Por Letícia Fucuchima
SÃO PAULO (Reuters) – A umidade do solo nas principais bacias hidrográficas de geração de energia elétrica do Brasil atingiu o nível mais seco em quase 20 anos, após uma sequência de vários anos de chuvas abaixo da média histórica que vem afetando a principal fonte de energia elétrica. Matriz elétrica brasileira, segundo monitoramento da Bolsa de Valores de Londres Grupo(LON:).
Esta situação deverá dificultar o reabastecimento dos reservatórios das hidrelétricas no período chuvoso que começa em outubro, uma vez que as chuvas servirão primeiro para repor a umidade do solo nas bacias hidrográficas, antes que a água escoe para os reservatórios e seja convertida em energia. afluente natural (ENA), métrica que indica quanto do volume pode ser transformado em energia.
As bacias hidrelétricas do Paranaíba, Grande e Tocantins, que percorrem áreas do Sudeste, Centro-Oeste e Norte e concentram grande parte da capacidade de armazenamento de energia do país em reservatórios, atingiram o pior nível de umidade do solo da série histórica LSEG em Setembro, com dados desde 2005.
Isto é o resultado das precipitações decepcionantes observadas durante vários anos, observa Claudio Vallejos, analista do LSEG, salientando que 9 dos últimos 10 ciclos hidrológicos nas principais bacias registaram precipitações abaixo da média de longo prazo.
“O solo acaba funcionando como uma espécie de ‘memória’ das chuvas, com a umidade refletindo toda a história ruim… Você tem um déficit que foi carregado, e depois tivemos um período chuvoso muito decepcionante em 2024”, disse ele. disse.
O cenário de baixa umidade do solo também afeta outras bacias, como Tietê (mais seca da história), Paranapanema (BVMF:) (2ª mais seca) e São Francisco (2ª mais seca).
“O Operador (Sistema Elétrico Nacional) só tem controle sobre os reservatórios… ao contrário desse ‘reservatório de umidade do solo’, que é uma variável que depende diretamente das chuvas, não temos controle sobre isso”, destaca o analista do LSEG Bruno Couto .
Eles ressaltam que o sistema passa agora por uma “anomalia”, com o solo das bacias atingindo nível crítico ao mesmo tempo em que o armazenamento de água nos principais reservatórios do Sudeste/Centro-Oeste está em nível confortável.
Os lagos das usinas da região têm hoje 53% de capacidade – bem acima dos níveis de 2021, na última crise hídrica, quando chegaram a 16% em setembro -, após a implementação de políticas de preservação de água das hidrelétricas e em meio a um crescimento acelerado nas fontes eólica e solar, que passaram a atender grande parte da carga energética.
O nível dos reservatórios aponta para uma situação mais confortável para o fornecimento de energia no Brasil, embora o ONS esteja enfrentando dificuldades para operar o sistema nos horários de pico de carga, o que levou ao acionamento de mais termelétricas nos últimos meses.
O ponto de alerta é para o próximo período chuvoso que, caso seja novamente caracterizado por chuvas bem abaixo da média, poderá levar a um rápido esgotamento dos reservatórios devido ao solo muito seco.
“Os próprios reservatórios são o armazenamento de energia, mas o que realmente coleta a chuva para levar ao reservatório é o solo das bacias… e a única forma de recuperar essa umidade seria com a chuva”, destacou Vallejos.
Couto lembrou que a situação afeta também a capacidade de geração das usinas da região Norte, onde a maioria opera a fio d’água (sem reservatório de acumulação), dependendo principalmente das vazões dos rios.
“Principalmente para as usinas a fio d’água esse impacto da umidade do solo é muito mais drástico, visível, do que para as plantas que você tem controle via reservatório, pois para essas o ONS pode reorganizar as operações e isso acaba ‘mascarando’ uma condição que vem se deteriorando rapidamente.”
A seca na região Norte já levou à paralisação parcial da hidrelétrica de Santo Antônio, uma das maiores do país, neste mês devido ao baixíssimo nível do rio Madeira.
Na área meteorológica, a expectativa é que as primeiras chuvas comecem a cair nos reservatórios da região no final deste mês e ainda permaneçam irregulares na primeira quinzena de outubro, só para ganhar força na segunda quinzena do mês que vem, afirma Alexandre Nascimento, sócio-diretor da Nottus Meteorologia.
“A expectativa não é ruim, eu poderia até dizer que é boa, mas antes de melhorar vai piorar muito… Continuamos com temperaturas extremamente altas e umidade relativa muito baixa, isso acaba acelerando ainda mais o processo de esgotamento dos reservatórios “, disse Nascimento.
O cenário Nottus, que não inclui atraso no início do período chuvoso, aponta que as chuvas no Sudeste/Centro-Oeste em novembro e dezembro devem permanecer em níveis normais e ocasionalmente até um pouco acima da média histórica.
IMPACTO NOS PREÇOS DA ENERGIA E NA INFLAÇÃO
A perspectiva atual de energia natural afluente muito baixa (ENA) deverá levar ao aumento do preço de liquidação de diferenças (PLD), indicador de referência do setor elétrico para negociações de mercado de curto prazo e que também é considerado no cálculo das bandeiras tarifárias.
“O cenário base é que os preços fiquem um pouco mais estressados para o último trimestre, com bandeira tarifária vermelha em outubro… mas é difícil cravar neste momento”, disse Sergio Romani, CEO da Genial Energia, lembrando que os preços da energia reagiriam rapidamente em caso de chuvas fortes.
“Temos gordura no reservatório, mas na ENA estamos muito mal, o pior da história… na casa dos 9,2 GW (em setembro), é assustador, nunca vi isso acontecer no sistema elétrico brasileiro. “
Mas os analistas ainda discordam sobre qual será a tendência de ativação das bandeiras tarifárias até o final do ano, com consequente impacto na inflação dos encargos adicionais na conta de luz.
A Genial Energy projeta uma bandeira vermelha ao longo do último trimestre em seu caso base. A corretora Warren Rena avalia ativar bandeira vermelha 1 até outubro e amarela no restante do ano, com projeção de IPCA de 4,53% em 2024. Se bandeira terminar o ano no vermelho, Warren calcula impactos na projeção do IPCA +14 bps para vermelho 1 e +32 bps para vermelho 2.
O Banco Daycoval, por sua vez, projeta bandeira verde para dezembro, com projeção de IPCA de 4,0% para 2024. Se a atual bandeira vermelha 1 for mantida até o final do ano, a inflação deverá fechar o ano em torno de 4,3%, calculou o banco. .
(Por Letícia Fucuchima)
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