O Festival de Cinema de Veneza entrou em sintonia com a França dos anos 1990 neste sábado (31), com a adaptação cinematográfica do romance de sucesso “Leia as crianças depois do eux“, um retrato melancólico da adolescência e da reprodução social.
O filme narra a entrada na idade adulta de um grupo de jovens e as difíceis relações com os pais, durante grande parte da década de 1990, quando os problemas de integração dos imigrantes, a desindustrialização e o desemprego já corroiam a harmonia social do país.
O filme é fiel a um romance de Nicolas Mathieu que ganhou o Prémio Goncourt em 2018 e que descreve principalmente a história de amor impossível entre o filho de um trabalhador e a filha de um homem notável.
A obra tornou-se um dos sucessos editoriais dos últimos anos por retratar uma França periféricamuitas vezes esquecida, e os seus jovens, que sonham com outro lugar, mas estão condenados a repetir o caminho dos pais.
Uma história melancólica, com heróis da classe trabalhadora em que os realizadores se reconheceram, dois irmãos gémeos de 32 anos, que cresceram no campo, numa família humilde do sudoeste de França.
O personagem principal, Anthony, é interpretado por Paul Kircher, de 22 anos, uma nova promessa do cinema francês. Sua mãe é interpretada por Ludivine Sagnier e a figura paterna, dissolvida no álcool, no desemprego e na violência, é Gilles Lellouche.
O filme, de 2h26, foi originalmente concebido como uma série e mantém uma construção, assim como o livro, em capítulos. Quem tinha 15 anos na década de 1990 vai se identificar com uma trilha sonora que traz Nirvana, Red Hot Chili Peppers ou Francis Cabrel.
É contra esse pano de fundo sonoro que se constrói a trajetória desses jovens, desde Steph, o amor inacessível de Anthony, interpretada por Angelina Woreth, até Hacine, o ‘irmão inimigo’ da cidade vizinha, criado sozinho pelo pai imigrante do Marrocos, e interpretado por Sayyid El Alami.
O filme, com uma estética por vezes americana, não esconde as fracturas francesas, mas também celebra os seus momentos de comunhão, como o verão de 1998, quando a França venceu o Copa do mundo.
“Estamos numa cidade onde os altos-fornos fecharam e a classe trabalhadora se desintegrou. São de certa forma os alicerces da França de hoje, com a ascensão da extrema direita e os franceses divididos entre as origens francesas, se isso faz algum sentido, e Franceses de origem imigrante”, analisa Ludovic Boukherma para a AFP.
“O filme também é uma história sobre classe, como quando crescemos percebemos a classe social a que pertencemos… Não é a nossa geração, mas é um pouco do ambiente social em que crescemos”, declara Zoran Boukherma, que alcançou a fama em Veneza com este quarto longa-metragem co-dirigido entre irmãos.
A dupla hoje se descreve alegremente como “transfugados de classe”, expressão que virou moda por autores como Nicolas Mathieu, que neste sábado se declarou “encantado” com o resultado.
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