Está no final da carreira Elvisem Las Vegasna década de 1970, que o diretor Miguel Falabela coloca o coração da peça “Elvis: uma revolução musical”adaptação brasileira do musical internacional que foi exibido nos Estados Unidos e na Austrália.
A primeira cena da produção, que estreia nesta quinta-feira, dia 1º, no Teatro Santander, em São Paulo, é ao som da irresistível faixa “Trouble”, lançada em 1958, ainda nos primeiros anos da carreira de Presley. Lá, porém, quem canta a música já é um Elvis experiente, cujo comportamento errático foi uma pedra no sapato de sua vida profissional — e, anos depois, de sua própria sobrevivência.
No palco, ele aparece com seu icônico macacão branco, cravejado de pedras coloridas, peça indissociável de seus últimos anos de apresentações. Os momentos iniciais mostram o cantor nos bastidores, tendo a porta batida para se apresentar imediatamente.
— Eu, Miguel, tenho essa coisa de camarim, quando estou me preparando para me apresentar, lembro de todos os camarins que morei até agora. É aquela coisa, ”a única pessoa que sabe de mim é o espelho do meu camarim”. Quando estou diante de um espelho como esse, vêm à mente Marília Pêra (1943-2015), Beatriz Segall (1926-2018) e todos com quem trabalhei — Falabella teoriza sobre a cena de abertura, que dá o tom do psicológico drama que permeia toda a assembléia.
— Na peça original, a história termina com ele no grande show de 1968, eu queria trazer Vegas (para o palco). Eu queria mostrar um pesadelo em Las Vegas. Queria mostrar esse ídolo em uma gaiola de ouro, que nem fez turnê mundial.
A encruzilhada mental de Elvis foi traduzida em cena. Falabella olhou para a pintura ”Relatividade”, do artista holandês MC Escher (1898-1972), onde é possível ver uma série de escadas que se entrelaçam, mas não levam a um destino, num arranjo labiríntico. As escadas circundam todo o palco e permitem a passagem dos cerca de 30 atores que compõem a produção.
— É uma viagem do Elvis, em que ele revisita o passado — diz o diretor.
A produção milionária (o orçamento para montar o musical que vai até dezembro foi de R$ 9,5 milhões) continua, a partir da cena do camarim, num ritmo biográfico de enumeração dos altos e baixos do Rei do Rock. Há, no entanto, um certo interesse em contextualizar tal majestade.
Na produção, fica claro que Elvis foi muito influenciado pela música negra de Tupelo, no Mississippi, bairro onde o cantor nasceu e cresceu — e onde o rock já era feito e apreciado. Em determinada cena, o dono de uma loja de discos é ameaçado por apresentar “música negra” a um jovem branco.
O musical, como era de se esperar, não deixa de lado alguns elogios ao ícone falecido em 1977. Para isso, utiliza sucessos globais do astro. Existem ”Hound dog”, ”Jailhouse Rock”, ”Suspicious Minds”, ”Little Less Conversation” e ”Heartbreak hotel”, entre outros.
Visite Graceland para pedir um axé
A tarefa de interpretar Elvis e apresentar as músicas ao vivo ao lado da banda de 9 músicos cabe ao ator Leandro Lima (ex-Pantanal e Terra e Paixão, ambas novelas do horário nobre da TV Globo). Este é seu primeiro musical. Aos 42 anos (mesma idade com que Elvis morreu), Leandro tem uma extensa carreira internacional de modelo, mas insistiu em atuar durante anos, chegando a faltar ao trabalho nas passarelas para assistir aos ensaios. A montagem de Elvis coroa o momento em que o paraibano de João Pessoa acumula papéis na TV e no streaming. Nos palcos paulistas, o papel de Elvis será alternado com o do ator Daniel Haidar.
— Tenho brasilidade nas veias, talvez haja algo assim no meu Elvis. Claro que limpamos meus gestos, mas uma coisa ou outra vai escapar, acho que vai ser interessante — diz Leandro.
A atuação de Lima, que passou por testes para o papel, surpreendeu o próprio diretor, que ainda não conhecia seu trabalho. Esta não é, no entanto, a primeira vez que ele toca música. O ator tem história com o axé e chegou a fazer turnê com a banda Ala Ursa, da qual fez parte. Recentemente, visitou Graceland, antiga mansão e santuário de Elvis nos EUA, e teve contato com fãs e objetos pessoais do astro.
— Quando você chega em Graceland, a legião de fãs lá é impressionante. Fui ao túmulo pedir licença (para interpretar o personagem), pedir axé. Foi forte para mim. Também senti essa emoção no Sun Studios onde ele gravou “That’s all right”, aquele lugar me tocou.
Luiz Fernando Guimarães interpreta o Coronel Parker
A produção, que já vendeu 25 mil ingressos antecipados segundo contagem de produção, também marca a primeira vez que Luiz Fernando Guimarães aparece em uma produção dirigida pelo amigo de longa data Miguel Falabella.
— Miguel não se dirige a mim, somos amigos há muito tempo. Então seria estranho. Ele me dá alguns toques, diz que alguma coisa que fiz está boa e aí eu improviso. Isso muda dependendo do público e do meu humor — diz o ator que interpretará o Coronel Tom Parker, figura decisiva na queda do Elvis original.
Na cinebiografia dirigida por Baz Luhrmann, de 2022, o empresário e, em certa medida, carrasco de Elvis é interpretado por Tom Hanks, figura que Guimarães admira e deve referenciar.
— Eu não canto, mas dou alguns passos. Acho fofo e brega (o coronel tentando entrar em sintonia), e meu personagem fala muitos palavrões e é rude. Tem alguns que eu nem falo, só faço mímica, o que cria empatia com o público. Acontece o tempo todo — Luiz Fernando Guimarães se diverte
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