$ 20 bilhões em apostas por mês e R$ 17 bilhões em prêmios pagos. O imposto arrecadado pelas apostas será de R$ 1,5 bilhão por mês.
QUEM: 2,8% podem ficar viciados
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), entre 1% e 2,8% da população mundial pode apresentar ou desenvolver ludopatia, como é chamado o vício em jogos de azar. A mesma OMS aponta que a chance de dependência de álcool é de 4% a 6%, de compras de 1% a 8% e de drogas ilícitas de 2% a 5%.
— É por isso que a prevenção e a educação são tão importantes em jogo. Outro ponto interessante é usar a tecnologia para ajudar no combate e na prevenção. Ferramentas que utilizam inteligência artificial e machine learning (aprendizado de máquina) já conseguem identificar padrões de jogo compulsivo em tempo real — afirma Ricardo Bianco Rosada, da consultoria empresarial brmkt.co.
Na Inglaterra, país referência na regulamentação de jogos, o serviço público de saúde estima que atenda anualmente até 3 mil pessoas por meio do NHS, o equivalente ao SUS, com esse problema.
Estudo do Instituto Locomotiva mostrou que 52 milhões de brasileiros já fizeram apostas esportivas, e 34% desse total o fizeram por meio de sites ou aplicativos especializados. Do total, 53% são homens e as faixas etárias entre 18 a 29 anos (40%) e 30 a 49 anos (41%) são as que mais apostam.
As pessoas que fazem parte das classes CDE representam 79% dos apostadores. Do total de apostadores, 86% disseram ter dívidas e 64% tinham o nome na lista de inadimplentes. A pesquisa realizada por meio de 2.060 entrevistas e com margem de erro de dois pontos percentuais apontou que 7 em cada 10 brasileiros costumam apostar uma vez por mês, sendo 8% apostando todos os dias e 17% uma vez por semana.
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