Sônia Pavão não precisa se deslocar até a cidade ou ligar para uma farmácia quando precisa de remédios. Basta dar alguns passos e chegar à floresta ao redor da casa dela para coletar os remédios de que ela precisa. “Esta é a minha farmácia”, explica ela, ao mostrar as espécies vegetais do cerrado e seus usos medicinais tradicionais.
São anos de conhecimento acumulado, aprendido com os professores do seu povo, os Guaranis (nhandevas e kaiowás) de Mato Grosso do Sul. Sua casa e seu “pátio medicinal” estão localizados na reserva indígena Tapyi Kora, oficialmente conhecida como Limão Verde, onde a Farmácia é utilizada para curar as mais diversas enfermidades, do corpo e do espírito.
Ela não teve uma infância fácil, ficando órfã aos 4 anos após o assassinato de seus pais. Mas a fatalidade não impediu a obstinação de Sônia em aprender e concluir as diversas etapas do ensino formal e se formar em ciências naturais, pela Faculdade Intercultural Indígena (Faind) da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD).
E foi na própria Faind/UFGD que Sônia decidiu aliar seus conhecimentos tradicionais à pesquisa acadêmica. O resultado foi um mestrado em que ela falou sobre o saberes tradicionais Guarani e Kaiowá, como fontes de autonomia, sustentabilidade e resistência.
“Essa experiência, essa prática, que estava isolada nas nossas comunidades, agora está saindo, está dentro da universidade”, diz Sônia, à sombra de uma das dezenas de árvores plantadas em seu jardim.
Um passeio campus O curso principal da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) é suficiente para perceber que esta não é uma instituição de ensino superior qualquer. O primeiro sinal de que algo está diferente é uma imensa construção feita inteiramente de troncos de madeira e palha.
Banners e cartazes escritos em uma linguagem incompreensível para a maioria dos brasileiros são outro sinal. Talvez, se você prestar atenção nas conversas entre os alunos, perceberá que essa mesma linguagem está sendo utilizada no diálogo.
Você terá certeza de que a UFGD é uma instituição única ao ler a sigla Faind, na entrada de um dos blocos. Trata-se da Faculdade Intercultural Indígena, unidade voltada especialmente para o ensino e a pesquisa de assuntos relacionados aos povos indígenas brasileiros.
Lá o corpo discente é formado principalmente por etnias indígenas mato-grossenses, que somam mais de 116 mil pessoas, pouco mais de 4% da população total do estado. A língua incompreensível para a maioria dos brasileiros é o guarani, falado pelas etnias Kaiowá e Nhandeva, que, junto com os Terenas, são o povo que tradicionalmente habita a região de Dourados. A imensa construção de palha é uma Oga Pysyuma tradicional Casa de Oração Guarani.
Um dos cursos da Faind se chama teko arandu, em língua guarani, que pode ser traduzido como “viver com sabedoria”, que é uma graduação intercultural voltada para a formação de professores indígenas.
A licenciatura teko arandu, que este ano completa 18 anos, foi a génese da criação da Faind, que oferece também uma licenciatura em “educação rural” e um programa de pós-graduação em “educação e territorialidades”. Neste semestre já está em andamento o processo seletivo para um novo curso de graduação: “pedagogia intercultural indígena”.
Mas os indígenas não estão restritos aos cursos da Faind. Eles se espalham por cursos e programas de pós-graduação de outras unidades da UFGD e já somam 800 alunos, ou seja, cerca de 15% dos quase 6 mil matriculados na universidade federal. A própria Sônia cursa doutorado no programa de pós-graduação em geografia.
Troca de conhecimento
Para o reitor da UFGD, Jones Goettert, a presença de estudantes e pesquisadores indígenas é enriquecedora para a universidade e faz a própria academia refletir sobre a relação entre ciência e outros saberes.
“O conhecimento Guarani, Kaiowá e Terena é um conhecimento próximo, mas também distante do nosso. Precisamos fazer com que esse conhecimento desmantele o nosso. E essa desmontagem ocorre quando aprendemos conceitos, temas e palavras para fazer com que a nossa ciência participe desses outros conceitos”, afirma Goettert.
A Faind, por exemplo, já busca adequar seu calendário acadêmico e instalações à realidade de seus alunos. Os cursos da unidade são oferecidos na modalidade de “pedagogia da alternância”, em que parte do tempo os alunos, muitos deles de vilas distantes da universidade, frequentam aulas no campus da UFGD e de outros lugares, são os professores que se deslocam aos territórios dos estudantes.
Durante os períodos em que estão em campusestudantes que moram longe podem se hospedar em alojamentos universitários e até levar a família para ficar com eles, algo importante para as mães Guarani, que precisam estar acompanhadas dos filhos.
Enquanto as mães assistem às aulas, as crianças passam o tempo em uma brinquedoteca, sob a supervisão de uma funcionária também indígena. Além disso, os grupos étnicos têm o direito de convidar “oradores” (comumente conhecidos como xamãs) para administrar rituais religiosos no Oga Pysy instalado dentro do território. campus.
“A universidade se torna para nós uma segunda casa de oração. Hoje temos muitos detentores do conhecimento Guarani Kaiowá dentro da universidade e professores [da universidade] ter acesso ao nosso conhecimento”, destaca Sônia.
Viagem
Este ano, três doutorandos indígenas da UFGD foram selecionados para um intercâmbio de seis meses na França. Estudantes indígenas de 11 universidades brasileiras concorreram a bolsas do programa Guatá, da Embaixada da França no Brasil, e a UFGD teve três dos oito selecionados.
A Universidade de Dourados foi a instituição com maior número de alunos aprovados no programa, seguida pela Universidade de São Paulo (USP) e pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ambas com dois alunos, e pela Universidade de Brasília (UnB). ), com um .
“Isso permite que esses estudantes indígenas tenham experiências fora do Brasil que dificilmente teriam de outra forma. Além disso, estar no exterior dá visibilidade ao estudante indígena e ele também leva consigo a historicidade coletiva daquele povo. Então é uma oportunidade para aumentar a visibilidade [do povo] e, com isso, legitimar a existência de línguas, de práticas culturais e, claro, também a sua reivindicação territorial”, explica o professor Matheus de Carvalho Hernandez, coordenador do Gabinete de Assuntos Internacionais da UFGD.
*A equipe do Agência Brasil viajou a convite da Embaixada da França no Brasil.
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