Nobel da Paz diz que está disposto a liderar governo interino em Bangladesh

O ganhador do Prêmio Nobel da Paz, Muhammad Yunus, declarou nesta terça-feira (6) que está disposto a liderar um governo interino em Bangladesh, depois que os militares assumiram o controle do país no dia anterior, em meio a uma onda de protestos que derrubou o governo de Sheikh Hasina.

Os líderes estudantis que lideraram os protestos exigem que o governo interino seja liderado por Yunus, vencedor do Prémio Nobel da Paz em 2006 por criar um sistema de microcrédito para os pobres.

Hasina, de 76 anos, estava no poder há 15 anos, mas o seu último mandato como primeira-ministra, que começou em Janeiro, foi marcado por um boicote às eleições da oposição, que as denunciou como nem livres nem justas.

Hasina acabou demitindo-se e fugiu do país na segunda-feira, pressionado por uma onda de protestos que começou no início de julho com um movimento estudantil contra um sistema de cotas para funcionários, mas que evoluiu para uma mobilização mais ampla contra o governo.

O chefe do Exército, general Waker Uz Zaman, anunciou na segunda-feira que os militares formarão um governo interino.

O Presidente do Bangladesh, Mohamed Shahabudin, anunciou esta terça-feira a dissolução do Parlamento, uma das principais reivindicações dos estudantes, partilhada com a principal formação da oposição, o Partido Nacionalista do Bangladesh (BNP).

Ambos pedem agora que eleições sejam convocadas nos próximos três meses. Além disso, os líderes estudantis pediram na terça-feira que Yunus liderasse o governo interino.

“Estou comovido com a confiança dos manifestantes que querem que eu esteja à frente do governo interino”, disse Yunus numa declaração escrita à AFP.

“Sempre mantive a política à distância (…) Mas hoje, se for necessário agir no Bangladesh, pelo meu país e pela coragem do meu povo, então o farei”, garante no comunicado, no qual ele também pede eleições “livres”.

O chefe do Exército deverá reunir-se esta terça-feira com líderes estudantis para ouvir as suas exigências para que Yunus lidere o executivo interino.

Yunus é conhecido por ter tirado milhões de pessoas da pobreza através da concessão de microcréditos, iniciativa pela qual recebeu o Prémio Príncipe das Astúrias de Concórdia em 1988. Hasina acusou-o de “sugar o sangue” dos pobres.

Polícia pede “perdão”

O Exército reestruturou sua liderança militar na terça-feira e demitiu comandantes seniores considerados próximos de Hasina.

A força também demitiu Ziaul Ahsan, um oficial envolvido no Batalhão de Ação Rápida, uma força paramilitar sob sanções dos EUA por alegações de violação dos direitos humanos.

Desde o início das mobilizações, pelo menos 432 pessoas morreram, segundo um inquérito da AFP baseado em relatos da polícia, autoridades e médicos de hospitais, e que culminou com a fuga de Hasina num helicóptero.

Na segunda-feira, os distúrbios e confrontos deixaram pelo menos 122 mortos e, embora a situação tenha ficado menos tensa esta terça-feira, com a reabertura do comércio e o levantamento do recolher obrigatório, foram registadas 10 mortes.

No final da segunda-feira, o chefe de Estado ordenou a libertação das pessoas detidas durante as manifestações e da principal rival política de Hasina, a ex-primeira-ministra Khaleda Zia, do BNP, que esteve em prisão domiciliária durante anos.

Em comunicado publicado na terça-feira, o principal sindicato policial pediu desculpas pelos disparos contra estudantes.

A federação afirmou que a polícia foi obrigada a “abrir fogo” contra os jovens e que estes foram então apresentados como “vilões”. Ele também anunciou uma greve para garantir a segurança dos funcionários.

Milhões de pessoas saíram às ruas de Dhaka, a capital, na segunda-feira, após a renúncia de Hasina.

Os manifestantes invadiram o Parlamento e incendiaram estações de televisão, e alguns destruíram estátuas do pai de Hasina, o xeque Mujibur Rahman, que liderou a luta pela independência contra o Paquistão em 1971.