“Levei 15 anos para entender que fui vítima de abuso sexual em uma unidade socioeducativa. Achei que fosse uma troca de favores. Mais tarde compreendi que eram agentes do Estado que violavam os meus direitos.”
A história é de Monalisa Teixeira, hoje com 35 anos. Filha de empregada doméstica e abandonada pelo pai, ficou internada por medidas socioeducativas dos 15 aos 16 anos.
Hoje Monalisa faz parte do Movimento Moleque, que apoia mães que têm filhos vítimas de violência.
O relato foi feito na apresentação, nesta quarta-feira (21), de uma pesquisa sobre a situação dos adolescentes em medidas socioeducativas de internação. O evento aconteceu no auditório da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, as medidas socioeducativas são aplicadas pela Justiça aos menores envolvidos na prática de infração. O grau mais grave é o de privação de liberdade, realizado em unidades de internação administradas pelos governos estaduais.
O relatório foi elaborado pela Plataforma Brasileira de Direitos Humanos (Dhesca), rede formada por quase 50 organizações da sociedade civil, como Justiça Global e Odara – Instituto da Mulher Negra.
“O sistema socioeducativo brasileiro são miniprisões que se fazem passar por um sistema socioeducativo”, afirma a relatora nacional de direitos humanos do Dhesca, Isadora Salomão.
Violações
Os pesquisadores visitaram unidades socioeducativas reservadas a adolescentes do sexo feminino em três estados: São Paulo, Rio de Janeiro e Ceará, entre março e abril de 2022. Também entrevistaram adolescentes, familiares, gestores de unidades e funcionários, além de representantes de instituições como Defensorias Públicas, Tribunais de Justiça e Ministério Público.
Apesar do número limitado de estados, o relator entende que a situação encontrada não é específica destas localidades.
“Estamos fazendo este relatório a partir de uma perspectiva nacionalizada, apesar de termos visitado estes três estados. Queremos dar uma visão geral da situação das meninas no sistema socioeducativo”.
O relatório classifica as violações de direitos em três eixos: estrutural, relacionado com questões de alojamento; saúde, que abrange questões físicas e mentais; e identidade e cultura. “Esta última envolve questões como racismo e lesbofobia”, explica Isadora.
Entre os pontos identificados estão espaço restrito, causando aglomeração de internos; medidas de isolamento como forma de punição para infrações disciplinares; casos de banheiros sem vaso sanitário e sem porta; proibição de recebimento de itens de higiene, sendo obrigatório o uso de roupas íntimas distribuídas em quantidade insuficiente; falta de atividades educativas e recreativas; presença de agentes socioeducativos do sexo masculino, existência de algemas e denúncias de violência e assédio sexual.
Outra questão é a disposição geográfica das unidades. Com poucos endereços, muitos adolescentes ficam longe de onde moram, dificultando o recebimento de visitantes.
Com base em documentos públicos e estatísticas, Dhesca traçou o perfil dos adolescentes que cumprem medidas socioeducativas no país. Quase 70% deles residem em cidade diferente da sede da unidade de internação. Mais da metade tem entre 17 e 18 anos, 18% são mães e 5% se declaram transexuais.
Uma crítica destacada no relatório é a questão da permanência das adolescentes que se tornam mães no hospital. “Há muitas crianças que não conseguem ver uma grade, pois passaram a primeira infância naquele espaço. As crianças nascem seguindo medidas socioeducativas”, lamenta.
“As medidas de internamento são um último recurso”, argumenta o relator.
Ressocialização
A presidente da Comissão de Direitos Socioeducativos da Seção da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro (OAB-RJ), Margarida Prado, criticou o tratamento duro que os menores recebem nas unidades de internação, como andar de cabeça baixa e com as mãos para trás .
“Temos que quebrar a dinâmica de submissão e obediência. Você tem que ter autonomia. Caso contrário, ao sair da prisão, em vez de obedecer ao diretor, obedecerá ao traficante. O Estado tem que investir na pedagogia da autonomia”, afirmou.
A vice-presidente do Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente, Mônica Alkmim, estende suas críticas ao sistema de Justiça. “Quem manda menores para as unidades sabe o que acontece lá. Há a visão de que são ‘sementinhas’ do mal”, criticou.
A defensora pública Paula Arraes reforça as críticas dirigidas ao Judiciário. “Já ouvi frases como ‘se fosse tão ruim assim, eles não voltariam’.” O defensor relatou ainda que, como os defensores podem realizar fiscalizações em unidades socioeducativas, algumas formas de violação de direitos são realizadas de forma tácita, dificultando a documentação.
“Eles chamam as meninas trans pelo nome registrado”, disse ele. “É difícil comprovar o estupro quando se tem a foto de uma adolescente ferida. Torna-se ainda mais quando é difícil documentar”, observa o subcoordenador de assuntos socioeducativos da Coordenação de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cdedica) da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro. Janeiro.
Para Isadora, o sistema socioeducativo se comportando como se fosse uma miniprisão impacta a vida dos adolescentes, mesmo quando eles alcançam a liberdade.
“A tendência é que eles saiam e não consigam ter uma vida coletiva e produtiva”, avalia.
Segundo Isadora, o relatório – iniciado após o recebimento de denúncias apresentadas por movimentos sociais e organizações da sociedade civil – é uma forma de esclarecer o problema.
“Este relatório ajuda a sociedade como um todo a saber o que acontece nos sistemas socioeducativos femininos no Brasil.”
Ela também considera o documento um combustível para a defesa dos direitos humanos. “Incentiva uma luta para que essa situação acabe e para que olhemos para a infância e a adolescência como um período em que é necessário que o Estado se responsabilize mais por quem precisa ser ressocializado”, finaliza.
qual a melhor taxa de juros para emprestimo
desbloquear inss para emprestimo
empréstimo aposentado itaú
sim empréstimo contato
refinanciamento de empréstimo pessoal
siape mg
quitar emprestimo consignado caixa
quantos anos existe o whatsapp