Perdas de visão, amputações e ferimentos: vítimas relatam desespero durante explosões de pagers

O explosão quase simultânea de pagersum dispositivo eletrônico utilizado para receber alertas e mensagens curtas, no Líbano nesta terça-feira (causou um cenário de pânico em diversos pontos do país.

Pelo menos nove pessoas morreram, incluindo uma criança, e 4.000 ficaram feridos, sobrecarregando o sistema de saúde, que mobilizou uma campanha de doação de sangue.

Entre os feridos, 400 estão hospitalizados em estado grave, informou o Ministério da Saúde libanês, e pelo menos 500 perderam a visão, segundo o canal saudita al-Hadath.

O Hezbollah e membros do próprio governo do Líbano acusaram Israel do ataque — o país ainda não se pronunciou, mas fontes do governo israelense confirmam que a ordem veio do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.

O grupo xiita confirmou que o seu líder, Hassan Nasrallah, não ficou ferido. O embaixador do Irã no país, Mojtaba Amani, sofreu ferimentos leves. O Observatório Sírio para os Direitos Humanos também relatou explosões na Síria, onde o Hezbollah opera abertamente, com 14 feridos.

Desde o início da guerra em Gaza, em 7 de outubro, o uso de pagers se expandiu entre os membros do Hezbollah, a pedido do líder Nasrallah, por serem considerados uma forma de comunicação mais segura e mais difícil de rastrear do que os telefones celulares comuns.

Porém, além dos combatentes do grupo, o aparelho — visto como obsoleto — é muito utilizado por profissionais de saúde e serviços de emergência.

A rápida explosão quase simultânea dos dispositivos – que alguns analistas acreditam ter sido causada por uma infiltração na linha de montagem ou por um malware que causou o superaquecimento das baterias – tornou difícil para os portadores de pagers se livrarem deles.

Segundo o ministro da Saúde libanês, Firass Abiad, a maior parte dos ferimentos afetou o abdômen, as mãos e o rosto das vítimas, seja porque elas usavam pagers no momento ou os mantinham próximos ao corpo. Um vídeo do momento da tragédia mostra um homem em uma motocicleta, aparentemente carregando um pager na cintura, no momento em que o aparelho explode.

— As explosões do pager soaram como tiros. Um jovem caiu na minha rua, pensamos que alguém tinha atirado nele, não sabemos se houve mortes, mas centenas de pessoas foram afetadas. Ainda há feridos que não foram resgatados — disse um morador de Haret Hreik, um subúrbio ao sul de Beirute, ao jornal L’Orient Le Jour.

Ahmad Ayoud, um açougueiro em Beirute, contou o momento em que ouviu explosões. Depois, ele contou ao New York Times que viu um homem de 20 anos cair de uma motocicleta, sangrando.

“Todos pensávamos que ele havia sido ferido em um tiroteio aleatório”, disse Ayoud. — Então, alguns minutos depois, começamos a ouvir falar de outros casos. Todo mundo carregava pagers.

No subúrbio de Beirute, onde há uma forte presença do Hezbollah e onde ocorreram muitas explosões, os moradores relataram ter visto fumaça saindo dos bolsos das pessoas, seguida de explosões que pareciam fogos de artifício. Mohammed Awada, 52 anos, dirigia ao lado de uma das vítimas.

“Meu filho enlouqueceu e começou a gritar quando viu a mão de um homem voando para longe dele”, disse Awada ao Times.

A onda de explosões deixou muitas pessoas em Beirute num estado de confusão e choque.

— É um caos total — disse Um Saleh, uma dona de casa que mora nos subúrbios ao sul da cidade. — Não consigo encontrar uma explicação para o que aconteceu esta tarde.

A tragédia despertou medo entre muitos libaneses que atenderam ligações, informou o Times. É o caso de Khadijeh Fouani, que preparava as compras quando entrou em pânico ao ouvir o telemóvel tocar, respondendo a gritos: “Por favor, desligue, desligue!”

Segundo o médico Abdulrahman al Bizri, que visitou hospitais que recebem feridos em Sidon, disse que faltam cirurgiões oftalmológicos para fazer face ao número de pessoas com lesões oculares.

— As lesões oculares não serão fáceis e exigirão um tratamento longo — afirmou.

Em entrevista à imprensa local, um membro da equipa de um hospital que acolhe vítimas também destacou os elevados níveis de amputação:

“Muitos dos feridos perderam os dedos, em alguns casos todos eles”, disse ele. — É muito delicado e algumas cenas são horríveis.