Em todo o país, 4,5 milhões de crianças de 0 a 3 anos estão em grupos considerados mais vulneráveis e deveriam ter seu direito à creche priorizado. Essas crianças representam 45,9% do total de 9,9 milhões de crianças brasileiras nessa faixa etária.
Vivem em famílias em situação de pobreza, monoparentais, onde o cuidador principal trabalha ou poderia até trabalhar se houvesse vaga em creche, ou em famílias com filhos com deficiência.
Os dados são do chamado Índice de Necessidades de Creches do Estado e da Capital (INC), ferramenta criada pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, em parceria com a Quantis, para apoiar o planejamento de políticas de acesso a creches. O estudo completo está disponível na internet. Devido à falta de informação oficial atualizada disponível, o estudo ainda não mostra quantas destas crianças já estão matriculadas.
A investigação fornece uma visão geral, em todo o país, das condições sociais e económicas das famílias e das crianças. O INC é calculado em cada estado e em cada capital.
“Nossa ideia é estimar essa população que poderia se beneficiar do acesso à creche, chamando a atenção para o fato de que essa necessidade é diferente para cada um dos territórios”, explica a gerente de Políticas Públicas da FMCSV, Karina Fasson.
O INC, por estado, mostra, por exemplo, que o Piauí é o estado com maior necessidade de creches, com 53,1% das crianças em uma das situações consideradas no estudo como prioritárias para garantia de vaga. Rondônia é o estado com menor percentual de crianças nessas situações, 32,6%.
Entre as capitais, Salvador tem o maior percentual, 61,7%, e Porto Velho, o menor, 32,2%.
“Criamos esse indicador para informar os territórios. Mostre que o tamanho da população em situação de pobreza é este, o tamanho da população familiar monoparental é este, e assim por diante. Com base nisso, é possível que os territórios possam planejar a expansão das creches, podendo também planejar a utilização de critérios de priorização caso não haja vagas para todas as crianças e famílias num primeiro momento”, afirma o especialista.
Creches no Brasil
No Brasil, a creche não é uma etapa obrigatória. A educação é obrigatória para crianças e adolescentes de 4 a 17 anos. Antes disso, as famílias podem optar pela matrícula dos filhos, mas é dever do Governo oferecer as vagas que houver procura.
Isso ficou ainda mais claro em 2022, após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de ampliar a obrigatoriedade do ensino também para creches. Até então, os municípios poderiam negar matrículas alegando falta de vagas.
Além disso, o país precisa cumprir o Plano Nacional de Educação (PNE), lei que estabelece metas a serem cumpridas desde a educação infantil até a pós-graduação, até o final de 2025. Pela lei, o país deve ter 50% matriculados em creches. centros. de crianças até 3 anos. Atualmente, é de 37,3%.
Segundo Karina Fasson, a creche é um direito das crianças e das famílias.
“É importante lembrar que o surgimento da creche no Brasil está justamente ligado aos movimentos de mulheres, no sentido de também poder acessar o mercado de trabalho, de poder conciliar as diferentes atividades pelas quais as mulheres são responsáveis. à creche pode beneficiar muito a inserção e manutenção das mães no mercado de trabalho”, destaca.
Necessidade de creches
O estudo detalha a situação das crianças que necessitam de creche. O indicador mostra que 13,2% das crianças brasileiras de até 3 anos estão em situação de pobreza. São de famílias com renda mensal por pessoa inferior a R$ 218.
Outros 5,4% são provenientes de famílias monoparentais, criadas, por exemplo, apenas pela mãe. Segundo o estudo, 1,6% apresentam dificuldade em exercitar pelo menos um dos domínios funcionais.
O maior percentual são filhos de famílias com mães ou cuidadores que trabalham ou que trabalhariam se tivessem acesso à creche: 25,7%.
Segundo a coordenadora adjunta de Políticas Públicas para Meninas e Mulheres Negras Cis e Trans da organização não governamental Criola, Juliana Martins, a falta de creche e de outros direitos básicos impacta principalmente as mulheres negras. Ela defende que o direito à creche garante à mulher o direito de trabalhar, aumentar sua renda e poder estudar.
“Sempre faço uma analogia de que o direito à creche parece uma cebola, porque a cada camada que você puxa você verifica o quanto, se há acesso de forma integral, com desenvolvimento infantil garantido, com desenvolvimento e capacitação dos próprios profissionais , valorização dos professores. Você pode ter uma série de outros direitos garantidos para uma mulher negra na sociedade hoje. Custa muito caro que esse direito seja garantido ou que essa política pública seja implementada como deve ser, como prioridade absoluta para o município, para o estado, para a Federação”, argumenta.
Segundo ela, ao garantir uma educação infantil de qualidade, a sociedade pode também, aos poucos, reduzir as muitas desigualdades sociais e económicas “que são muito brutais e muito profundas”.
A educação infantil é uma das etapas educacionais cuja administração cabe aos municípios. É também uma etapa que ganha relevância nas eleições autárquicas, que se realizam no dia 6 de outubro.
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