A maioria dos proprietários de shopping centers decidiu voltar atrás e fechar os sites de compras criados nos últimos anos para reunir as mercadorias de seus lojistas, os chamados marketplaces. O caso mais notório foi o do Delivery Center, investida da Multiplan (BVMF:) e da BrMalls, descontinuada em 2021. Desde então, outros grupos desativaram discretamente suas operações desse tipo, como Syn, Almeida Junior, Lumine e Terral.
Por um lado, ficou claro que as redes de shopping centers não conseguem competir no campo digital com gigantes do comércio eletrônico, como Mercado Livre (NASDAQ:), Amazon (NASDAQ:), Magazine Luiza (BVMF:) e Shopee, entre outros. que investem montanhas de recursos em publicidade para atrair clientes e logística de entrega rápida.
Por outro lado, as ‘shoppeiras’ entenderam que é mais vantajoso atrair visitantes para compras presenciais e valorizar os espaços físicos, que se diferenciam como centros de serviços, alimentação e lazer. Nesse contexto, o esforço de digitalização foi direcionado para aplicativos de relacionamento específicos para cada shopping, com anúncios de promoções, reservas de ingressos para restaurantes e cinemas, descontos em estacionamentos e programas de fidelidade.
“O papel que uma plataforma digital tem para o shopping é ser uma extensão de comodidade, atendimento, praticidade e fidelização para o cliente que já frequenta aquele shopping. Estamos falando de marketplaces para cada um dos shoppings e não para todo redes”, afirma o consultor e fundador da Varese Retail, Alberto Serrentino, em entrevista.
Em vez de brigar com grandes varejistas nacionais e internacionais, é mais eficiente focar no projeto e na sua vizinhança, afirma Serrentino. “O shopping tem sua força em atender a área primária, o público que gravita em torno dele. A plataforma digital deve oferecer a possibilidade desse cliente, eventualmente, se conectar com as lojas de um shopping, consultar estoques, fazer uma venda personalizada , uma reserva ou entrega”.
União durou pouco
As administradoras Lumine e Terral lançaram um marketplace em 2021, mas descontinuaram o negócio sem obter os resultados esperados. As empresas, que são concorrentes, decidiram unir forças em busca de economias de escala, diluição de custos e oferta de um mix de produtos mais amplo. No início, o marketplace agregava itens de 14 unidades, como Mercado SP (SP), Iguatemi (BVMF), Florianópolis (SC) e Canoas Shopping Center (RS).
“É um negócio muito difícil e muito caro. Para ser relevante no meio digital é preciso investir muito na aquisição de clientes, no mesmo patamar da Amazon ou do Mercado Livre. E isso é difícil para a indústria de shopping centers”, diz o sócio fundador da Lumine, Claudio Nabih Sallum. “Quando chega uma nova tecnologia, todo mundo pensa em como ela pode ser utilizada para agregar valor. Mas pensamos melhor e chegamos à conclusão de que não estava na nossa perspectiva ter esse nível de investimento.”
Na avaliação dele, a tendência é direcionar recursos para canais digitais de conveniência (reservas, promoções e fidelização) que também servem para coletar informações sobre hábitos de compra dentro dos shoppings. Com isso, as empresas poderão melhorar o mix de lojas para agradar os visitantes, realizar eventos mais atrativos e aumentar as vendas, prevê. “É uma forma mais inteligente de usar a tecnologia e aproximar os shoppings dos consumidores”, afirma Sallum.
Terrível queima de dinheiro
O empresário Jaime Almeida Junior, dono da maior rede de shopping centers de Santa Catarina, decidiu investir em um marketplace ao perceber que o comércio eletrônico crescia rapidamente e ameaçava as vendas físicas. “Quando vi minha mãe de 89 anos comprando pelo Ifood, pensei ‘as coisas estão ficando feias para nós’. Aí comecei a pensar em criar uma plataforma de vendas online”, lembrou, em debate no Expo Shopping há alguns dias. atrás.
O resultado, porém, não foi o esperado e o grupo fechou a operação após quase três anos com recorrente consumo de caixa e sem perspectiva de reversão. “Nossa experiência não poderia ter sido pior. Foi uma terrível queima de caixa”, disse ele. No lugar do marketplace, a empresa montou uma plataforma de conveniência, AJ Fans.
Na visão de Almeida Junior, é preciso consolidar o papel dos shoppings como pontos de encontro dos visitantes. O foco deveria estar em iniciativas para manter os negócios como pontos relevantes para as comunidades locais, e não no varejo online, diz ele.
A Pioneer também saiu deste mercado
Primeira a lançar marketplaces entre redes de shopping, ainda em 2017, a Syn descontinuou a plataforma On Stores em 2023 após muito trabalho sem atingir o público e as vendas esperados. “Foi mais prejuízo do que lucro manter a plataforma funcionando”, disse o presidente da Syn, Thiago Muramatsu, em entrevista ao Broadcast no ano passado.
Na época, ele também citou dificuldades para engajar o varejo, pois o marketplace exigia integração de itens de estoque, realização de fotos e vídeos e gerenciamento de entradas e saídas. “A operação dependia muito do varejista, mas ele não estava disposto a fazer tudo isso. E não existe solução plug and play”, disse.
Iguatemi (BVMF:) é um caso especial
Um case de sucesso é o Iguatemi 365, marketplace de artigos de luxo com curadoria da Iguatemi, que atua há décadas com consumidores de alto poder aquisitivo. O site apresenta produtos de marca, mesmo que sejam fora da rede de shopping centers. “Trata-se de um marketplace especializado em luxo, moda e lifestyle para um cliente de alta renda, que frequenta o Iguatemi. Nesse aspecto é outro negócio. Não é uma extensão do shopping em si”, observa Serrentino. A opinião é compartilhada por Sallum. “O Iguatemi 365 tem o maior potencial de sucesso porque não se trata apenas de investimento. É um ponto de parada para o mercado de luxo, com curadoria da reconhecida marca Iguatemi”.
Mesmo assim, o Iguatemi 365 também passou por dificuldades associadas à alta tecnologia e aos custos logísticos decorrentes de um ‘aumento’ no número de anúncios não rentáveis na plataforma. Por isso, a operação foi reformulada em 2023. Houve redução no número de varejistas de publicidade (de 550 para cerca de 100), terceirização de TI e redução de funcionários (120 para 20). Só então a operação ultrapassou o ponto de equilíbrio e voltou ao vermelho.
“Os ajustes foram concluídos. Ficamos apenas com a parte de inteligência interna, que abrange seleção de marcas e curadoria de produtos. A parte de logística, envio, carrinho de compras, gestão do site ficou com a Infracommerce”, explicou o vice-presidente de Finanças e Relações com Investidores, Guido Oliveira, em entrevista recente.
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