Especialistas apontam aumento dos custos de produção com persistência da falta de chuvas
A arroba do boi, que já foi cotada com tendência de queda nos últimos meses no Mato Grosso do Sul, poderá sofrer novas interferências negativas. O avanço da estação seca, que chegou no início deste ano, já está afetando as condições das pastagens e pode obrigar os produtores rurais a venderem seu gado para evitar ter que incorrer em altos custos com a manutenção do gado, ou mesmo na perda de animais.
Especialistas do setor indicam aumento de custos devido às condições climáticas. “Estamos em um período de poucas chuvas e muita seca no Estado, situação que é sazonal e faz com que os criadores optem pela venda dos animais aos frigoríficos, buscando evitar perda de peso e custos adicionais com nutrição animal”, destaca o economista no Sindicato Rural de Campo Grande, Rochedo e Corguinho (SRCG), Staney Barbosa Melo.
Melo destaca ainda que no período há maior oferta de animais disponíveis para abate e, consequentemente, preços mais baixos nos frigoríficos. “Dessa forma, para evitar custos mais elevados, o produtor acaba cedendo a preços abaixo do que espera receber no mercado, é uma forma de mitigar custos e riscos”, acrescenta.
Doutor em Ciências e pesquisador da Embrapa Pantanal, Carlos Padovani explica que até outubro os produtores rurais enfrentarão desafios considerando que este é o período em que deverá voltar a chover no MS. “O risco é que possamos ver novamente o que aconteceu em 2020, quando o preço da arroba teve uma queda alarmante e vários pecuaristas acabaram descartando seu gado de uma vez.”
Padovani reforça que esta é uma alternativa para o produtor evitar perdas, porém, ressalta que esse movimento afeta diretamente a perspectiva de preços, pois a oferta de animais para venda faz com que o preço diminua.
RESTRIÇÕES
Para o presidente do Sindicato Rural de Corumbá, Gilson Araújo, a seca traz severas restrições alimentares para a pecuária. “Em algumas situações é possível fazer suplementação com baixo consumo, mas isso exige investimento”, afirma.
Araújo reitera que se a seca persistir muitos terão que se desfazer de parte do rebanho ou encaminhá-lo para leilão, alguma alternativa para reduzir a carga de pasto.
O economista do Sindicato Rural de Campo Grande destaca que para quem tem melhores condições existe a opção do confinamento, que exige mais investimento de capital por arroba produzida, mas esta ainda é uma prática muito incipiente em Mato Grosso do Sul. “Aqui ainda prevalece a pecuária extensiva”, relata Melo.
PREÇO
O boi gordo estava cotado ontem ao valor médio de R$ 209,93 por arroba, refletindo uma queda de 14,49% no acumulado de 12 meses no mercado físico de Mato Grosso do Sul, segundo citação da Granos Corretora.
Na mesma data do ano passado, o preço da arroba estava cotado a R$ 245,50 – prejuízo de R$ 35,57.
A arroba da vaca apresentou desvalorização ainda maior, chegando a 29,90% e sendo cotada a R$ 192,08. A queda no preço ocorreu quando se considera o valor comercial na mesma data do ano passado, quando o preço da vaca era de R$ 274.
A semana que começou com a arroba sendo cotada a R$ 207,10 na praça de Mato Grosso do Sul apresentou pequena tendência de alta na terça (2), com R$ 207,10 e mantendo estabilidade na quarta (R$ 209,93).
SECA
Com reflexos na pecuária de Mato Grosso do Sul, a falta de chuvas já interfere na escassez de pastagens em boas condições para a pecuária. Segundo o agrometeorologista e pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, Danilton Flumignan, o El Niño já se dissipou em meados de maio e passa por um momento de neutralidade dos fenômenos.
No entanto, é provável que as actividades pecuárias vejam os desafios intensificarem-se devido às condições meteorológicas que se apresentarão nos próximos meses. Conforme já divulgado pelo Correio do Estado em junho, segundo previsões dos agrometeorologistas da Embrapa, há grande probabilidade de ocorrência de La Niña no Estado.
“Durante a transição entre eles [El Niño e La Niña]há uma fase de neutralidade, com 83% de probabilidade, caracterizada por temperaturas oceânicas dentro dos limites normais”.
Para os próximos meses, agosto e setembro, o pesquisador indica que a probabilidade de ocorrência do La Niña é superior a 49%.
“Isso ainda pode impactar as pastagens devido às adversidades climáticas, como chuvas abaixo da média histórica, granizo, geadas e baixas temperaturas”, explica.
O pesquisador e agrometeorologista da Embrapa Agropecuária Oeste, Éder Comunello acrescenta que, nos últimos anos, o clima tem desafiado muito os produtores rurais brasileiros.
“Entre junho de 2023 e abril de 2024, tivemos o fenômeno El Niño. Embora esse fenômeno esteja geralmente associado ao aumento das chuvas no Sul e no MS, desta vez foi marcado por bloqueios atmosféricos e ondas de calor, causando diversos episódios de escassez hídrica e impactando fortemente a atividade agrícola no Estado”.
Ainda segundo Comunello, embora Mato Grosso do Sul esteja atualmente em condições de neutralidade, as enchentes sofridas no sul do Brasil em maio podem ser consideradas um efeito residual do El Niño.
Para Comunello, o cenário de neutralidade não deve durar, pois diversas projeções apontam para o estabelecimento do La Niña a partir de julho.
“Isso implica que há uma grande chance de que nossos produtos sejam cultivados nessas condições. Durante o La Niña, espera-se uma maior ocorrência de secas na região sul.”
No Mato Grosso do Sul, o pesquisador alerta que haverá uma versão atenuada do que acontece no Sul do Brasil, o que ainda é desafiador, principalmente num cenário em que há altas temperaturas recordes por vários meses consecutivos.
“Os impactos do La Niña na agricultura podem ser graves”, diz ele.
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