A alta do dólar e o impacto do aumento dos gastos públicos nas expectativas de inflação preocupam o Banco Central (BC) na definição dos próximos passos da política monetária. A instituição informou, nesta terça-feira (6), que o cenário marcado por projeções mais altas e mais riscos de inflação elevada é desafiador e que “não hesitará em aumentar a taxa de juros para garantir a convergência da inflação à meta”.
Na semana passada, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC decidiu manter a Selic, pela segunda vez consecutiva, após um ciclo de sete reduções, que durou de agosto de 2023 a maio de 2024. Os juros básicos da economia foram mantidos em 10,5 % por ano. A próxima reunião está marcada para os dias 17 e 18 de setembro.
Os membros do colegiado afirmaram que o momento é de “ainda maior cautela e monitoramento diligente das condições de inflação”. “À luz desse acompanhamento, o comitê avaliará a melhor estratégia: por um lado, se a estratégia de manutenção da taxa de juros por tempo suficientemente longo trará a inflação para a meta no horizonte relevante [de seis trimestres à frente, correspondendo, agora, ao primeiro trimestre de 2026]; Por outro lado, o Comitê reforçou por unanimidade que não hesitará em aumentar a taxa de juros para garantir a convergência da inflação à meta se julgar apropriado”, diz o ata da reuniãolançado hoje.
Quando o Copom reduz a Selic, a tendência é que o crédito fique mais barato, incentivando a produção e o consumo, estimulando a atividade econômica e reduzindo o controle da inflação. Quando o Copom aumenta a taxa básica de juros, o objetivo é conter a demanda aquecida, e isso impacta nos preços porque juros mais altos encarecem o crédito e estimulam a poupança.
Em junho, influenciada principalmente pelo grupo alimentação e bebidas, a inflação do país foi de 0,21%, após ter registrado 0,46% em maio. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 12 meses, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou 4,23%. A inflação de julho será divulgada na próxima sexta-feira (9).
Apesar de estar em queda, o índice ainda está acima da meta estabelecida pelo Banco Central, alimentado pela incerteza entre os agentes econômicos. Definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), a meta é de 3% para este ano, com faixa de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. Ou seja, o limite inferior é de 1,5% e o limite superior é de 4,5%. As expectativas do mercado para a inflação em 2024 e 2025 giram em torno de 4,1% e 4%, respectivamente.
No caso do horizonte relevante observado pelo BC, que é março de 2026, há um processo de desinflação no período, mas a projeção de inflação ainda está acima da meta, que é de 3%, no sistema de metas contínuas que entra em vigor em 2025. No cenário de referência (com juros em queda), a projeção de inflação acumulada em quatro trimestres para o primeiro trimestre de 2026 é de 3,4% e, no cenário alternativo (com manutenção da Selic), a projeção é de 3. dois%.
Condicionamento
Segundo o BC, as movimentações recentes em algumas condições da dinâmica da inflação, como as expectativas de inflação e a taxa de câmbio, foram amplamente debatidas na última reunião do Copom. “Observou-se que, caso tais movimentos se mostrem persistentes, os impactos inflacionários resultantes poderão ser relevantes e serão devidamente incorporados pelo comitê”, diz a ata.
A ancoragem das expectativas de inflação é vista como elemento essencial para garantir a convergência em direção à meta e o colegiado monitora como os desenvolvimentos recentes na política fiscal (controle das contas públicas) impactam a política monetária e os ativos financeiros.
“Notou-se que a percepção mais recente dos agentes de mercado relativamente ao crescimento da despesa pública e à sustentabilidade do actual quadro fiscal, juntamente com outros factores, tem tido impactos relevantes nos preços e expectativas dos activos. O comitê reafirma que uma política fiscal credível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para ancorar as expectativas de inflação e reduzir os prêmios de risco sobre os ativos financeiros, impactando consequentemente a política monetária”, alertou o BC.
“A comissão reforçou a opinião de que o enfraquecimento dos esforços nas reformas estruturais e na disciplina fiscal, o aumento do crédito direcionado [com taxas reguladas pelo governo] e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios no poder da política monetária e, consequentemente, no custo da desinflação em termos de atividade”, diz outro trecho da ata.
A taxa neutra é aquela que não estimula nem desincentiva a economia, ou seja, é a taxa de juros real condizente com a manutenção do nível de atividade econômica, com a promoção do pleno emprego e da inflação na meta.
Além disso, segundo o BC, o cenário internacional continua adverso e a menor sincronização dos ciclos de queda das taxas de juros nos países avançados e dos fluxos globais de capitais, marcados pela aversão ao risco, contribuem para a volatilidade do mercado e pressionam a taxa de juros. taxa de câmbio nos países emergentes. As taxas de juro mais elevadas nas economias avançadas incentivam a fuga de recursos dos países emergentes, como o Brasil.
O Copom reforça, porém, que a condução da política monetária brasileira não está mecanicamente ligada à política norte-americana ou à taxa de câmbio, mas sim aos mecanismos de transmissão da situação externa sobre a inflação interna. A valorização do dólar tem impacto significativo nos preços internos do Brasil, por exemplo, por meio da importação de produtos, da igualdade de preços e da pressão sobre a dívida externa pública e corporativa.
O dólar acumulou alta de 15,15% somente no primeiro semestre de 2024. “Diante de um cenário global mais incerto e de movimentos cambiais mais abruptos, o colegiado adota postura mais cautelosa”, informou o BC.
Trajetória
A Selic é o principal instrumento do Banco Central para manter sob controle a inflação oficial, medida pelo IPCA. De março de 2021 a agosto de 2022, o Copom elevou a taxa Selic 12 vezes consecutivas, num ciclo de aperto monetário que começou em meio ao aumento dos preços de alimentos, energia e combustíveis. Durante um ano, de agosto de 2022 a agosto de 2023, a taxa foi mantida em 13,75% ao ano, por sete reuniões consecutivas.
Com o controle de preços, o BC passou a fazer cortes na Selic, numa sequência de sete reduções, de agosto de 2023 a maio de 2024.
Antes do início do ciclo ascendente, em março de 2021, a Selic havia sido reduzida para 2% ao ano, no menor patamar da série histórica iniciada em 1986. Devido à contração econômica gerada pela pandemia de covid-19, o O Banco Central baixou a taxa para estimular a produção e o consumo. O índice ficou no nível mais baixo da história de agosto de 2020 a março de 2021.
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