Corumbaense atua no combate a incêndios no Pantanal e é única mulher em grupo de 45 bombeiros
Atiçado pelo vento, o fogo atacou por todos os lados a Serra da Bodoquena, em Corumbá, Mato Grosso do Sul. No meio, a brigadista Débora Ávila repassou toda a sua vida.
As chamas que queimaram o Pantanal a fizeram redescobrir o medo. Mas não foi só esse sentimento que ela deu continuidade à sua mais difícil missão profissional, em junho do ano passado.
Este ano, Débora permanece na região do Pantanal para enfrentar os incêndios da pior seca das últimas quatro décadas. Cada vez que vai trabalhar, é movida pela coragem e pelos ideais. Ela escolheu a profissão depois que seu filho de 5 meses morreu devido a complicações pulmonares.
O menino nasceu com síndrome de Edward, uma doença genética que pode causar problemas no funcionamento de diversos órgãos. Ela ouviu dos médicos que a fumaça das fogueiras encurtou a vida do bebê.
“A queima do Pantanal impediu que ele ficasse mais tempo comigo. Hoje trabalho para outras pessoas”, disse o brigadista de 42 anos à Agência Brasil após mais uma missão. Após a morte do filho, em 2020, Débora foi diagnosticada com depressão. Três anos depois, em meio ao luto, ela decidiu descobrir como é o trabalho de um brigadista. “Adoro ser membro da brigada. É um trabalho em que me encontrei e estou feliz.”
Para chegar à profissão que ama, se inscreveu em seleção do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama). Selecionada, ela passou nos testes físicos. Ela mostrou que sabia carregar o cano d’água nas costas e também o soprador para apagar o fogo.
Ele ainda aprendeu a operar uma motosserra, essencial para avançar nos terrenos ameaçados pelas chamas. Hoje, Débora se tornou a única mulher de um grupo de 45 brigadistas.
“Vamos, minha vida”
O profissional de 1,60 metro de altura fez do combate a incêndios uma missão de vida. Quando ela veste a gandola e coloca o capacete, ela sabe que horas são. Pode ser durante o dia ou de manhã cedo… ela dá um beijo no marido e avisa que vai trabalhar.
“No início, ele achou estranho.” Mas aí ele começou a ouvir do companheiro, que trabalha como pedreiro: ‘vai em frente, minha vida’”
Para Débora, enfrentar as adversidades não é exatamente novidade. A corumbá trabalha desde a adolescência. Ela já vendeu salgadinhos na rua com a avó. Ela trabalhava como faxineira, empregada doméstica em “casas alheias” e era varredora de rua da prefeitura.
No calor vindo do chão, ele tentava se equilibrar, na maioria das vezes, com um salário mínimo. Ela também era operária da construção civil, como o pai (que morreu de câncer), e “tinha” que cuidar da casa, como a mãe, mas sem mau tempo. Ela aprendeu a colocar azulejos e paralelepípedos nas ruas.
Só mais tarde, em meio à fumaça da vida, ele decidiu combater o incêndio. No caminho para o trabalho, ela muitas vezes se emociona com o fornecimento de oxigênio às residências. “Sempre imagino que possam existir crianças ou idosos com problemas respiratórios por causa destes incêndios. Eu sei que há outras pessoas passando pelo que eu passei.”
Desde que descobriu o novo emprego, ele também se interessou em voltar aos estudos. Ela havia parado na sétima série. E ela gostaria de saber e falar mais sobre meio ambiente.
“Tive que parar de estudar para trabalhar. Agora quero terminar o ensino fundamental. Quem sabe um dia eu faça faculdade de gastronomia.” Ao relembrar a comida, ela relembra os tempos em que vendia chipa (uma espécie de pão de queijo da região) com a avó para ajudar no sustento da família. Hoje é fã dos peixes do rio Paraguai e gosta de criar receitas.
Contrato
Hoje Débora tem contrato temporário de seis meses conforme aviso do Ibama. Por mês, ela recebe R$ 1.980, além do auxílio.
O gerente ambiental do Ibama, Thainan Bornato, que coordena o Prevfogo-MS, afirma que o trabalho dos brigadistas é fundamental num momento como este. A falta de chuvas alterou as enchentes e a seca no Pantanal.
“Há alguns anos também antecipamos esse momento de seca no Pantanal. Depois de novembro não choveu mais e o Pantanal não inundou. Registramos também o pior junho da história em relação aos incêndios florestais”, lamenta.
Sem os bombeiros, explica ela, não haveria como apagar os incêndios. “Contratamos brigadistas no período crítico, de junho a dezembro, e temos observado que há necessidade de ampliar esse período de contratação. Já não podemos dizer que o período crítico é apenas [de] Junho a dezembro.”
Segundo Thainan, portanto, houve necessidade de aumentar o contingente em Mato Grosso do Sul. Desde o ano passado, foram contratadas 145 brigadas de junho a dezembro, sendo cinco brigadas indígenas e uma brigada de pronto emprego, que tem sede em Corumbá, especializada no Pantanal.
“Débora é a única mulher brigada, mas temos visto um aumento no interesse das mulheres em participar.” Para isso, é necessário se preparar para o teste de aptidão física e para o teste de uso de ferramenta agrícola.
“Numa brigada é muito importante ter diferentes tipos de competências. É a diversidade que faz da brigada o que ela é.” A chegada de Débora deixou o dirigente muito emocionado. “A história dela motiva outras pessoas. Ela não é apenas alguém que carrega um instrumento de combate ao fogo, mas uma profissional que inspira.
“Costumo conversar com os brigadistas que estão aqui para fazer educação ambiental, para fazer prevenção, para conhecer o território. É um agente multiplicador de mudança, de conscientização.”
Orgulho
Esse trabalho grupal e colaborativo passou a fazer parte da vida de Débora, em que um colega depende do outro o tempo todo. Nessa época de seca não dá para ir muito longe. Gosta de jogar futebol com os novos amigos, o que a faz lembrar que já sonhou em ser atleta aos 16 anos. O trabalho a impediu.
Em dias como estes, o futebol tem que ser mais rápido. De repente, o helicóptero parece ir para uma área isolada e envolta em fogo. Você precisa pegar o helicóptero para chegar a lugares isolados e áreas de mata virgem. Ela não tem mais o medo de antes. “Tenho orgulho de ser mulher e de estar nesta luta por mim e por muitas pessoas.”
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