Um projeto de lei em discussão no Senado cria o risco de mudança de mandatos e pode resultar em “caos político”.
O alerta vem de um grupo de oito advogados eleitorais, liderados por Márlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa.
Em manifesto, avaliam que os parlamentares tentam flexibilizar a inelegibilidade “de forma clara e acentuada”, atingindo o “coração” da lei criada em 2010 para excluir da candidatura condenados por crimes graves.
Os fundadores da Associação Brasileira de Eleitorais pedem que os senadores “dignifiquem o mandato recebido pelo voto popular” e votem contra a proposta.
Segundo eles, a reversão da Lei da Ficha Limpa “ataca a soberania popular, vai contra o interesse público e só serve para dar livre acesso à candidatura a cargos eletivos a indivíduos que deveriam estar fora do processo político”.
O grupo reage ao Projeto de Lei Complementar nº 192/2023, que voltou a ser discutido na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
A proposta aparece como primeiro item da pauta da sessão desta quarta-feira, 21.
O relator do texto é o senador Weverton (PDT-MA), que deu parecer favorável às mudanças dentro do período de inelegibilidade.
Segundo Weverton, as mudanças visam “coibir distorções que ocorrem hoje, em que um titular de mandato sofre pena específica, e suas implicações na inelegibilidade afetam de forma desigual, e assim, violam o princípio constitucional da igualdade”.
Para o senador, alguma inelegibilidade acaba por declarar a “morte política da pessoa”.
Para os eleitoralistas, o projeto discutido pelos senadores representa “retrocessos gravíssimos” nas regras que regem o pleito.
Uma das principais críticas é feita ao dispositivo que prevê a inelegibilidade, por oito anos, após o cumprimento da pena em processos penais e ações de improbidade.
O novo texto estabelece que o prazo só é contado a partir da condenação em segundo grau.
Segundo a Associação Brasileira de Eleitoralistas, a proposta acaba abrindo uma brecha para reduzir drasticamente o período de inelegibilidade dos condenados por homicídio, estupro, tráfico de drogas e organização criminosa.
“Em alguns casos, os indivíduos condenados por tais crimes nem seriam inelegíveis, pois ao contar o período de 8 anos de condenação por órgão colegiado, e não o final da pena, esses indivíduos, ao final da pena, estariam já cumpriram o prazo de inelegibilidade”, alertam os advogados.
Também criticam duramente a intenção dos parlamentares de unificar a inelegibilidade em um limite máximo de 12 anos.
A entidade vê uma ofensa ao princípio da igualdade, já que os condenados reincidentes são tratados de forma semelhante a quem sofreu algum incidente.
Ele também vê a possibilidade de tal trecho do projeto abrir caminho para “situações anômalas e absurdas” e até incentivar novos ilícitos, já que não causariam mais inelegibilidade
“Se determinada pessoa, durante os oito anos de inelegibilidade, incluindo o sétimo ano, cometer vários outros crimes ou infrações que gerem inelegibilidade, a sua restrição eleitoral será limitada a apenas 12 anos.
Ou ainda, no décimo ou 11º ano de inelegibilidade, cometer novos crimes, mesmo assim, a sua inelegibilidade ficará limitada a 12 anos, o que é um absurdo”, alertam.
Segundo eleitoralistas, o ponto mais grave do texto é o facto de prever a aplicação das regras ainda em debate a processos em curso e com condenações definitivas, afetando eleições já concluídas.
Marlon Reis e seus pares veem “um enorme risco de alteração dos atuais mandatos”.
“A reversão dos registros rejeitados acarretaria na recontagem de votos, na alteração dos quocientes partidários e eleitorais, na elevação das médias e na retotalização dos resultados, com substituição de parlamentares federais, estaduais e municipais, causando verdadeiro caos político e insegurança institucional e jurídica” , alerta.
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