Nem o anúncio de última hora da aparição quase relâmpago do astro Will Smith no Palco Sunset conseguiu desviar a atenção do público da grande atração desta quinta-feira (19) do Rock in Rio: o inglês Ed Sheeran, de 33 anos. Old, que fecha a noite no Palco Mundo, a partir das 0h15. O festival recomeça hoje e decorre até domingo, numa edição que comemora o seu 40º aniversário.
Mesmo que ele não esteja mais no topo do mundo (como em 2017, quando “Shape of you” se tornou a primeira música a atingir dois bilhões de streams no Spotify), Sheeran continua sendo o maior artista pop a emergir da era do streaming – e o aquele que melhor compreendeu as implicações das redes sociais na construção da carreira de um ídolo musical global.
Olhando de perto, a cantora e compositora ruiva com mil tatuagens fofas desafia os padrões que se esperaria de uma estrela pop. Veste-se com simplicidade, tem rosto comum e vive longe de escândalos. Sua sedução se dá por meio de músicas (com melodias redondas e cativantes, apropriando-se de diferentes estilos e tendo o cuidado de eliminar tudo o que possa ser ofensivo) e shows (nos quais está sempre sozinho no palco com seu violão e alguns pedais loop). Grosso modo, Ed Sheeran seria a experiência do som do bar da Tijuca transposto para as arenas.
Orgulhoso de sua trajetória rumo ao sucesso (há dez anos, com a balada “Thinking out loud” e a dançante “Sing”, produzida por Pharrell Williams, ele se tornou o artista mais ouvido no Spotify), antes de chegar lá o inglês se dedicou diligentemente ao circuito de pequenos palcos e à formação de fã-clubes nas redes sociais – estes, aliás, o defenderiam virulentamente cada vez que os críticos musicais acusavam sua música de ser anódina ou derivada.
Renascimento comercial
Artista que antecede o inglês em seu palco, o norte-americano Charlie Puth, de 32 anos, não está longe do modelo Sheeran. Criado no YouTube, onde muitas das estrelas da era do streaming começaram a publicar vídeos de covers de músicas famosas, Puth apareceu em 2015 com a música “Marvin Gaye” e com participação em “See you Again”, faixa do rapper Wiz Khalifa que, incluída na trilha sonora do filme “Velozes e Furiosos 7”, tornou-se uma espécie de réquiem para Paul Walker, ator que morreu em um acidente de carro durante uma pausa nas filmagens.
Aos poucos, porém, o cantor foi se sentindo cada vez menos satisfeito com a qualidade de sua música — em 2019, chegou a jogar um álbum inteiro no lixo, após ouvir comentários sinceros de ninguém menos que Sir Elton John. Refugiou-se nos bastidores da indústria, tocando e compondo para outros cantores, até que teve a ideia de compartilhar o processo de composição e gravação de seu novo álbum com seus seguidores no TikTok.
A viralização de um teaser contendo trechos das faixas mostrou que ele estava no caminho certo: lançado em 7 de outubro de 2022, “Charlie” foi seu renascimento comercial, com “Left and right” (adicionado por um feat de Jung Kook, do BTS) alcançando um bilhão de streams no Spotify.
Regular do Brasil, a cantora inglesa Joss Stone (que comemora 21 anos de seu bem-sucedido álbum de estreia, “The Soul Sessions”, lançado quando tinha apenas 16 anos no Rock in Rio) se junta a uma artista que em 2022 se apresentou no Sunset e depois consolidou-se como um dos maiores fenômenos de popularidade da nova música brasileira: Jão, cantor que lotou arenas ao longo deste ano, por todo o Brasil, com a turnê “Super” (2023), seu quarto álbum.
Com seus sucessos mais antigos (“Idiota”, “Essa eu faz pro nos amor”), os sucessos de “Super” (“Escorpião”, “Alinhamento milenar”) e as músicas de “Supernova” (a versão estendida de “Super” , lançado em junho), Jão promete um show de grande apelo entre a garotada, capaz de rivalizar até mesmo com a chegada de Will Smith ao Sunset, anunciada há duas semanas, para um breve show de 20 minutos que marcará a retomada de sua carreira musical.
Vencedor de um Oscar e quatro Grammys, Smith voltou este ano com duas músicas, que farão parte de seu novo álbum: “Work of art” (ao lado do filho, Jaden) e “You can make it”. Seu último álbum, antes de ser engolido por Hollywood, foi “Lost and Found”, de 2005. Uma das primeiras estrelas do rap, ainda adolescente, quando era o MC Fresh Prince, ao lado do DJ Jazzy Jeff, foi descoberto pela TV, onde protagonizou a série “Um Maluco no Pedaço”, que o tornou famoso no início da década de 1990.
O estrelato cinematográfico de Will Smith, que começou com “The Bad Boys” (1995) e “MIB: Men in Black” (1997), levou-o a uma carreira solo de sucesso, com sucessos como “Gettin’ jiggy wit it”, “ Homens de preto” e “Miami”. Em sua apresentação desta quinta-feira (que será a primeira no Brasil como artista musical), ele traz os sucessos e as novidades, numa espécie de teaser de como será sua turnê em 2025.
Na letra de “Obra de arte”, Will Smith alude ao incidente na cerimônia do Oscar 2022, quando deu um tapa no comediante Chris Rock, ofendido com a piada que havia feito sobre sua esposa: “Eu sou um santo, mas se você tocar isso, eu sou um selvagem.” O episódio acabou prejudicando sua carreira cinematográfica nos últimos anos.
‘O pagode sempre fez parte da minha vida’
Se o folk-pop e o R&B dão o tom no Palco Mundo (com o rap-pop de Will Smith invadindo o Sunset), outro convidado, bem brasileiro, marca presença na festa do Rock in Rio desta quinta-feira: o samba. Headliner do Sunset, Gloria Groove (drag persona do cantor paulista Daniel Garcia, 29 anos) comemora em seu show no festival o sucesso de seu novo projeto, “Serenata da GG”, álbum ao vivo com músicas suas no melhor estilo romântico estilo pagode.
Lançado no final de maio, com participações de sambista como Alcione e Ferrugem (outra atração desta Fazenda Sunset, em show com o grupo de MPB Gilsons, formado pelos filhos e netos de Gilberto Gil), o disco já acumula mais de 170 milhões de fluxos. É um dos mais recentes — e surpreendentes — sucessos do samba, estilo que ainda estará representado nesta quinta-feira no Rock in Rio, no Palco Favela, com shows de Xande de Pilares, do pioneiro do pagode Fundo de Quintal e de Vinny Santa Fé (do sucessos “Pauperrecido” e “Castelo de um dormitório”).
Depois do sucesso avassalador com rap, funk e R&B no álbum “Lady Leste” (de 2022, com os sucessos “A Queda”, “Bonekinha”, “Leilão” e “Vermelho”), Gloria Groove emocionou-se, como ela mesma diz, “de uma forma muito natural”, para “Serenata da GG”.
— O pagode sempre fez parte da minha vida. Costumo brincar que esse estilo musical já estava presente antes mesmo de eu nascer, quando eu estava na barriga da minha mãe (a cantora Gina Garcia, que foi backing vocal do grupo Raça Negra e hoje participa do disco do filho). A ideia de retribuir esse amor surgiu de uma forma muito orgânica, e, quando comecei a trabalhar no Volume 1, o objetivo principal era homenagear essa história e essas raízes — conta. — Não imaginava que o projeto seria tão bem recebido, mas sempre acreditei no poder da música e no impacto que a verdadeira conexão com o público pode ter. Agora vem o Volume 2, dia 26, com nomes como Thiaguinho, Mumuzinho, Ana Carolina e Sampa Crew.
Em seu show no Sunset, Glória (que no sábado volta ao Rock in Rio no show “Pra sempre pop”, ao lado de Jão, Luísa Sonza, Duda Beat, Lulu Santos e Ivete Sangalo) diz que “o pagode será um dos três momentos principais”:
— O primeiro bloco trará muitos dos meus sucessos ao longo da minha carreira no hip-hop, reggaeton e rap, seguido do bloco Serenata com todo o romantismo, e o bloco três é uma grande festa com o melhor do pop. Então, é um show que abrange todas as minhas épocas.
Para Glória, “é uma honra imensa” estar no Rock in Rio no mesmo dia que Ferrugem, Xande de Pilares, Fundo de Quintal e Vinny Santa Fé.
— Nesse dia, o Rock in Rio quase vira Samba in Rio, porque a energia do samba e do pagode é contagiante, e a vibe que esse gênero traz é única. Ver grandes nomes que tanto admiro no mesmo evento só reforça o quão diversa e poderosa é a música brasileira. Acho incrível que o festival esteja abraçando isso, mostrando que o Rock in Rio vai muito além do rock — afirma. — Para mim, estar lá, dividir esse espaço com artistas que têm tanta relevância para o samba e o pagode, e poder trazer a “Serenata da GG” para esse ambiente, só torna tudo ainda mais especial.
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