Os partidos políticos têm pelo menos R$ 378 milhões inscritos na dívida ativa da União. Essas dívidas poderão ser perdoadas ou refinanciadas em condições favoráveis caso a PEC da Anistia (9/2023), já aprovada na Câmara, passe pelo Senado.
Os dados são provenientes de uma pesquisa realizada Poder360 com base em informações da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) de março. Leia a metodologia no final do texto.
O PT é a sigla cujos órgãos partidários (como diretórios municipais e estaduais) acumulam o maior volume de dívidas. São R$ 26 milhões em dívidas previdenciárias, R$ 24 milhões em dívidas não previdenciárias e R$ 300 mil relativos ao não pagamento do FGTS. Ó Poder360 contatou a sigla, que não quis comentar.
A União Brasil aparece em seguida, com R$ 34,5 milhões. Em 3º lugar estão os órgãos do partido PP, com R$ 30,3 milhões.
No total, o relatório identificou 24.975 órgãos partidários (diretórios e comissões partidárias nacionais, estaduais ou municipais) na lista divulgada pela dívida ativa da União, cuja última atualização é março de 2024.
O que diz a PEC da Anistia
Segundo o texto enviado ao Senado, as dívidas previdenciárias poderão ser inscritas no Refis com condições especiais (sem multa e 60 meses para pagar). Outras dívidas podem ser completamente perdoadas.
Os dados compilados acima por Poder360, porém, são apenas parte do que seria anistiado. Não há informações sobre a extensão total da anistia. O texto aprovado pela Câmara inclui:
- responsabilidade eleitoral – a ONG Transparência Partidária estima que R$ 23 bilhões em contas partidárias deixariam de ser analisados de 2018 a 2023. Quaisquer irregularidades que possam ter existido não serão investigadas e serão automaticamente perdoadas;
- sanções por não cumprimento da cota – os partidos que não aplicaram o valor mínimo legal às candidaturas negras e partidárias não serão mais cobrados por isso. Deverão aplicar o valor que deixaram de usar nestas candidaturas nas próximas 4 eleições;
- multas por impostos não pagos – deixarão de ser cobrados ou serão parcelados;
- dívidas discutidas em tribunal – a anistia seria automática;
- processos administrativos ou judiciais – o perdão pode aplicar-se a diferentes tipos de processos sofridos pelas partes, deixando ambígua toda a extensão do que seria anistiado;
- multa por caixa 2 – agora pode ser pago com recursos do Fundo Partidário;
- Recargas – não há data no texto para interrupção dos parcelamentos da dívida. Ou seja, em tese a sigla poderia deixar de cumprir uma obrigação após a aprovação da PEC e ainda ser beneficiada pelo Refis.
Durante a tramitação da PEC na Câmara, o argumento dos defensores da proposta é que os partidos precisam “evitar o acúmulo de dívidas que se tornem impagáveis”.
“É inacreditável. Os partidos não precisam mais cumprir sanções e não precisam mais. É um perdão total de todas as irregularidades”, afirma Marcelo Issa, diretor de Transparência Partidária.
O texto diz que a anistia se aplica a processos “em que a decisão administrativa, a ação executiva, a inscrição em registros de dívida ativa ou a inadimplência ocorreram em prazo superior a 5 anos”. Para Issa, a formulação é muito abrangente, considera múltiplos marcos para a data em que a dívida pode ser anistiada e dificulta o cálculo da extensão do perdão.
Além disso, afirma o diretor da Transparência Partidária, as diversas lacunas do texto podem estender o indulto a partidos de todos os tipos de esfera judicial. “E não sabemos se continuará válido daqui para frente. Se daqui a 5 anos será possível usar este texto para anistiar o que está a acontecer porque não existe um enquadramento que só se aplique até essa data”, explica.
A tramitação da PEC
No dia 11 de julho, a Câmara dos Deputados aprovou a PEC que perdoa dívidas dos partidos. O texto foi enviado ao Senado e deverá ser analisado na volta do recesso.
Os deputados favoráveis à proposta argumentam que as regras para cumprimento de cotas nas eleições de 2022 foram estabelecidas poucos meses antes do pleito e, portanto, não houve tempo suficiente para a adaptação dos partidos.
“Um jogo não pode começar e, aos 45 minutos do primeiro tempo, o árbitro decide mudar o jogo. Então, aqui estamos criando estabilidade”, afirmou o deputado Hildo Rocha (MDB-MA) no dia da aprovação.
O texto já está no Senado e deverá começar a ser analisado na volta do recesso. O presidente da Câmara, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que não se comprometeu a aprovar rapidamente a PEC.
Metodologia
Ó Poder360 buscou todos os CNPJs que tenham atividades políticas como principal objetivo nos dados abertos da dívida ativa da União. A última atualização desses dados é de março de 2024. A partir desse cruzamento, separou todos os nomes de organizações que citaram partidos brasileiros.
Foram identificados vários diretórios partidários com pequenas imprecisões nos nomes das siglas. É possível, portanto, que existam mais órgãos vinculados às legendas não identificados pelo relatório. As dívidas com os candidatos não foram consideradas nesta pesquisa.
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