Na cúpula de chefes de estado do Mercosul, nesta segunda-feira em Assunção, no Paraguai, o presidente da Bolívia, Luis Arce, entregou a ata de ratificação da adesão plena de seu país ao Mercosul.
Às vésperas da visita oficial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao seu país, Arce comemorou com os demais chefes de estado do bloco — com exceção do argentino Javier Milei, que não participou do encontro — a incorporação da Bolívia como país quinto parceiro.
A Bolívia tem muito a oferecer ao Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai em termos de comércio, economia, logística, acesso a minerais como o lítio e qualidade de vida para cidadãos de países vizinhos que vivem em território boliviano.
Segundo trabalho realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado na semana passada e coordenado pelo economista Pedro Silva Barros, a relação bilateral tem grande potencial para trazer benefícios aos dois países.
No caso do Brasil, os estados que mais poderiam ganhar com a entrada da Bolívia no Mercosul são Mato Grosso, Rondônia e Acre. Isso explica, em grande medida, porque setores de Bolsonaro apoiaram esmagadoramente o protocolo de incorporação do país vizinho no Congresso.
O chamado Quadrante Rondon, formado pelos referidos estados, terá, por meio da Bolívia e de seus acordos com o Chile e o Peru, acesso ao Oceano Pacífico. Os portos de Arica, no Chile, e Ilo e Matari, no Peru, são utilizados pela Bolívia e poderão, a partir de agora, entrar na rota de exportação brasileira.
— Os portos devem estar adaptados aos tipos de carga brasileira. Também será preciso melhorar as estradas, muitos trechos da Bolívia precisam ser pavimentados — explica Silva Barros.
O economista destacou que a entrada da Bolívia será positiva para “cidades mais próximas do Pacífico do que do Atlântico, como Porto Velho, capital de Rondônia”.
— Fora do Sul e Sudeste, outras regiões do Brasil não se sentem tanto parte do Mercosul. A incorporação da Bolívia também é a entrada do bloco de Mato Grosso, Rondônia e Acre, oeste do Brasil — afirma o economista.
Esta nova dinâmica, acrescenta Silva Barros, permitirá aprofundar relacionamentos e gerar integração produtiva em setores como fertilizantes e complexo agroindustrial. A Bolívia possui grandes reservas de insumos que o Brasil necessita para produzir fertilizantes, entre outros, potássio, fosfato e uréia. Hoje, estes insumos são importados de países distantes como Bielorrússia, Egito, Marrocos e Rússia.
“De 2001 a 2020, o gás natural foi o principal produto da pauta de exportações da Bolívia para o Brasil. Com o início das vendas do gás natural boliviano ao mercado brasileiro, as relações comerciais começaram a ganhar outra dimensão em termos de escala, consolidando o Brasil como principal destino das vendas no país vizinho, fato que perdurou até 2020 e 2023. Foi Somente nos anos mais recentes de 2021 e 2022 é que a posição do Brasil como principal importador de mercadorias bolivianas foi superada”, aponta o trabalho do Ipea, lembrando que hoje o principal produto exportado pela Bolívia para o Brasil é o ouro.
Em termos de gás, a parceria com a Bolívia no Mercosul poderá facilitar o transporte do gás natural argentino das jazidas de Vaca Muerta, “pois a infra-estrutura de gasodutos existente entre as duas nações, que permitiu as exportações bolivianas de gás natural para a Argentina, será fundamental para permitir o fluxo oposto de recursos entre países, ou seja, da Argentina para a Bolívia, e desta para o Brasil. O aumento do fluxo de gás pela Bolívia, preferencialmente via contratos de longo prazo, significa ficar menos dependente das importações de gás natural liquefeito (GNL) realizadas no exterior e, consequentemente, menos exposto à volatilidade dos preços”, diz a pesquisa do Ipea.
As reservas bolivianas de lítio também são atrativas para o Brasil. No primeiro semestre deste ano, a Bolívia foi o país com os maiores recursos de lítio descobertos em seu território, atingindo 23 milhões de toneladas. A Argentina ficou em segundo lugar com 22 milhões, os Estados Unidos em terceiro com 14 milhões, o Chile em quarto com 11 milhões, a Austrália em quinto com 8,7 milhões e a China em sexto com 6,8 milhões, segundo dados do governo brasileiro.
A adesão da Bolívia também é importante, destaca Daniel Falcon Lins, chefe da divisão Bolívia, Equador, Paraguai e Peru da Secretaria da América do Sul do Itamaraty, “devido a outros aspectos relevantes do Mercosul em termos de direitos sociais e compromisso com a democracia”.
— No caso dos estudantes brasileiros na Bolívia, por exemplo, teremos mais garantias e facilidades para a vida no país vizinho. De modo geral, a vida nas cidades fronteiriças vai melhorar, teremos menos burocracia e mais agilidade em vários aspectos — acrescenta o diplomata, que destaca também a oportunidade de aumentar o comércio bilateral e a importância desse aumento para o mercado de trabalho brasileiro.
— Exportamos produtos de valor agregado para o mercado boliviano, o que representa empregos de qualidade em nosso mercado — afirma o diplomata.
Um dos projetos da agenda bilateral, já aprovado no novo PAC, é a construção de uma ponte entre as cidades de Guajará-Mirim, em Rondônia, e Guayaramerín, na Bolívia. Hoje, diz Falcon, muitas famílias e até crianças em idade escolar atravessam o rio diariamente de barco.
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