Há 55 anos, o homem pisou pela primeira vez na Lua. O marco — que tem o formato de uma pegada deixada na superfície lunar — foi o clímax da corrida espacial, uma das frentes de batalha da Guerra Fria entre os EUA e a extinta União Soviética. Décadas depois, os países planejam voltar ao satélite, e seus planos são ambiciosos: uma base permanente na Lua e chegar a Marte.
Segundo a Agência Espacial Europeia (ESA), são esperadas mais de uma centena de missões lunares robóticas e tripuladas internacionais até 2030. Nesta nova corrida, a sensação é de déjá-vu, mas com diferenças importantes: os EUA voltam a liderar a disputa, mas na partida agora é a China. E os americanos também não estão sozinhos, com as empresas privadas a reforçarem o empreendimento.
Depois de ser banida do projeto liderado pelos EUA pela Emenda Wolf, que proíbe a NASA de usar fundos federais para cooperação bilateral com os chineses, a China desenvolveu a sua própria estação espacial, a Tiangong, e agora planeia enviar a sua primeira missão tripulada à Lua. até o fim. da década.
Enquanto se prepara para isso, Pequim está desenvolvendo a Estação Internacional de Pesquisa Lunar (ILRS), que terá como objetivo facilitar o transporte cislunar (aquele entre a Terra e a Lua), a exploração lunar, além de realizar pesquisas. Batizada de “Reconhecimento”, a primeira etapa do projeto teve início em 2021 e tem previsão de continuidade até o próximo ano.
A seguir, virá a fase de “Construção”, que deverá prolongar-se até 2035, sendo que a última etapa prevê o estabelecimento de uma base permanente na Lua. A última etapa é “Usar”.
— Tal como na construção de uma pequena cidade, uma estação de investigação lunar deve estar equipada com energia, comunicações, navegação, transporte de longa distância, capacidade de ida e volta da Lua à Terra e sistemas de apoio terrestre. Também deve haver um sistema de suporte à vida se houver pessoas na estação no futuro — explicou Wu Yanhua, vice-administrador da Administração Espacial Nacional Chinesa (CNSA) em janeiro de 2022.
Um ano antes, o roteiro da CNSA foi formalmente anunciado pela China e pela Rússia (ROSCOSMOS), que também está a trabalhar activamente na construção da base permanente.
Além deles, cooperam com o projeto Sérvia, Nicarágua, Tailândia (GISTDA), Venezuela (ABAE), Paquistão (SUPARCO), Azerbaijão (Azercosmos), Bielorrússia, África do Sul (Sansa) e Egito. (Ex.SA). Para os próximos meses também estão programadas as missões Chang’e-7 e Chang’e-8, que deverão realizar pesquisas sobre o pólo sul lunar e sobre o uso in-situ de recursos lunares.
Lado americano
A NASA iniciou em 2017 o Programa Artemis, que previa pelo menos cinco lançamentos à Lua, sendo dois inicialmente tripulados: Artemis II, que orbitará o satélite e está previsto para setembro de 2025; e Artemis III, que pretende encerrar o jejum de cinco décadas em 2026 (a última viagem à Lua ocorreu em 1972 no âmbito do Programa Apollo).
Artemis I ocorreu com sucesso no final de 2022, em um teste da cápsula Orion antes das próximas missões.
O programa americano insere-se na arquitetura “Moon to Mars” que, entre outros objetivos, visa “criar sistemas necessários para que os humanos viajem à Lua e a Marte, vivam e trabalhem lá e regressem seguros para a Terra”.
Para Artemis IV, a administração norte-americana pretende lançar a Gateway, uma pequena estação espacial que funcionará em órbita lunar como posto avançado para realizar pesquisas científicas, planear missões na superfície lunar e planear as primeiras missões ao planeta vermelho.
O Gateway deve ser instalado no ponto de Lagrange L2 — Lagranges são locais do espaço onde se equilibram as forças gravitacionais de dois grandes corpos, como a Terra e a Lua, e L2 se refere a um ponto atrás da Lua em relação à Terra.
Para se ter uma ideia, a Estação Espacial Internacional (ISS) está em órbita terrestre baixa (LEO), que começa a 160 km acima do solo. O seu desenvolvimento conta com o apoio de parceiros internacionais como Japão (JAXA), Europa (ESA), Canadá (CSA) e Emirados Árabes Unidos (MBRSC).
Sob a égide da Artemis, a NASA também lançou a iniciativa Commercial Lunar Payload Services (CLPS), que reúne 14 empresas. O objetivo é baratear essas missões e também estimular uma espécie de “economia lunar”.
A ideia é que esses fornecedores entrem em licitações para viabilizar cargas úteis para a administração americana, lançamentos da Terra e pousos na superfície lunar. “O CLPS também inverte a tradição de apenas ter missões planetárias personalizadas para cumprir objetivos científicos específicos”, explicou a ONG The Planetary Society.
Parcerias Público-Privadas
— O que aconteceu foi que aquele modelo americano [da Guerra Fria] estava exausto, então migraram para um novo modelo com fortes parcerias com empresas privadas — disse o professor aposentado do Departamento de Física do Instituto de Ciências Exatas (ICEx) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Renato Las Casas, adicionando:
— O que temos agora é algo que se repetiu com as grandes navegações. Foi um empreendimento enorme que precisava de um governo forte para financiá-lo. Hoje em dia existem centenas, milhares de empresas que cobrem todos os oceanos. Lembrando que essas empresas privadas dependem muito do capital governamental.
Um dos lançamentos privados programados foi o do módulo de pouso Peregrine-1, da empresa Astrobotic, que viajou no foguete Vulcan Centaur. O foguete decolou em janeiro sem problemas, mas um vazamento de propulsor impediu que o módulo fizesse um pouso suave na Lua. Mas a conquista icónica veio algumas semanas depois com a Intuitive Machines, que aterrou com sucesso o seu módulo lunar Nova-C, denominado “Odysseus”, transformando-o na primeira empresa privada americana a chegar à Lua.
A Nova-C viajou com um foguete da SpaceX, que também trabalha com a NASA. A empresa do bilionário Elon Musk recebeu um contrato em 2021 para desenvolver o Starship Human Landing System (HLS) e deverá fornecer o veículo para as missões Artemis III. A Blue Origin, de propriedade do bilionário Jeff Bezos, será responsável pela nave missionária Artemis V.
A Astrobotic, responsável por transportar o robô Volatiles Investigating Polar Exploration (VIPER), cujo projeto foi cancelado devido ao aumento de custos e atrasos, continuará com sua Griffin Mission One, com lançamento programado para ocorrer não antes do outono (Norte). Hemisfério) de 2025.
A Intuitive Machines também será responsável pelo Polar Resources Ice Mining Experiment-1 (PRIME-1), que procurará gelo no pólo sul — importante para a produção de combustível e oxigênio — e perfurará a superfície lunar.
Dentro deste movimento, o Ministério das Forças Armadas francês anunciou há dois anos a criação da “primeira incubadora do mundo dedicada 100% à Lua”, a TechTheMoon, que visa desenvolver uma “economia para e pela Lua”.
Localizada em Toulouse, a incubadora integra o projeto “Moonshot Institute”, do Centro Nacional de Estudos Espaciais (CNES) e visa, segundo comunicado do ministério, incentivar o desenvolvimento de novos projetos capazes de “responder às desafios das próximas missões humanas” ao satélite, construir a primeira base lunar, identificar, localizar e quantificar os recursos disponíveis para a produção de energia, e compreender e antecipar os riscos para os astronautas.
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