Ao solicitar o Corte federal da abertura da Operação Divulgação do Rio, na última quinta-feira, 27, a Polícia Federal dissecou o que chamou de “hierarquia da fraude” de R$ 25,3 bilhões em Americanas.
Os dois principais alvos, o ex-CEO Miguel Gutierrez e a ex-diretora Anna Saicali, são identificados pelos investigadores como integrantes do primeiro e segundo níveis de atos ilícitos.
A Justiça Federal determinou a prisão preventiva de Gutierrez e Anna. O ex-CEO foi preso em Madrid na sexta-feira, 28, mas no dia seguinte teve a prisão preventiva revogada. Ele nega qualquer ligação com fraude.
Anna Saicali esteve em Lisboa e voltou ao Brasil. A reportagem do Estadão busca contato com a defesa.
Outros 14 ex-executivos da varejista são suspeitos de estarem ligados à fraude. Dois deles chegaram a acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal.
“Enquanto a empresa falia, os altos executivos empregaram todos os seus esforços em uma fraude que os tornou milionários”, aponta relatório assinado pelo delegado André Gustavo Veras de Oliveira, da Delegacia de Combate à Corrupção e Crimes Financeiros, filial da a PF no Rio.
As constatações sobre a “hierarquia da fraude” levaram a PF a classificar os ex-executivos da Americanas por associação criminosa – além de outros crimes sob suspeita. Os investigadores dizem que os ex-diretores “associaram-se à prática do tipo criminoso de manipulação de mercado durante vários anos”
Segundo a corporação, as fraudes na varejista já acontecem há mais de uma década. Flávia Carneiro, denunciante, disse à PF que, quando ingressou na varejista, em 2007, já havia identificado fraudes. O pedido da gestora, disse ela, era que ela resolvesse o problema “em doses homeopáticas” enquanto a empresa abria o capital.
Segundo Flávia, as fraudes contábeis já eram uma realidade desde aquela época, apesar de serem em “valor bem menor”.
“O orçamento era uma meta a ser alcançada e não refletia a realidade. Essa meta sempre foi baseada no ano anterior, que também não era real e isso virou uma bola de neve”, narrou Flávia Carneiro, ex-superintendente da Americanas. Os pesquisadores mapearam a dinâmica de poder dos antigos altos escalões da empresa. Afirmam que outros funcionários sabiam dos atos ilícitos.
Ex-executivos da varejista são investigados por inflacionarem os resultados da empresa para receber bônus. A investigação da PF aponta que a alta direção tratou os resultados reais da rede com a expressão “a vida como ela é”.
Em e-mails interceptados, a PF identificou, por exemplo, uma planilha que indica que uma das empresas do grupo teve prejuízo de R$ 209 milhões no primeiro trimestre de 2021. Porém, o resultado divulgado ao mercado foi um lucro de R$ 129,4 milhão
“As notícias divulgadas ao mercado sempre foram positivas, demonstrando números exorbitantes, completamente irreais e desvinculados da realidade”, afirma o delegado André Gustavo Veras.
Segundo Veras, “no mesmo período, a empresa divulgou resultados excepcionais da B2W, que na época foi considerado um dos grandes cases de sucesso da Bolsa”.
Os e-mails são uma parte fundamental da Operação Divulgação. Centenas de mensagens comprovam fraude contábil na Americanas, destaca representação da Polícia Federal junto à Justiça.
A corporação indica que a antiga alta direção da varejista recebia, todos os meses, os resultados reais da empresa, estava ciente do “aprimoramento dos números”, com a modificação dos balanços, “elegeu um resultado fictício” e estava ciente das fraudes resultado.
Como mostrou o Estadão, a antiga diretoria usava arquivos chamados “verde e vermelho”, com expectativas de analistas de mercado sobre o crescimento da empresa, como principal parâmetro para disfarçar os resultados financeiros da empresa.
Para operacionalizar os desvios, foram utilizados artifícios como fraude em operações de risco descontado – procedimento em que a empresa consegue antecipar o pagamento a fornecedores por meio de empréstimo bancário.
Os federais também identificaram fraudes envolvendo contratos do Cooperative Advertising Fund (VPC), incentivos comerciais geralmente utilizados no setor. No caso das Lojas Americanas, foram registrados VPCs que nunca existiram, diz a PF.
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