A Organização Mundial da Saúde (OMS) informou na quinta-feira que pelo menos um quarto das pessoas feridas na guerra em Gaza sofreram “lesões que mudaram suas vidas”, muitas das quais requerem amputações e têm “enormes” necessidades de reabilitação.
Pelo menos 22.500 palestinos que foram feridos no enclave nos 11 meses desde o início do conflito precisam de serviços de reabilitação “agora e nos próximos anos”, embora essas necessidades ocorram em paralelo com a destruição contínua do sistema de saúde, disse Rik Peeperkorn. Representante da OMS para os territórios palestinos.
Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, pelo menos 41.100 pessoas morreram na ofensiva retaliatória de Israel após o ataque do grupo terrorista ao território israelita em 7 de outubro, quando 1.200 pessoas foram assassinadas.
Em Gaza, segundo a agência de saúde palestina, mais de 95 mil pessoas ficaram feridas na guerra, sendo a maioria das vítimas crianças e mulheres. Estima-se que entre 13.400 e 17.500 pessoas sofreram “lesões graves nas extremidades”, o principal motivo da necessidade de reabilitação. O relatório afirma que ocorreram entre 3.100 e 4.000 amputações.
Outras lesões que alteram a vida incluem danos na medula espinhal, traumatismo cranioencefálico e queimaduras graves. Ao mesmo tempo, a OMS informou que apenas 17 dos 36 hospitais de Gaza estão operacionais, mesmo parcialmente, enquanto os serviços de cuidados primários são frequentemente suspensos ou inacessíveis devido à insegurança, ataques e repetidas ordens de evacuação. O único centro de reconstrução e reabilitação de membros do enclave, localizado no Complexo Médico Nasser e apoiado pela OMS, parou de funcionar em Dezembro passado devido à falta de suprimentos e especialistas.
Os cirurgiões dizem que a falta de materiais e a escala dos ferimentos os obrigam a amputar membros que de outra forma poderiam ser salvos. Mas é uma situação desesperadora, dizem eles, porque as amputações requerem cuidados contínuos e, muitas vezes, mais cirurgias. A esterilização completa é difícil e faltam curativos e bolsas de sangue. Os pacientes são deixados em camas sujas – uma realidade que Ana Jeelani, uma cirurgiã ortopédica do Reino Unido que passou duas semanas num hospital no centro de Gaza em Março, disse ser “perfeita para infecções”.
Isto leva a “um inferno cheio de cenas de pesadelo”, acrescentou Seema Jilani, que serviu como conselheira sénior de saúde de emergência do Comité Internacional de Resgate, um grupo de ajuda humanitária. Ela trabalhou em diversas zonas de conflito, mas disse que não conseguia tirar da cabeça as imagens das duas semanas em Gaza. O chefe da agência da ONU para os refugiados palestinos (UNRWA), Philippe Lazzarini, disse em junho que, em média, dez crianças perdem uma ou ambas as pernas todos os dias no enclave.
— São dez por dia, ou seja, cerca de 2 mil crianças depois de mais de 260 dias dessa guerra brutal — enfatizou Lazzarini na época. — Sabemos também que a maioria das amputações são realizadas em condições horríveis e, às vezes, sem anestesia. Isto também se aplica às crianças.
O chefe da UNRWA também citou um relatório, publicado naquele mês pela Save the Children, que estima que 21 mil crianças estão desaparecidas devido ao conflito no enclave – seja porque estão enterradas sob os escombros ou em sepulturas não identificadas, porque estão presas ou porque eles perderam contato com familiares e entes queridos. Embora os números sejam difíceis de recolher e verificar, na altura havia pelo menos 17 mil crianças desacompanhadas e 4 mil provavelmente estavam desaparecidas sob os escombros, segundo a organização.
Unidades sob ataque
Um dia antes de a guerra entre Israel e o Hamas completar dez meses, em 7 de agosto, o Exército israelense anunciou o fechamento temporário da rota humanitária de Rafah, no sul de Gaza. Não foi a primeira vez que a rota — e outras que permitem a distribuição de ajuda no enclave — foi fechada por operações militares no terreno. A repetição desta situação, somada à escassez de insumos, ao fechamento de unidades de saúde após os bombardeios e às mortes e prisões de profissionais de saúde, impôs um verdadeiro cerco médico a Gaza, alertaram organizações da Globo.
“Os desafios no recebimento de equipamentos, instrumentos, suprimentos, pessoal e infraestrutura crítica, como eletricidade e água, combinados com as hostilidades em curso, significam que muitas instalações de saúde foram forçadas a fechar ou parar de funcionar”, afirmou o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV). ) em nota enviada ao GLOBO. “Muitos profissionais de saúde foram deslocados para áreas que receberam ordem de evacuação. Se não conseguirem aceder ao seu local de trabalho, essa instalação médica não poderá prestar serviços.”
Citando dados do Ministério da Saúde de Gaza, território controlado pelo grupo terrorista Hamas desde 2007, dois relatórios divulgados em julho pelo Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos constataram que 500 funcionários ligados aos serviços médicos em Gaza foram mortos desde então. 7 de outubro, tendo outros 310 sido presos e levados para investigação. Segundo os documentos, há relatos de tortura e morte de detidos, algo negado por Israel, que afirma que apenas os suspeitos são detidos e, se a sua inocência for confirmada, então libertados.
O governo israelita justifica as operações militares em instalações de saúde como uma necessidade para chegar aos combatentes ligados ao Hamas ou às organizações armadas que operam no enclave, um dos principais objectivos do Estado Judeu na guerra. Em resposta a uma pergunta do GLOBO, a Embaixada de Israel no Brasil disse que há um “uso sistemático” de instalações médicas em Gaza por terroristas. (Com AFP e New York Times; colaborou com Renato Vasconcelos)
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