Os franceses vão às urnas este domingo, dia 30, numa das eleições mais importantes em décadas para França e para toda a Europa. Foram convocados pelo presidente Emmanuel Macron, que dissolveu a Assembleia no dia 9, após o avanço da extrema direita nas eleições europeias. Para analistas, com a intenção de medir internamente a força do movimento, o líder fez uma aposta arriscada, que pode custar o seu futuro político.
A votação é o primeiro de dois turnos – o segundo será no próximo domingo, dia 7. O partido ou coligação com a maioria dos assentos na Assembleia deverá nomear o novo primeiro-ministro francês, que governará ao lado de Macron. O partido de Marine Le Pen, o Reagrupamento Nacional (RN), liderou as pesquisas de intenção de voto.
Após sete anos de governo Macron, segundo analistas, os franceses acumularam insatisfação com a política atual e estão dispostos a abandonar o centro.
Ao convocar as eleições, Macron apostou numa coligação a favor do seu partido, o Renascença, para travar a direita radical representada pelo RN. Não contava, porém, com o surgimento de uma alternativa, a Nova Frente Popular, formada por partidos de esquerda, como o França Insubmissa e os Verdes, pondo em causa a sua estratégia.
A coligação de esquerda ficou em segundo lugar nas sondagens eleitorais, atrás do partido de Le Pen. A Renascença manteve o terceiro lugar nas intenções de voto. Os eleitores pareciam ter abandonado o governo. “Isso é o que acontece em toda a Europa. O custo de vida aumentou, houve uma deterioração no serviço público e as pessoas estão descontentes”, disse Roberto Uebel, professor de Relações Internacionais da ESPM.
Se as sondagens se confirmarem, Macron viverá durante o resto do seu mandato, até 2027, com um primeiro-ministro da direita radical ou da esquerda, pólos com divergências cruciais com a agenda política centrista. “Quem quer que ganhe, Macron terá de lidar com uma Assembleia muito mais fracturada e terá de partilhar o poder”, declarou Sebastien Maillard, investigador associado do think tank britânico Chatham House.
As eleições parlamentares francesas usam um sistema de dois turnos. Na primeira, todos os candidatos que não obtiverem o apoio de 12,5% dos eleitores locais são eliminados e ganham automaticamente aqueles que obtiverem 50% dos votos em áreas com participação de pelo menos 25% do eleitorado local.
O risco para Macron é que a maioria dos candidatos do seu partido não chegue à segunda volta. Segundo as pesquisas, o segundo turno dará aos franceses a opção de escolher entre direita e esquerda. E a Renascença de Macron poderá perder metade dos assentos que ocupa atualmente na Assembleia. Portanto, é pouco provável que o presidente cumpra o resto do seu mandato com um primeiro-ministro a seu favor.
Cenários
Independentemente de quem tome posse – esquerda ou direita radical – Macron terá de mudar a sua política para lidar com forças antagónicas. Os analistas apontam três cenários para o futuro governo: partilhado com a direita radical, partilhado com a esquerda ou espremido entre estas duas forças na Assembleia.
Os resultados para a França são imprevisíveis. Embora no país o presidente tenha autonomia em assuntos de defesa e relações exteriores, ele precisa lidar com a Assembleia para decidir aspectos como o orçamento, que inclui discussões sobre pensões, impostos, emprego e legislação trabalhista.
Se o Reagrupamento Nacional conseguir a maioria absoluta, o primeiro-ministro será provavelmente um dos seus líderes, Jordan Bardella, de 28 anos. Para Maillard, Bardella deve forçar mudanças como a retirada do país da União Europeia, entre outras.
No entanto, o partido só pode obter uma maioria relativa. Nesse cenário, Bardella afirmou que não seria primeiro-ministro para ser “assistente do presidente”.
Discurso
O Reagrupamento Nacional, de raízes antissemitas e extremistas, suavizou parte da sua agenda nos últimos anos, mas mantém a defesa de uma política anti-imigração que preocupa a comunidade migrante francesa. Este mês, os jogadores da seleção nacional, por exemplo, pediram aos franceses que se unissem para bloquear o avanço do partido nas eleições.
O partido também tem uma posição menos alinhada com a União Europeia e a NATO. Historicamente, o RN é visto como pró-Kremlin, mas manteve silêncio sobre o assunto nos últimos meses. “Isso não significa que a França abandone a UE ou a NATO, mas sim distanciar-se”, disse Uebel.
Outra agenda do partido seria reduzir impostos e revogar aspectos da reforma previdenciária de Macron, um dos seus legados mais antipopulares, mas considerado importante para o sistema político e económico francês.
Maioria de esquerda
A revogação da reforma das pensões é talvez o único ponto em que a direita radical e a esquerda convergem em França. Se a Nova Frente Popular conseguir a maioria e impedir o governo do RN, a reforma também estará em risco. Ela também defende a tributação dos mais ricos e o aumento do salário mínimo.
A Nova Frente Popular também se opõe à atual lei de imigração, mas, ao contrário da direita radical, defende a facilitação do acesso aos vistos, regulando a situação dos trabalhadores, dos estudantes, entre outros.
Outra preocupação comum em relação às duas forças é o aumento dos gastos públicos. Isto preocupa o mercado financeiro, que cita o actual défice orçamental de 5% como uma indicação de risco e teme que possa piorar.
Entre estas questões está o legado político de Macron, caracterizado por uma política económica que resistiu aos efeitos do Brexit, impedindo a falência da França, modernizando o sistema económico e mantendo a estabilidade política, pelo menos até agora. “Mas isto teve um custo para os franceses. Isto explica o crescimento da extrema direita. Acontece que aqueles que se opõem a este pólo não ficam no centro, mas vão para o outro.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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