A terceirização atinge 46% dos centros de ensino superior a distância (EAD) no Brasil. Os polos de ensino a distância são unidades de apoio presencial aos alunos matriculados em cursos a distância. Lá, o aluno faz provas, resolve questões burocráticas e recebe tutoriais, entre outras atividades.
Dos 47.734 centros ativos em território nacional, 22,8 mil são administrados por terceiros, segundo dados do MEC (Ministério da Educação) obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação.
No modelo de gestão de parceria, um terceiro abre o centro e arca com os custos de pessoal e manutenção. Em troca, recebe cerca de 30% das mensalidades dos alunos vinculados àquela unidade.
Um decreto e uma portaria federais permitem a terceirização desde 2017, ano em que o ministério também deixou de realizar fiscalizações presenciais em centros de ensino a distância. A partir de então, basta a instituição cadastrar os novos polos no sistema eletrônico e-MEC.
Os requisitos legais para a operação dos hubs são vagos. A norma do MEC que abriu espaço para a terceirização menciona algumas estruturas “adequadas aos projetos pedagógicos dos cursos e à legislação específica”, como salas de aula, laboratórios de informática e ambiente para apoio administrativo.
As parcerias e o cadastramento no sistema são de responsabilidade das instituições de ensino superior, afirma o Ministério da Educação em nota enviada à Folha de S.Paulo.
“Caso haja alguma denúncia de irregularidades, ela será investigada e, se necessário, será instaurado um processo de fiscalização”, afirmou o ministério, acrescentando que a portaria que abriu espaço para a terceirização será objeto de revisão.
Em junho, o MEC congelou a abertura de novos cursos, turmas e polos de ensino a distância, prometendo rever o marco regulatório do setor até o final do ano.
A medida gerou pouca resistência do mercado, pois há consenso de que os mecanismos de fiscalização e avaliação da EAD devem ser aprimorados. As empresas menores ficaram irritadas com o veto à abertura de novas turmas e centros.
“Todos os grandes grupos educacionais têm presença nacional”, afirma Bruno Lopes, presidente das Faculdades Ibra, que tem sede em quatro estados. “Um decreto que determina que faculdades não poderão abrir polos não está falando de faculdades grandes, mas de faculdades médias e pequenas”.
“O MEC perdeu o controle, porque o número de polos cresceu muito”, reconhece João Mattar, presidente da Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed).
Ele argumenta que o ministério poderia construir um novo arcabouço sem congelar a abertura de novos polos. “Não é o objetivo da medida, mas pode-se interpretar o seu efeito como a proteção de grupos já estabelecidos”, diz ele.
A Anup (Associação Nacional de Universidades Privadas), que representa grandes empresas como Anhanguera e Uninove, propõe fechar centros que não sejam controlados diretamente pelas mantenedoras, afirma Elizabeth Guedes, presidente da entidade.
“Tem um centro numa funerária, no meio da rua, no meio da mata”, diz. “Essa bagunça só existe porque naquela época o MEC determinou que não haveria mais visitas aos hubs. Foi um convite para o mercado fazer o que quisesse”.
Pólos têm diferenças
Ivana Ribeiro, 58 anos, coordena um centro EAD que reúne as instituições de ensino Unifecaf (Federal Educacional), Unifacvest (Sociedade de Educação Nossa Senhora Auxiliadora) e Faculdade São Luís no bairro de São Miguel Paulista, zona leste de São Paulo.
O centro oferece 17 cursos de bacharelado e graduação e tem 2 mil alunos matriculados, embora apenas 700 estejam ativos. “Os demais estão inadimplentes ou com alguma pendência de conclusão do curso”, explica Ribeiro. O local conta com sala de aula, biblioteca e laboratório de informática.
“Na verdade, eles vão mais no primeiro contato, para conhecer, para ver o local”, diz a pedagoga Renata Silva, 39 anos, gerente de um polo do Centro Universitário Cidade Verde em Parelheiros, extremo sul de São Paulo. “Então só em caso de emergência, em caso de necessidade.”
Silva e a sócia Jaquelyne Guilguer, 35, também professora, inauguraram o centro em dezembro do ano passado. É uma sala no primeiro andar de um shopping center. O espaço conta com dois computadores e um notebook disponíveis para uso dos alunos.
Guilguer conta que, para permitir a abertura do centro, a instituição exigiu autorização dos bombeiros e recursos de acessibilidade.
“Algumas instituições veem o polo EAD como um ponto de venda”, diz Paulo Bastos, que administra oito polos na Universidade Presbiteriana Mackenzie e sete em outras instituições de ensino.
Segundo o empresário, o Mackenzie exige que o imóvel tenha no mínimo 140 metros quadrados, com auditório para 40 lugares. A instituição também mobiliza funcionário próprio para auxiliar nas atividades pedagógicas que acontecem no local, prática incomum no mercado.
Bastos diz que é preciso moralizar os centros de ensino a distância, pois muitos funcionam sem estrutura adequada, mas vê o risco de elitização do ensino superior em uma possível proibição da terceirização.
Massificação
O número de matrículas em cursos de graduação a distância saltou de 1,7 milhão em 2017 para 4,4 milhões em 2024. Entre 2018 e 2024, período que coincide com a flexibilização feita pelo MEC, o número de polos cresceu 313% – passou de 15 mil a 47 mil.
Em geral, os cursos a distância apresentam piores resultados no Enade, exame aplicado pelo Ministério da Educação para medir o aprendizado dos formandos, e apresentam maiores índices de evasão.
“O que aconteceu foi uma massificação e não uma democratização do ensino superior”, afirma Julio Bertolin, professor da Faculdade de Educação da Universidade de Passo Fundo.
Ele sugere que as instituições de ensino superior só possam operar centros de ensino a distância em suas regiões de origem. “Dizer que uma instituição vai abrir um EAD em Porto Alegre e vai ter polos espalhados pelo Brasil, com recursos, professores, é temerário”, argumenta.
*Informações da Folhapress
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