Durante os Jogos Paralímpicos de Paris, a pequena cidade de Saint-Ouen, com 52 mil habitantes e conhecida como “Bbrookyln parisiense”, será um pedacinho do Brasil na França. Um complexo gastronômico local, localizado em uma espécie de avenida, foi escolhido para sediar a Casa Brasil Paralímpico, ponto de encontro de torcedores, apreciadores da cultura brasileira, autoridades e atletas medalhistas.
O espaço fica a cerca de 40 minutos de carro de Paris e está aberto ao público desde a última quinta-feira (29). Segundo o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), a expectativa é que até quatro mil visitantes diários passem pelo ambiente até o dia 8 de setembro, quando terminam as Paraolimpíadas.
Um telão instalado no palco próximo à praça de alimentação permite que os torcedores acompanhem as provas dos atletas. No mesmo espaço, o músico cego Luan Richard canta clássicos da música brasileira – em uma das apresentações, fez um dueto com o ex-goleiro Jackson Follmann, sobrevivente do acidente aéreo da Chapecoense em 2016, e que teve a perna direita amputada. À entrada, simuladores dão aos visitantes a oportunidade de “praticar” algumas atividades, como a canoagem.
Cultura e inclusão
O espaço também recebe apresentações que mesclam cultura e inclusão. O batuque de Samba Inclusivo da Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo (Liga-SP), que reúne bailarinos e ritmistas com deficiência, fez com que todos dançassem – principalmente os não brasileiros – ao som de músicas famosas do nosso carnaval.
Entre os sambistas, Wagner Esteves, conhecido como Gavião, é um dos mais animados. Ele toca repinique e usa prótese na perna direita, devido a um acidente de carro. Além disso, é atleta de futebol amputado, esporte que, hoje, não faz parte das Paraolimpíadas. Vivenciar os Jogos de Paris, porém, desperta o sonho de ver o esporte que você pratica, um dia, também fazer parte do megaevento.
“Esperamos que ele [futebol de amputados] ser reconhecido e está pressionando para que isso aconteça no futuro. Assim como o esporte é renovador, é superação, é força, a música também é e transforma vidas. É se reinventar. A perna sumiu, então é hora de tentar viver melhor”, disse Gavião.
À frente de Wagner e dos demais ritmistas está Melina Reis, uma pioneira. Vítima de acidente de moto, teve a perna esquerda amputada devido às consequências após muitas cirurgias. Dançarina clássica, ela parecia longe de voltar a fazer o que mais amava. Uma prótese inédita e personalizada, que lhe permite voltar a ficar na ponta dos pés, devolveu-a ao mundo da dança.
“O atleta é a base de tudo. É de onde a gente tira força, a partir do momento em que você se desafia. Dançar também é muito parecido. E poder homenagear tantos amigos que estão competindo [em Paris]que torço, e fazer parte do projeto do samba inclusivo é especial. É levar esperança para quem está desmotivado”, disse a dançarina.
Ela não está sozinha. Desde a última sexta-feira (30), as bailarinas da Associação Fernanda Bianchini também se apresentam na Casa Brasil. É o único grupo de balé profissional do mundo formado por bailarinos cegos. E não é a primeira vez que a empresa, criada em 1995 e que reúne mais de 400 alunos com deficiência, se envolve com o movimento paralímpico. Em 2012, as meninas participaram da cerimônia de encerramento dos Jogos de Londres, na Grã-Bretanha.
A dançarina Gisele Nahkur foi uma das que se apresentou no Estádio Olímpico da capital britânica. Antes de perder a visão, ela sonhava em ser jogadora de basquete. Quis o destino que, após a cegueira, surgiu a oportunidade de estar em um megaevento esportivo.
“[Em Londres] Dançamos para 82 mil pessoas. O mundo inteiro poderia assistir pela TV. Não sei se é apenas uma coincidência. Eu poderia, jogando e vendo, chegar às Olimpíadas? Depois de ficar cega, como bailarina clássica, o que nunca imaginei na vida, me devolveram a vontade de sorrir e de viver e me levaram para uma segunda Paraolimpíada”, lembrou.
A “homônima” Gisele Camillo, que nasceu com deficiência visual, perdeu toda a visão devido ao glaucoma. Apaixonada por dançar, ela até “fingiu” que enxergava, quando ainda tinha baixa visão, para não ser excluída. O balé inclusivo mudou sua história, pois ela se aventurou no atletismo entre 2018 e 2020, em provas de atletismo.
“Hoje sou formada em balé clássico, sou professora. Também sou profissional de educação física. Sou a pessoa que prepara os atletas para competir. [em Paris, na Paralimpíada]ser uma pessoa com deficiência, representar a nossa escola e estar próximo dos atletas paralímpicos é indescritível. Assim como estamos realizando sonhos aqui, eles [atletas] eles também são”, concluiu.
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