Embora o segmento esteja confiante, taxas de juros e Reforma Tributária poderão impactar negativamente
Depois de iniciar o ano com queda no 1º trimestre, quando comparado ao mesmo período de 2023, a contratação de financiamento imobiliário reagiu e voltou a subir nos meses de abril e maio deste ano.
Dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) mostram alta de 53,50% na comparação entre os dois últimos meses publicados.
Segundo o levantamento, nos meses de abril e maio de 2024, 1.512 unidades habitacionais foram financiadas por meio de crédito imobiliário pelo Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), enquanto nos mesmos meses do ano passado foram 985 financiamentos, o que resultou em um aumento de 527 contrata.
Os valores negociados também apresentaram aumento, já que nos meses de abril e maio deste ano foram disponibilizados R$ 408,439 milhões em recursos ante R$ 277,382 milhões em 2023. Ou seja, um aumento de R$ 131,057 milhões, o mesmo que um aumento percentual de 47,25% em um ano.
Na distribuição mensal, o mês de abril deste ano teve 652 imóveis financiados, com um total de R$ 191,018 milhões movimentados. Em maio, o número aumentou para 860 financiamentos, com R$ 217,421 milhões em recursos liberados em Mato Grosso do Sul.
O presidente do Sindicato da Habitação de Mato Grosso do Sul (Secovi-MS), Geraldo Paiva, afirma que a recuperação se deve principalmente à oferta de financiamento para o público de baixa renda.
“Os incentivos financeiros foram criados recentemente pelos governos federal, estadual e municipal.”
Otimista com o crescimento do setor habitacional, Paiva destaca ainda a entrada de recursos do Minha Casa, Minha Vida, que segundo ele servirá para estimular a produção e oferta de imóveis nessas faixas.
Segundo análise do presidente do Conselho Regional dos Corretores de Imóveis de Mato Grosso do Sul (Creci-MS), Eli Rodrigues, os altos desempenhos dos anos anteriores tornam os indicadores mais difíceis de serem batidos.
“Com as mudanças no Minha Casa, Minha Vida e outros incentivos governamentais, agora teremos novos financiamentos. Acreditamos que nos próximos meses os números serão ainda mais satisfatórios para o segmento”, reitera Rodrigues.
O mestre em Economia Lucas Mikael destaca que houve redução nas taxas de juros, com a perspectiva nesse período de que a Selic caísse nos próximos meses.
“Isso pode ter sido um fator significativo no aumento do financiamento. Taxas mais baixas tornam os empréstimos à habitação mais baratos e, portanto, mais atrativos para os compradores”, relata.
O economista Eduardo Matos destaca que o último período analisado mostra uma melhora na situação.
“Muito se deve ao nível de emprego no Estado, ou seja, quanto mais pessoas ocupadas, maior o potencial de aquisição de imóveis”, avalia.
Outro ponto citado como justificativa para o crescimento das contratações em Mato Grosso do Sul entre abril e maio seria o cenário econômico mais ameno, onde não houve o atual nível de discussão.
“A Selic, taxa básica de juros do país, caiu mais uma vez (última ocorrência), momento de oportunidade para contratação de financiamento imobiliário”, diz Matos.
CUIDADO
Levantamento mensal da Abecip mostra que mesmo com a recuperação nos dois últimos meses divulgados, o resultado acumulado dos cinco meses deste ano ainda fica abaixo do mesmo período de 2023. No ano passado, foram negociadas 2.626 unidades, ante 2.481 financiamentos em 2024, resultando em queda de 5,52% em 12 meses.
Ao considerar os valores repassados de janeiro a maio do ano passado, a diferença resultou em leve queda de 2,34%, considerando que no ano passado foram disponibilizados recursos da ordem de R$ 779,628 milhões, contra R$ 761,392 milhões em 2023, ou seja, menos R$ 18,236 milhões liberados para venda de imóveis.
Segundo análise de especialistas, a redução do volume investido em poupança teve influência direta.
“Os brasileiros estão tirando dinheiro da poupança pela baixa atratividade, pois essas pessoas estão interpretando que não vale a pena guardar o dinheiro na poupança”, aponta Renato Gomes.
O economista explica ainda que os valores acumulados na poupança são destinados à aquisição de imóveis por meio do SBPE, modalidade de crédito que depende de recursos da poupança.
“Esse recurso fica escasso e, portanto, há uma queda na quantidade, no volume de financiamento proveniente dessa linha de crédito, que é o financiamento imobiliário através da poupança”, aponta Gomes.
O nível de juros ainda é um obstáculo para o setor, mas destaca que além disso, há a questão do cenário econômico como um todo, como explica o economista Eduardo Matos.
“Estamos em um momento de incerteza no mundo e principalmente no Brasil, com uma política econômica que é no mínimo questionada pelos atores”.
Matos acrescenta que além da questão nacional, o nível de inadimplência é elevado e pode influenciar também o mercado de crédito imobiliário.
“A situação impede a contratação de financiamento, mesmo quem renegociou as dívidas, tem um risco de crédito elevado, encarecendo o crédito, impossibilitando ou dissuadindo o interesse no financiamento”, sublinha.
Mikael destaca que com a mudança de rumo no Comitê de Política Monetária (Copom), em que após sucessivas quedas na taxa de juros, o comitê manteve a Selic em 10,5%, o fim do período de cortes da Selic mudou o cenário que parecia ser encorajador no início do ano.
Numa projeção futura, o mestre em Economia aponta para um cenário económico global incerto onde a economia nacional mostra resiliência na atividade, o aumento das projeções de inflação e as expectativas não ancoradas deverão exigir maior cautela em relação às taxas de juro.
“O que consequentemente afetará negativamente o financiamento imobiliário.”
Tendo em conta o cenário económico, Matos acrescenta que para o setor financeiro o impacto poderá ser negativo, uma vez que o contexto que determina a taxa básica de juro tem uma perspetiva pessimista e os investidores e instituições financeiras estão a adotar uma postura mais conservadora.
REFORMA TRIBUTÁRIA
Outro ponto que deve impactar o setor é a regulamentação da Reforma Tributária. A proposta ganhou uma nova configuração porque, na semana passada, o governo divulgou uma minuta que altera a cobrança do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) a partir do momento da atualização cadastral até a escritura do contrato de compra e venda de imóvel.
O texto também ajusta a alíquota do imposto sobre transações. Hoje é pago o PIS/Cofins, resultando em uma alíquota média de 8%, além do ITBI.
Ainda de acordo com o texto, os imóveis serão incluídos na alíquota do Imposto sobre Valor Agregado (IVA, estimado em 26,5%). Ainda assim, o setor imobiliário terá uma redução de 20% na alíquota, que poderá ficar entre 21% e 22%.
Em entrevista ao Estadão, Paulo Vaz, sócio tributário do VBSO Advogados, explica que ambas as medidas são prejudiciais ao mercado imobiliário. Segundo ele, a alíquota final do imposto na compra de um imóvel pode chegar a 25%, somando o IVA de 22% com o ITBI de 3%.
“Isso tende a desacelerar todo o mercado, pois um quarto do valor do imóvel será usado para pagar impostos. A medida é prejudicial e pode dificultar a aquisição da casa própria para muitas pessoas”, afirma.
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