Nos últimos três dias, foram registrados ataques a tiros em áreas reivindicadas em Douradina e Caarapó; Funai realiza estudos para saber se os locais são reconhecidos ou não como terras indígenas
Em meio à incerteza sobre a eficácia da tese do marco temporal, os conflitos em territórios reivindicados pelos povos indígenas voltam a acontecer no Mato Grosso do Sul. No último sábado (13), um indígena Guarani Kaiowá foi baleado em ação em Lagoa Rica/Panambi, município de Douradina.
Embora as áreas reivindicadas já estejam delimitadas e reconhecidas como território original com estudos antropológicos, análises estão sendo realizadas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) quanto à aplicação, ou não, da tese de marco temporal nesses territórios, bloqueando a aprovação da demarcação.
Na tarde de sábado, o povo Guarani Kaiowá realizou ações com um grupo de 10 pessoas visando a retomada de território em Lagoa Rica/Panambi. Segundo relatos, pelo menos 10 picapes conduzidas por pessoas armadas foram até o local reivindicado, com o intuito de intimidar os indígenas que ali estavam.
Dentro desse movimento de carros que cercavam os Guarani Kaiowá, um fazendeiro que estava com outro homem armado baixou o vidro do carro e disparou contra o grupo de recuperação. A bala atingiu um dos indígenas na coxa.
Segundo o Ministério dos Povos Indígenas, nesta segunda-feira (15), em outra ação de retomada de terras no tekoha Kunumi, em Caarapó/MS, ocorrida na madrugada, houve relatos de ataque a tiros.
Os casos de conflitos por terras entre agricultores e indígenas na região Sul do Estado não são novos, porém, com o andamento da análise do marco temporal no Supremo Tribunal Federal (STF), que decidiu derrubar a tese, houve houve uma tendência à pacificação no campo desses conflitos.
Contudo, a tese jurídica que defende o direito às terras indígenas apenas aquelas ocupadas à época da promulgação da Constituição, em 1985, continuou tramitando no Congresso Nacional como projeto de lei, sendo aprovada pelo voto da maioria dos deputados. . O PL 2.903 ainda será votado no Senado Federal.
Em entrevista ao Correio EstadualO líder da Terra Indígena Guyra Kambiy, Ezequiel João, disse que a ação de retomada realizada no sábado teve como objetivo manifestar às autoridades a indignação da comunidade pela demora na conclusão do processo de demarcação.
“Podemos fazer a reivindicação dentro dos limites do território, e isso também é uma pressão por justiça, enquanto a justiça continua devagar precisamos fazer mais pressão para acelerar esse processo [de demarcação]. Nossa luta já dura 20 anos, se ficarmos parados a justiça não vai continuar com a demarcação”, declarou Ezequiel.
Segundo a liderança indígena da retomada, esse ataque não é isolado, e desde 2005 o suspeito responsável pelo tiroteio é contra a comunidade indígena da região, alegando que os Guarani Kaiowá não têm direito à terra, além de já tendo quebrado tendas, ferramentas e ameaçado pessoas. comunidade com seguranças privados.
A Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica já é uma terra oficialmente reconhecida, identificada e delimitada com 12,1 mil hectares em 2011.
Seu processo de demarcação, porém, está paralisado devido à morosidade do Estado e a medidas legislativas como a Lei 14.701 e a PEC 40, que buscam estabelecer a tese do marco temporal.
Conforme informou a Assembleia Geral dos Povos Kaiowá e Guarani (Aty Guasu), as Terras Indígenas de Guyra Kambiy, Potero, Arroio Cora, Laranjeira e Kunumi estão sendo alvo de ataques no Estado.
AÇÃO FEDERAL
Segundo o secretário-executivo do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Luiz Eloy Terena, o ministério acompanha o caso de ataque ao povo Guarani Kaiowá e toma algumas medidas para atender os indígenas atacados em Douradina.
“Hoje em reunião ministerial tomamos algumas medidas. Entre eles, destacamos equipes do Governo Federal, do MPI e do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania para acompanhar a situação fundiária e dos indígenas baleados no local”, disse Eloy Terena.
Além da chegada de equipes do Governo Federal à região, a Força Nacional foi acionada para garantir a segurança nos territórios reivindicados em Douradina.
“A Força Nacional já está em Douradina aguardando autorização de Brasília para atuar em campo junto à comunidade indígena, prestando apoio ao Governo Federal”, relatou o secretário executivo do MPI.
Em contato com a Polícia Federal, o órgão de segurança informou a reportagem de Correio Estadual que “O caso é acompanhado de perto, pela FUNAI e pelo MPF, que também estão no local (Douradina/MS). Inicia-se agora a fase investigativa para esclarecimento do fato”, segundo nota da PF.
CONFLITOS NO MS
Mato Grosso do Sul registrou 116 conflitos fundiários no ano passado, segundo pesquisa divulgada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Foram 1.724 casos em todo o Brasil, entre ocupações e reintegrações de posse de áreas, no primeiro ano do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O Estado foi o sexto do país com maior número de conflitos, a maioria deles relacionados a disputas entre indígenas e agricultores.
Dos 116 conflitos ocorridos em 2023, segundo o levantamento, 105 envolveram indígenas, e a maior parte deles ocorreu em Dourados, onde foram registrados 30. Os outros 11 reportados estão entre sem-terra (4), assentados (6) e posseiros (1) .
Descobrir
O indígena de 52 anos, ferido após ser baleado, foi atendido no Hospital da Vida, em Dourados, e recebeu alta hospitalar nesta segunda-feira.
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