O Parlamento venezuelano, controlado pelo chavismo, discute nesta terça-feira (13) uma lei para regular as ONGs, parte de um polêmico pacote legislativo promovido em meio a acusações da oposição de fraude eleitoral e sob o alerta da ONU sobre um “clima de medo”.
O presidente de esquerda, Nicolás Maduro, foi proclamado vencedor com 52% dos votos para um terceiro mandato de seis anos, até 2031.
A oposição, liderada por María Corina Machado, reivindica a vitória do seu candidato Edmundo González Urrutia nas eleições de 28 de julho, que o presidente considerou um incitamento ao “golpe de Estado” e à “guerra civil”.
A sua reeleição gerou protestos que deixaram 25 mortos, 192 feridos e mais de 2.400 detidos, em meio a apelos dos Estados Unidos, da Europa e de vários países latino-americanos para que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) apresentasse informações detalhadas sobre a eleição. .
O presidente da Assembleia Nacional unicameral, Jorge Rodríguez, anunciou a Maduro que se dedicará durante a presente sessão à tarefa de “aprovar um pacote de leis” que o presidente solicitou “para poder cuidar e defender a nossa população de ódio”.
“Clima de medo”
O chavismo tem 256 dos 277 deputados na Assembleia Nacional. O pacote de leis inclui, além das ONGs, a regulamentação das redes sociais, uma lei para punir o “fascismo”, termo com o qual o governo também costuma se referir aos seus críticos.
“Apelo às autoridades para que não adotem estas ou outras leis que prejudiquem o espaço cívico e democrático do país”, solicitou o Alto Comissário para os Direitos Humanos, Volker Türk, num comunicado em que também manifestou preocupação com as detenções e acusações por “ ódio” ou sob a “legislação antiterrorismo”.
A sua porta-voz, Ravina Shamdasani, descreveu um “clima de medo” no país, em que “é impossível aplicar os princípios democráticos e proteger os direitos humanos”.
“Num clima de medo como este, quando discordamos da política governamental, não nos manifestamos”, disse ele numa conferência de imprensa.
O chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, defendeu uma “saída dialogada e democrática da crise” na Venezuela, depois de falar com o chanceler colombiano, Luis Gilberto Murillo.
Violações
A organização Repórteres Sem Fronteiras denunciou 70 violações da liberdade de expressão em 15 dias.
“Os jornalistas, nacionais e estrangeiros, enfrentam um clima de hostilidade e repressão, marcado por detenções arbitrárias, ameaças, ataques físicos, censura e restrições ao acesso à informação”, apontou.
A RSF destacou a detenção de nove jornalistas, quatro dos quais permanecem atrás das grades sob a acusação de conspiração, terrorismo, incitamento à violência e actividades subversivas.
ONGs: primeiro tema da agenda
A segunda discussão da “Lei de fiscalização, regularização, atuação e financiamento das organizações não governamentais e similares” ocupa o primeiro ponto da agenda legislativa desta terça-feira.
As ONG são alvos frequentes de ataques por parte dos que estão no poder.
A primeira discussão data de 2023, embora o seu conteúdo tenha sido modificado depois que o seu promotor, o poderoso líder Diosdado Cabello, acusou 60 organizações de manobras de “desestabilização”.
De acordo com o projeto, as organizações devem se registrar em cartório local e declarar fontes de financiamento, geralmente estrangeiras.
O descumprimento também acarreta multas que podem chegar a 10 mil dólares (R$ 55 mil na cotação atual).
“Eles são regulamentados em quase todas as partes do mundo, mas não na Venezuela”, protestou Rodríguez.
Na região, existem regulamentações semelhantes em Cuba, Nicarágua, Guatemala e Bolívia.
Redes e fascismo
Maduro garante que as redes estão a ser utilizadas para atacar a sua reeleição: suspendeu a rede social X por 10 dias e promove também um boicote à aplicação de mensagens WhatsApp.
Rodríguez propôs incorporar numa polêmica norma que pune “crimes de ódio”, amplamente utilizados contra opositores, com até 20 anos de prisão, “elementos relacionados à propagação de ódio nas redes sociais”.
Maduro apelou a “punho de ferro e justiça severa” face à “violência” e aos “crimes de ódio”, que atribui a Machado e González Urrutia.
Ele já solicitou a prisão dos dois, que passaram à clandestinidade.
A “Lei contra o Fascismo, o Neofascismo e Expressões Similares” foi aprovada na primeira discussão e pune a promoção de reuniões ou manifestações que “apusessem desculpas ao fascismo”.
Propõe também a ilegalização dos partidos políticos e a adoção de multas de até 100 mil dólares (R$ 549 mil) para empresas, organizações e meios de comunicação que financiem atividades ou divulguem informações que “incitem o fascismo”.
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