Apesar das críticas de apoiadores, a campanha de Guilherme Boulos (PSOL) pretende manter a estratégia adotada até agora de trabalhar em uma postura “mais leve” para o candidato apoiado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à prefeitura de São Paulo. A intenção é manter as palestras focadas na apresentação de propostas para a cidade. Os interlocutores do psolista manifestaram preocupação de que, caso o candidato adote um tom mais agressivo contra Pablo Marçal (PRTB) – como desejado por parte da militância -, isso possa reforçar a imagem radical que uma parcela do eleitorado já tem dele.
Esta apreensão é reforçada pelas pesquisas qualitativas às quais a campanha teve acesso. Segundo um aliado de Boulos ouvido pela reportagem, essas pesquisas indicam que a etiqueta “radical” é o principal motivo citado pelos eleitores que optam por não votar no candidato do PSOL. Desde antes do período eleitoral, Boulos tenta desconstruir essa imagem negativa, associada ao seu passado como líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). Para isso, ele tem feito ajustes no visual, adotando roupas mais alinhadas, e evitando tratar de assuntos caros ao seu partido, mas que poderiam reforçar a imagem que tenta desconstruir.
Um exemplo disso é a questão da Venezuela. Boulos reconheceu recentemente sinais de fraude nas últimas eleições presidenciais do país, contrastando com as suas posições anteriores, nas quais defendeu a ditadura de Nicolás Maduro. Ele também ajustou seu discurso sobre outros temas sensíveis ao PSOL, como a descriminalização das drogas e a ampliação do direito ao aborto legal. Em entrevista a uma rádio gospel, o deputado federal afirmou que a descriminalização das drogas não é a sua posição e que a legislação sobre o aborto não precisa ser ampliada, mas sim cumprida – remontando às diretrizes históricas do seu partido.
A estratégia adotada por Boulos, de passar de uma postura com forte acento ideológico para uma abordagem mais pragmática, não é inédita entre candidatos de partidos de esquerda. Esse movimento visa ampliar a base eleitoral – visando eleitores centristas – e aumentar as chances de viabilidade nas urnas. Exemplo dessa tática foi a transição do presidente Lula, que, nas eleições gerais de 2002, adotou uma postura mais moderada e pragmática, culminando na chamada “Carta ao Povo Brasileiro”, documento fundamental para seu primeiro vitória na corrida presidencial.
Pressão nas redes sociais
O crescimento de Marçal nas pesquisas de intenção de voto gerou alarme entre militantes e lideranças partidárias de esquerda, que passaram a pressionar Boulos, principalmente nas redes sociais, para que adotasse uma postura mais combativa contra o influenciador. A estratégia de Marçal baseia-se em ataques e acusações contra adversários, muitas vezes sem apresentação de provas, que depois se tornam virais nas redes sociais em vídeos curtos e descontextualizados. Boulos tem sido o principal alvo de Marçal e já conseguiu obter o direito de resposta contra o ex-técnico na Justiça.
A pesquisa mais recente do Datafolha, divulgada no dia 22, mostra empate técnico entre Boulos, Marçal e o prefeito Ricardo Nunes (MDB) na primeira colocação. Boulos tem 23%, Marçal tem 21% e Nunes aparece com 19%. A margem de erro da pesquisa é de três pontos percentuais, para mais ou para menos.
Diante das críticas à sua comunicação, Boulos fez um comunicado nesta semana convocando seus apoiadores para um “ato contra o bolsonarismo”, marcado para o próximo sábado, dia 31, na Praça Roosevelt, no centro de São Paulo. A fala do deputado psolista ocorreu depois que seus apoiadores começaram a comparar sua postura moderada com a estratégia mais agressiva adotada por Tabata Amaral, candidata do PSB, contra Marçal. Tabata produziu vídeos cinematográficos que expõem a relação entre membros do partido de Marçal, PRTB, e a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC).
“Vi esses dias nas redes sociais gente falando: ‘temos que bater mais forte, bater mais forte’. Pessoal, a eleição não é uma disputa de quem grita mais alto. Não precisamos provar isso para nós. Fizemos isso nos últimos anos neste país, na verdade, não só nas redes sociais, mas nas ruas, de forma organizada, exibindo-se”, disse Boulos em seu comunicado. Ele acrescentou que Marçal não é o único adversário na campanha e que o atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), apoiado formalmente pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), também deve ser combatido.
Aposte na polarização
A campanha de Boulos tem tentado promover o lema “duas faces da mesma moeda” ao referir-se a Marçal e Nunes, destacando que o autarca tem o apoio formal de Bolsonaro, enquanto Marçal tem forte apelo entre os eleitores do ex-presidente. Quem está ao redor de Boulos avalia que o campo da direita entrou em uma espécie de guerra pelo voto bolsonarista e que, a menos que algo extraordinário aconteça, Boulos já tem sua vaga garantida no segundo turno.
Por isso, dizem aliados, o crescimento de Marçal não preocupa tanto a campanha do PSOL, pois, segundo eles, “isso seria um problema para Nunes”.
A partir desse diagnóstico, a campanha do PSOL aposta tanto na polarização quanto na rejeição para vencer a disputa na capital. Um aliado de Boulos chegou a comparar a eleição paulista a um “terceiro turno” das eleições gerais de 2022 ou mesmo a um prelúdio da disputa pelo Palácio do Planalto em 2026. A atual estratégia do PSOL consiste em posicionar o deputado como representante de Lula , ao contrário do representante de Bolsonaro, que poderia ser Marçal ou Nunes.
Essa tática parte da premissa de que o bolsonarismo enfrenta um alto índice de rejeição na capital. Em 2022, tanto Lula quanto o então candidato do PT ao governo do estado, Fernando Haddad, venceram na cidade. Portanto, segundo os aliados de Boulos, é crucial associar tanto Nunes como Marçal ao ex-presidente, mesmo que Marçal não tenha o apoio formal de Bolsonaro. Pesquisas recentes também indicam que os eleitores rejeitam mais um candidato apoiado por Bolsonaro do que um apoiado por Lula.
No último sábado, 24, Lula gravou vídeos ao lado de Boulos para serem utilizados na campanha e participou de dois comícios com o psolista. No palco, ela enfatizou que Boulos não deveria ser visto pelos petistas apenas como o candidato do PSOL, mas sim como o próprio candidato do PT. É a primeira vez desde a redemocratização que o PT não lança candidato próprio a prefeito de São Paulo. Em vez disso, ela optou por apoiar Boulos e nomear a ex-prefeita Marta Suplicy como vice-presidente.
Além disso, o partido de Lula se comprometeu a transferir R$ 30 milhões do fundo eleitoral para a candidatura de Boulos e Marta.
Campanha à moda antiga
Após os comícios com Lula e a convocação do comício na Praça Roosevelt, a campanha de Boulos começou a enfrentar novas questões. As críticas surgiram devido à percepção de que a esquerda estava apegada a formas antiquadas de campanha, como plataformas e manifestações de rua, em vez de investir mais intensamente em campanhas digitais, especialmente nas redes sociais. Em seu discurso na segunda-feira, Boulos admitiu que a direita tem mais facilidade em fazer campanha online.
“Sabe por que a extrema direita, nas redes sociais, muitas vezes se levanta mais e faz mais barulho? então, a ideia é unificar a nossa equipe, o nosso lado, daqueles que defendem a democracia para São Paulo”, disse Boulos, acrescentando que o evento na Praça Roosevelt servirá para transmitir aos militantes a estratégia que a campanha terá. seguir no futuro. redes.
Questionado sobre o assunto em entrevista ao Roda Viva, da TV Cultura, Boulos destacou a importância das redes sociais, mas rejeitou a ideia de que a esquerda esteja presa a métodos de campanha ultrapassados. Na visão do psolista, o contacto direto com os eleitores é fundamental no processo eleitoral. Os aliados de Boulos partilham desta percepção e dizem que a presença nas ruas nunca será ultrapassada ou antiquada.
Do início da campanha, dia 16, até dia 27, Boulos foi o segundo candidato com maior número de agendas publicadas, totalizando 39 compromissos, contra 42 de Nunes e 24 de Marçal. Porém, o psolista foi o candidato com maior número de manifestações de rua, com 20 caminhadas no comércio local, em contraste com nove do prefeito e três do candidato do PRTB.
A expectativa de quem está ao redor de Boulos é que o ato deste sábado sirva para acalmar a militância e também para fornecer orientações e materiais de apoio sobre como os apoiadores do psolista podem contribuir na disputa eleitoral. Um aliado de Boulos afirma que a intenção é manter uma agenda propositiva, sem permitir que Marçal domine a agenda com temas fora da cidade. Porém, acrescenta que Boulos responderá com firmeza ao ex-técnico, entrando em confronto quando necessário.
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