Elouise Miranda, terceira colocada no Concurso Maria Callas (SP), se prepara para mais uma importante competição internacional; conheça um pouco da vida e da arte deste importante cantor lírico de Campo Grande, de apenas 25 anos
“Acho melhor não anunciar ainda”, responde Elouise Miranda ao ser questionada sobre o próximo concurso de canto do qual pretende participar. Destaque da música erudita sul-mato-grossense desde o ano passado, a cantora lírica nascida em Campo Grande pegou chamou a atenção de quem entende do assunto por volta dos 17 anos, passando a ocupar posição de destaque no cenário nacional há quase três meses.
Foi na noite de 21 de março, no Teatro Sérgio Cardoso, na capital paulista, que conquistou o terceiro lugar na 22ª edição do Concurso Brasileiro de Canto Maria Callas, talvez o mais importante do país dedicado ao canto operístico.
As sopranos Flavia Stricker (PR) e Isabella Luchi (ES) ficaram em primeiro e segundo lugar respectivamente na competição, organizada pela Cia Ópera São Paulo, sob a direção de Paulo Abrão Esper.
Uma das árias preferidas da notável artista de 25 anos, “Caro Nome” – da ópera “Rigoletto” (1851), de Giuseppe Verdi (1813-1901) – serviu de passaporte para o reconhecimento do seu talento em o circuito paulista de música de concerto, o que ajuda (e muito) a posicionar com distinção o nome de quem busca um lugar no panteão do gênero.
Além da peça cantada por Gilda no primeiro ato da ópera de Verdi, Elouise cantou, na final da competição, “Je Veux Vivre” (1867), da versão de “Romeu e Julieta” de Charles Gounod (1818-1893). .
Enquanto se prepara para mais uma prova, Elouise continua com a vida que escolheu para si desde os sete anos de idade, quando ficou “viciada” no CD do pai com composições de Mozart (1756-1791). Naquela época, bem antes de ingressar na Fundação Barbosa Rodrigues (FBR), onde começou como estudante de violino, a menina se divertia muito imitando cantores de ópera.
“Os sopranos são sempre lembrados principalmente pela capacidade de atingir notas agudas, mas, mesmo dentro dessa classificação, existem subclassificações, cada uma com características próprias. Sou uma soprano lírica coloratura, minha voz é considerada encorpada, arredondada e com certo lirismo, ao mesmo tempo que consigo executar passagens que exigem agilidade com clareza”, descreve Elouise.
“Quando eu tinha 13 anos, minha mãe descobriu que a FBR tinha vaga e imediatamente me inscreveu. Porque eu sabia que queria muito tocar um instrumento, mas na época não tinha dinheiro para isso. Então esse projeto social foi um começo muito importante. Comecei a ter aulas de violino com o maestro Eduardo Martinelli e adorei tocar, passei anos estudando muito, mas o canto lírico nunca parou de sair da minha cabeça”, conta a cantora.
“Em uma das apresentações da Orquestra Jovem da FBR, a filha do maestro [Martinelli]meu amigo [e cantora lírica] Bianca Danzi cantava, e até então eu não tinha ouvido ninguém cantar liricamente pessoalmente, apenas através de gravações. Isso me deixou louca para estudar. Minha mãe me incentivou a conversar com o maestro e ele me disse para preparar algumas músicas com a Bianca. Então eu fiz isso, me dediquei e até fizemos apresentações, mas na época eu ainda não estava tendo aulas”, destaca Elouise.
Sua rotina atualmente está dividida entre a agenda como regente de coral e professora de canto e violino – na Escola de Música Tom Maior e na Sociedade Assistencial Meimei – e as horas que dedica a estudar e ensaiar com a própria voz.
“Tenho aulas de canto duas vezes por semana, nos dois dias que tenho manhã livre, e estudo sozinho nos outros dias, nos horários livres entre um aluno e outro”, conta a artista, que cresceu em um ambiente musical, ao som da voz e do violão de seu pai e sua mãe.
SÉRIO
“Depois de muito tempo, aos 17 anos, Bianca me contou que estava tendo aulas com a professora Cristina Passos [mestre em Música pela Universidade Federal de Goiás e bacharel em Canto pela Universidade Federal do Rio de Janeiro] e me recomendou. Fiquei muito animado. Depois que comecei, só tive a confirmação de que era isso que eu queria estudar seriamente. Minha voz foi se desenvolvendo e durante esses anos fiz shows em Campo Grande e participei de recitais”, continua.
“Sou formada em Música pela UFMS [Universidade Federal de Mato Grosso do Sul]Ganhei experiência e ocupei todos os espaços possíveis que pudessem favorecer a minha formação”, afirma a jovem cantora.
“Agora, aos 25 anos, sei que o processo de amadurecimento técnico, artístico e psicológico está sempre se desenvolvendo. Mas sinto-me mais preparada para avançar para outros espaços que me desafiem e me estimulem para o próximo nível”, afirma a soprano.
MESTRES
Quem viu pela primeira vez o rouxinol na garganta continua a celebrar a sua voz.
“Eu não sabia [do seu potencial para o canto], ela era uma ótima aluna de violino. Comecei a incluir algumas árias de ópera no repertório da Orquestra Jovem da FBR para ela e Bianca cantarem”, conta Martinelli.
“Fizemos uma adaptação da dupla de ‘Magic Flute’, [do dueto] de Papageno e Papagena, e eles cantaram e fizeram um grande sucesso. Eles começaram a se dar bem e vi que o negócio era sério. Pedi um favor à professora Cristina Passos: ‘Que você conheça, escute e oriente essas meninas aqui’”, continua.
“Portanto, Elouise começou, sob a orientação de Cristina, a se desenvolver cada vez mais, cada vez mais, a participar de tudo, a fazer solos com uma orquestra profissional. Ela participou conosco de [Festival] Encontro com a Música Clássica e culminou com a premiação na Maria Callas”, diz Martinelli.
“Além de sempre atuar e cantar. Participou da última edição, por exemplo, do Festival Encontro com a Música Clássica, cantando com o barítono Santiago Villalba [RJ]”, ele afirma.
“Então, todo o crédito para ela e para a professora Cris por essa melhora incrível. Estamos muito felizes por ela estar sempre conosco enquanto mora aqui. Elouise é extremamente jovem para ter a maturidade que tem na voz. É um mérito incrível dela e da Cris”, afirma a instrumentista e educadora.
“Uma jovem cantora campograndense que inicia sua carreira com um futuro promissor” – é assim que Cristina Passos define sua aluna.
“Elouise é uma pessoa muito estudiosa. Ela consegue preparar um repertório rapidamente e assimila muito bem todo o aprendizado. Isso é um ponto positivo, porque ela aplica o que aprende e desenvolve com sua musicalidade e inteligência musical a partir dessa dedicação, dessa seriedade com que leva seu trabalho”, define.
“Conheci Elouise quando ela tinha entre 17 e 18 anos, apresentada pelo maestro Martinelli. Ela fez a sua primeira apresentação cantando árias antigas, e foi aí que percebi que ela reunia um conjunto de qualidades, de requisitos para estar preparada como cantora de ópera. Ela mostrou muita musicalidade, senso estilístico, e foi aí que conversei com ela para propor um estudo sério, com o objetivo de formá-la”, conta a professora.
“Dei uma bolsa para ela e logo depois vim para Goiás, onde moro desde 2020, durante a pandemia [de Covid-19]. Começamos a ter aulas online. Nesse período, Elouise se formou na UFMS e participou de um concurso online, e Maria Callas foi a primeira [concurso] presencial que ele integrou. Nossa intenção com a sua participação foi aprimorar seus estudos e acelerar a ampliação do seu repertório”, destaca Cristina.
REENCONTRO
Dois amigos da professora que trabalham no Rio de Janeiro – e orientaram Elouise online – também tiveram papel fundamental na preparação da jovem cantora para o concurso paulista: Victor Emanuel Abdala, historiador especializado em ópera e integrante da equipe que prepara o produções no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, e Daniel Salgado da Luz, filósofo, musicólogo e encenador do mesmo teatro.
“[Eles] Eles me ajudaram muito principalmente no desenvolvimento de uma conexão entre corpo, voz e personagem, um trabalho de lapidar a performance e pesar as nuances”, reconhece Elouise,
que meses depois ainda comemora o reencontro cara a cara com a mestra Cristina Passos.“Para esse concurso conversamos sobre a possibilidade de nos encontrarmos em São Paulo, para que ela pudesse me acompanhar, e foi o que fizemos. Ela me acompanhou e me apoiou em todas as etapas, foi um momento muito especial”, agradece a cantora.
VÍDEOS
Após conferir uma performance de Elouise gravada em vídeo, a comissão de seleção de Maria Callas decidiu incluir a artista sul-mato-grossense entre os semifinalistas da competição.
“Viajei para São Paulo no dia 16 de março, meu aniversário, e fiz a prova da etapa semifinal no dia 19/03. Cantei duas árias que eles já haviam pedido para serem preparadas, ‘O zittre nicht, mein lieber Sohn’ [de “A Flauta Mágica”, 1791] e ‘Quel Guardo il Cavaliere’ [da ópera-bufa “Don Pasquale”, de Gaetano Donizetti, que estreou em 1843]”, diz a soprano.
Nas redes sociais, os elogios aos seus vídeos são uma constante: “Bravíssima!”, “orgulho”, “perfeita”, “canta muito!”, “muitos parabéns!”, perfeita demais”, “canta tanto e tão bem que dá vontade de chorar”, “gigante”, “sem palavras”, “bravo!”, “maravilhoso”, “divino”.
Confira de perto no Instagram @_elouisemiranda ou pesquise Elouise Américo Miranda no YouTube.
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