Modelo de negociação sem precedentes deve abrir precedentes para que mais agricultores sejam compensados por deixarem terras reivindicadas por povos indígenas
No dia 25 de setembro, indígenas e agricultores chegaram a um acordo histórico durante audiência de conciliação no Supremo Tribunal Federal (STF), que permitiu a continuidade do processo de homologação da Terra Indígena TI Ñande Ru Marangatu, que possui 9.317 hectares, por meio de indenização de R$ 146 milhões para proprietários rurais residentes na região se retirarem das terras.
O acordo só aconteceu depois que os conflitos, que já duram mais de quatro décadas na região, se intensificaram novamente e resultaram na morte do indígena Neri Guarani Kaiowá, executado por um Policial Militar com um tiro nas costas da cabeça.
Durante coletiva de imprensa para discutir o tema, realizada na manhã desta sexta-feira (27), o governador do estado, Eduardo Riedel, reforçou o interesse do executivo estadual em fazer acordos em outros territórios reivindicados por povos indígenas em Mato Grosso do Sul. Ele mencionou que o acordo histórico é uma “quebra de paradigma”, e não será generalizado, mas abre o modelo de discussão, que pode ser utilizado em cenários semelhantes.
“É claro que este acordo é uma mudança de paradigma, não abre um precedente geral, porque está muito bem colocado no âmbito da conciliação específica deste caso [de Marangatu]. Agora, ele abre esse modelo de discussão. O Congresso Nacional está discutindo uma legislação que defina os critérios e as regras do que é uma questão constitucional”, disse Riedel.
A expectativa é que a mesa de conciliação do STF elabore uma proposta de legislação que o Congresso Nacional aceite, para pacificar o conflito fundiário no Brasil.
Segundo o governador, existem atualmente mais de 30 territórios em disputa no estado, sendo seis deles prioritários para assinatura de acordos, por serem locais onde os confrontos são mais intensos. O cenário foi apresentado em reunião com o ministro do STF, Gilmar Mendes, realizada na última quinta-feira (26).
Riedel explicou ainda que o grau de litigância reúne uma série de parâmetros para priorizar negociações como esta. As seis áreas mencionadas acima enquadram-se no nível 1 de litígio, considerado prioritário para resolução.
“É um modelo novo, criado a partir de negociação, que certamente terá consequências em outros casos, em outras discussões, e aqui não há uma regra estabelecida. É importante dizer que o que foi feito está no âmbito de uma processo judicial específico do processo, e que pode ser adotado para outros processos que prossigam enquanto a legislação não for pacificada (…) esperamos que a mesa de conciliação, que foi trazida pelo STF, faça uma discussão final e final, e que o Congresso Nacional possa efetivamente dar a condição final para esse tipo de litígio”, concluiu Riedel.
O governador não especificou quais seriam as seis áreas de litígio de nível 1.
Lembrar
Em acordo histórico entre indígenas e agricultores, ocorrido em audiência de conciliação no Supremo Tribunal Federal (STF), o governo federal e o governo do Estado se comprometeram a pagar R$ 146 milhões de indenização aos proprietários rurais de Antônio João, continuando assim a conclusão da homologação da Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, com 9.317 hectares.
Uma semana após o assassinato do indígena Neri Guarani Kaiowá, de 23 anos, ocorrido no dia 18, o acordo firmado com a presença do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), indígenas Guarani Kaiowá lideranças, governo do Estado, representado pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE), Ana Carolina Ali Garcia, e proprietários rurais, o que põe fim aos conflitos pela propriedade da terra em Antônio João.
Do total de R$ 146 milhões que serão pagos como indenização, R$ 102,2 milhões serão destinados pela União aos proprietários rurais por terra descoberta, por meio de precatórios, e R$ 16 milhões serão pagos pelo governo do Estado em contrapartida.
O outro valor restante, conforme ata do encerramento da audiência de conciliação, será pago pela União imediatamente aos agricultores, pelas benfeitorias realizadas nas terras, no valor de R$ 27,8 milhões.
Após o pagamento das benfeitorias, que deverá ocorrer até o final deste ano, os proprietários rurais terão 15 dias para retirar os 9.317 hectares, que pertencerão oficialmente ao povo Guarani Kaiowá.
Quanto ao pagamento da terra descoberta, que será feito por meio de precatórios, a previsão é que os títulos dos precatórios comecem a ser pagos no início de 2025.
Descobrir
O conflito fundiário em Antônio João já dura décadas, nesse período já foram mortos quatro indígenas no município devido à disputa por terras. O primeiro foi Marçal de Souza, em 1983, o segundo foi Dorvalino Rocha, em 2005. Dez anos depois, em 2015, Simião Vilhalva foi assassinado. O último foi Neri Guarani Kaiowá, no dia 18.
Colaborou: Judson Marinho
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